Pedro Canguçu*
postado em 01/11/2018 18:36
Luta. Resistência. Resiliência. É assim que Rebeca Realleza, 23 anos, define o que o rap a representa. Com o nome de destaque em Ceilândia, a jovem teve o primeiro contato com o gênero em um projeto da escola chamado ;Colisão de ideias;, que apresentou a menina às rimas e ao som. ;Eu estava no intervalo com um amigo, quando, de repente, chegou um cara e perguntou se nós gostávamos de rap. Eu respondi que sim. No fim da aula, ele nos entregou um CD com 12 bases e uma letra de música sobre o meio ambiente. Ele nos queria ver cantando;, afirma.
Sem saber que Realleza tinha o contato com a música desde de criança, o homem ficou surpreso com o desempenho da garota. ;Eu fiz o refrão da música e a melodia. O cara ficou louco;. A partir daí, Rebeca começou a fazer apresentações no colégio e em festivais, até que rappers profissionais foram à escola de Realleza e a descobriram. ;O Nego Bila, do grupo PR15, me chamou para ir ao estúdio dele. A partir disso, enriqueceu meus conhecimentos;, ressalta.
Durante a adolescência, Rebeca participou do grupo de rap gospel Resgatados das cinzas, no qual desenvolveu o trabalho como compositora. Com o tempo, decidiu sair da igreja. Foi quando um integrante do grupo de rap Sobreviventes de Rua, da Ceilândia, a convidou para a equipe. ;Uma amiga me ligou passando todas as informações, com as datas dos shows, horário dos ensaios. Eu aceitei. Já curtia o som deles;, lembra.
Dentro da banda, Rebeca ficou conhecida e começou fazer várias apresentações, mas havia algo que a incomodava. No público e no palco, ela não via mulheres. Faltava representatividade. ;Quando eu ia nos eventos, só tinha eu de mulher no palco. Raramente tinha outra. Os homens faziam tudo: eram DJs, produtores, técnicos de som;, ressalta.
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Convite para cantar
Com uma voz marcante e presença no palco, Realleza foi convidada para fazer uma música especial para um festival só de mulheres, o Batom Battle. ;Foi a primeira vez que cantei sozinha, e eu achei aquilo maravilhoso. Eu comecei a cantar para as minas e elas curtiam;. Nesse meio tempo, começaram a aparecer alguns conflitos de agenda e de ideias entre ela e a banda. ;Eles tinham um seguimento, e não iam mudar da noite pro dia. Nós conversamos, e achamos melhor eu desvincular; , relembra.
Rebeca ficou cinco anos no Sobreviventes de Rua, e é agradecida por tudo que aprendeu. ;Eles me abriram um novo horizonte. Se eles precisarem de mim para alguma coisa, ou eu deles, estamos com as portas abertas;. Durante o tempo que passou, a rapper dividiu palco com artistas como Racionais, Caetano Veloso e Tribo da Periferia.
Rebeca começou planejar a carreira solo. ;Eu estava com muito medo de deixar o Sobreviventes de Rua e as oportunidades desaparecerem;. Não foi o que aconteceu. ;Muitas portas se abriram quando eu decidi fazer shows sozinha, e comecei a ser reconhecida pelo meu trabalho;. Este ano, Rebeca participou de grandes festivais, como Elemento e Movimento e Melanina, e colaborou com outros rappers.
A primeira apresentação solo de Realleza foi a Latinidades, no Estádio Nacional Mané Garrincha. ;Quando o pessoal me ligou, eu me tremi toda. Eu queria fazer uma coisa legal;. Rebeca entrou em contato com algumas pessoas e, a partir disso, formou a própria equipe. ;A gente se identificou tanto que decidiu continuar com isso;. Sobre o cenário do rap, Rebeca percebe um maior envolvimento das mulheres. ;As mulheres estão dominando vários pontos da cena, como na música, DJ. Estamos nos unindo para aparecer;.
Empoderamento feminino
Inspirado na própria história, Rebeca Realleza planeja lançar o primeiro EP no ano que vem. Com a temática do empoderamento feminino, negro e periférico, o trabalho da rapper já tem nome definido: Afrontosa. Uma das principais faixas do álbum se chama Tempo. ;Ela fala de um relacionamento abusivo. Porque antes de acontecer o feminicídio existem indícios. Então, eu fiz essa música porque algumas mulheres já passaram por isso, e não só entre marido e mulher, mas pai e filha, irmão e irmã. Eu já passei por isso;.
Com a música, Rebeca recebeu um certificado conjunto da OAB, da Administração de Taguatinga e da 17; Delegacia de Polícia em um projeto sobre a violência contra a mulher. ;Imagina você estar dentro de um sala com várias mulheres que passaram por um relacionamento abusivo. Chega um delas e diz que, se tivesse ouvido a minha música antes, ela teria saído do relacionamento e não levaria uma facada.;, relata Rebeca.
A cantora espera que as pessoas a conheçam melhor depois do EP. ;Eu quero que todos escutem essas músicas e falem: ;Ah, essa aqui é a Realleza;;. É o reconhecimento esperado por uma artista empoderada e lutadora, com talento suficiente para compôr todas as faixas do trabalho.
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* Estagiário sob a supervisão de Leonardo Meireles