Cidades

Polícia Civil de Goiás investiga acusações de abuso contra João de Deus

Serviço de Inteligência vai apurar as denúncias de violência sexual que têm surgido nos últimos dias e averiguar outras acusações, como fraude e exercício ilegal de medicina

Renato Alves, Otávio Augusto
postado em 09/12/2018 11:06
João de Deus: investigadores também vão tentar descobrir se há outras possíveis vítimas de abuso
O delegado-geral da Polícia Civil de Goiás, André Fernandes Almeida, pediu ao Serviço de Inteligência para levantar todas as informações sobre a vida do médium João de Deus. A ordem não é se ater só aos casos de abusos sexuais que começaram a se tornar públicos a partir da madrugada do sábado (8/12) por meio do programa Conversa com Bial, da Rede Globo.

A missão do Serviço de Inteligência da Polícia Civil de Goiás vai apurar casos denunciados desde os anos 1970 e arquivados pelo regime militar. Eles incluem exercício ilegal de medicina e estelionato. Os investigadores também vão tentar descobrir se há outras possíveis vítimas de abuso sexual do médium que ainda não deram depoimento.
A apuração começou em outubro, após a Delegacia Estadual de Investigações Criminais (Deic) receber denúncias. ;Recebemos esse relato e instauramos o inquérito, com toda atenção devido à complexidade do caso. As mulheres serão ouvidas pela Polícia Civil para que possamos buscar as provas necessárias para investigar com imparcialidade e com eficiência;,destaca o delegado.

Novos casos

Desde que o programa de tevê foi ao ar, trazendo os relatos de 10 mulheres, outras vítimas passaram a contar que também foram vítimas. O jornal O Globo trouxe, no sábado, os depoimentos de outras três e, neste domingo, duas moradoras de Goiás procuraram a imprensa do estado para revelar casos de abuso supostamente cometidos por João de Deus. Uma delas disse à TV Anhanguera que foi vitima do médium na época em que trabalhava para ele, na Casa Dom Inácio, em Abadiânia (GO), onde João de Deus atende. .
[SAIBAMAIS]Ainda no sábado à noite, uma mulher que preferiu não se identificar, contou ao Jornal Nacional que frequentava a Casa Dom Inácio desde 1991, sempre acompanhada da mãe. Ela afirma que, na única vez em que ficou sozinha com João de Deus, foi vítima de assédio.

Já a ex-funcionária ouvida pela TV Anhanguera, afiliada da TV Globo, conta que foi à Casa pela primeira vez em 2005, para buscar uma cura para a filha, e depois voltou por causa de um tumor. Ela conta que os abusos ocorreram quando ela estava sozinha.

"Na primeira ocasião, ele pegou um colchão que tinha no corredorzinho e colocou no chão. Ele mandou eu tirar a roupa, eu tirei. Não entendi muito bem. Da outra vez que eu fui, ele sentou na poltrona dele, tirou as calças e mandou eu mexer no órgão dele", relatou a mulher.

De acordo com a ex-funcionária, ela teve medo de denunciar o médium à Polícia Civil. ;Era medo, medo de me expor, ele tem costas quentes né, poderoso em Abadiânia e em Goiás;, afirmou.

Vida controversa

João de Deus conta que começou a ter mediunidade ativa aos 9 anos, quando era um menino católico avesso ao espiritismo. Diz que aos 16 serviu de médium pela primeira na "cura" de outra pessoa. Teria então morado em vários estados, até fixar-se em Abadiânia, onde diz "receber" bons espíritos que realizam curas por meio dele, incluindo o fundador da Companhia de Jesus, Santo Inácio de Loyola.

O médium tem 11 filhos com mulheres diferentes. É analfabeto funcional, dono de instituições de caridade, de uma fazenda onde planta soja e cria gado, além de sócio de um garimpo.

As supostas curas proporcionadas por médium atraem multidões à Abadiânia, a tal ponto que se constituem na principal fonte de renda do município. A "casa" de João de Deus emprega mais pessoas do que a própria administração municipal.

João de Deus também vem comanda eventos de tratamento espiritual em outros países. A sua história foi retratada em programas de televisão produzidos por emissoras internacionais.

Em 2007 a revista Época constatou que o médium exibia uma cópia de um artigo científico em sua casa, usando-o para obter "respaldo científico" às suas atividades paranormais apesar dos resultados inconclusivos apresentados na publicação. Maria Ângela Gollner, uma das coautoras do estudo, declarou à reportagem da revista que se sentia constrangida pelo uso propagandístico do artigo: ;Ele fez daquilo uma máquina de propaganda;. O primeiro autor do artigo, o parapsicólogo e psiquiatra Alexander Moreira-Almeida, afirmou desconhecer o fato.

Em setembro de 2015, apesar de defender a veracidade de suas curas, não quis passar por um "tratamento espiritual" e passou por uma longa e delicada cirurgia convencional no aparelho digestivo, ficando internado no Hospital Sírio-Libanês, um dos mais renomados hospitais do Brasil, por mais de três semanas.

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