Cidades

Corpo de mulher morta pelo marido com seis tiros será enterrado nesta terça

Responsável pelo caso, o delegado Laércio Rossetto, chefe da 2ª Delegacia de Polícia (Asa Norte), disse que o autor do crime não demonstrou arrependimento.

Walder Galvão - Especial para o Correio, Isa Stacciarini, Augusto Fernandes, Sarah Peres - Especial para o Correio
postado em 29/01/2019 06:00
foto de vítima de feminicídio sendo levada pela perícia
Um relacionamento abusivo de 50 anos terminou de forma trágica no Bloco E da 316 Norte, ontem de manhã. Ranulfo do Carmo Filho, 72, que, segundo parentes e vizinhos vivia ameaçando e batendo na mulher, Diva Maria Maia da Silva, 69, a matou com ao menos cinco tiros, no apartamento onde moravam. Ainda feriu o filho, Régis do Carmo Corrêa Maia, 46, com três projéteis no peito. Até o fim da noite, ele estava em estado grave, mas estável, no Hospital de Base. Preso após perseguição policial, o assassino confesso foi levado para a carceragem do Departamento de Polícia Especializada (DPE), no Complexo da Polícia Civil.

Diva e Régis haviam feito uma viagem para Goiânia no fim de semana. Chegaram à casa dela por volta das 10h. Cinco minutos depois, Ranulfo apareceu no apartamento, onde morava com a mulher. Pai e filho discutiram. Ranulfo foi ao quarto e voltou com um revólver calibre .38. Após disparar contra Régis, na frente de Diva, ele voltou ao quarto, recarregou a arma e mirou a mulher. Apertou o gatilho seis vezes e, ao ter certeza da morte dela, deixou a residência e o revólver ao lado das vítimas.

Ranulfo desceu pelo elevador, caminhou calmamente até o estacionamento público em frente o bloco, onde entrou no carro, um Cross Fox, e fugiu, às 10h26. Câmeras de vigilância do prédio dele filmaram e gravaram a sequência. O assassino confesso seguiu pela Epia. Mas a Polícia Militar agiu rápido. O helicóptero da corporação o localizou e acionou viaturas, que cercaram e abordaram o assassino confesso às 11h38, na Quadra 8 do Park Way, em direção ao Gama, a cerca de 25km do local do crime. Ranulfo não reagiu.

Uma vizinha testemunhou o crime. Ao ouvir a discussão de pai e filho, ela entrou no apartamento de Diva. A mulher relatou as cenas em depoimento à Polícia Civil. Ranulfo confirmou. Ele, que não tem licença para guardar ou carregar arma de fogo, também contou que o revólver era irregular, mas não disse a origem dele. A perícia investiga a procedência do artefato. Mas investigadores contaram que o revólver foi usado para cometer um roubo, no Mato Grosso (MT). Ranulfo, um vendedor de carros autônomo aposentado, deve passar por audiência de custódia hoje. Um juiz definirá se ele poderá ou não responder pelos crimes em liberdade. Contra Ranulfo, há uma ocorrência de lesão corporal, registrada em 1990.

auto de feminicídio no DF

Filho dedicado

Responsável pelo caso, o delegado Laércio Rossetto, chefe da 2; Delegacia de Polícia (Asa Norte), disse que Ranulfo não demonstrou arrependimento. Compadeceu-se apenas com a situação do filho, mas não chorou. ;A cena do crime é trágica, pois houve muitos tiros. Encontramos marcas dos disparos na cozinha, no quarto e em outros cômodos;, contou Rossetto. A filha do casal, Rejane, 42 anos, e duas testemunhas também prestaram depoimento.

Um dos tiros atingiu o pulmão de Régis. Médicos drenaram o ferimento. Ele também teve três paradas cardíacas, mas foi reanimado. Morador do Sudoeste e servidor do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT), Régis sabia das agressões sofridas pela mãe. Durante o atendimento no Hospital de Base, lúcido, ele falou com um policial civil. Disse que havia decidido não aceitar mais as agressões do pai contra a mãe dele.

A rotina de violência de Diva com o companheiro foi confirmada por uma amiga da família. ;Ele batia nela, e o Régis defendia muito a mãe. Nem a comida dela o marido dava. Ele (Régis) era louco com a mãe. A mãe já era uma senhora de idade;, desabafou uma pastora evangélica, comadre de Régis ; que é padrinho do filho dela. A amiga acompanhou a mulher de Régis ao hospital, para receberem notícias dele. ;Provavelmente, o Régis foi defender a mãe e levou os tiros. Ele é um menino tão bom;, disse, ao telefone, a juíza cível do TJDFT Grace Corrêa Pereira, esposa da vítima.

Espancamentos

Vizinhos confirmam o histórico violento de Ranulfo. No entanto, ninguém nunca registrou uma ocorrência contra ele. ;Quase todas as semanas, a Diva me ligava para comentar as agressões que sofria do Ranulfo. Ele a xingava e a espancava. Não era segredo para ninguém a maneira como ele a maltratava. Eu sempre a aconselhei a procurar ajuda ou a denunciá-lo, mas ela não conseguia sair dessa relação. Nunca procurou a polícia por medo de que ele a matasse;, disse a analista ambiental e vizinha de Diva, Tânia Maria Ferreira, 55.

;Diva teve uma vida muito sofrida por conta do Ranulfo. Ele a mantinha como uma escrava. Batia nela todos os dias. Isso não é de hoje. Ela apanhou a vida inteira. Essa era uma tragédia anunciada;, relatou outra vizinha do casal, a administradora Tatiana Martinelli, 41. Apesar da violência, Diva era tida como uma pessoa extrovertida, companheira e vaidosa. ;Ela tinha olhos azuis tão bonitos e um sorriso único. Onde ela chegava, deixava o ambiente mais feliz;, observou Tânia Maria.

O corpo de Diva será velado a partir de 12h de hoje, na Capela 2 do Cemitério Campo da Esperança. O sepultamento está marcado para 16h.


Memória


2019

5 de janeiro
A dona de casa Vanilma Martins dos Santos, 30 anos, é esfaqueada na casa onde mora com o ajudante de pedreiro Thiago de Souza Joaquim, 33, na frente do filho do casal, de 3 anos, e de um sobrinho, de 16, no Setor Oeste do Gama. Antes de fugir, Thiago de Souza Joaquim, 33, leva a mulher ao Hospital Regional do Gama, mas ela morre horas após o atendimento médico. Policiais civis prendem o assassino dois dias depois do crime.

2018

14 de julho
Stefanno Jesus Souza Amorim, 21 anos, mata Janaína Romão Lúcio, 30 anos, com cinco facadas no peito e nas costas, em frente as filhas do casal, de 2 e 4 anos, no Condomínio Porto Rico, em Santa Maria. Janaína e Stefanno estavam separados, mas ele não aceitava o término. Ele é preso três dias depois, na casa de parentes, no Recanto das Emas.

4 de maio
Jéssyka Layanara da Silva Souza, 25 anos, é executada com cinco tiros na casa onde mora com familiares, na QNO 15 de Ceilândia. O assassino, o soldado da Polícia Militar Ronan Menezes do Rego, 27 anos, ainda vai a uma academia de ginástica da região e dispara três vezes contra o instrutor Pedro Henrique da Silva Torres, 29, amigo de Jéssyka. Ronan está preso na Papuda.

16 de março
O piloto do Metrô Júlio César dos Santos, 38 anos, mata a tiros Mary Stella Maris Gomes Rodrigues dos Santos, 32, e depois se mata, em frente ao filho mais novo do casal, de 2 anos, na casa deles, em Ceilândia Sul. O filho estava no colo do pai durante os disparos, e ficou em estado de choque. O irmão mais velho, de 10 anos, estava na escola. Ambos ficaram sob custódia de familiares.


Aumento de 50% dos casos em 2018


Diva Maria Maia da Silva, 69 anos, é a segunda vítima de feminicídio no Distrito Federal em 2019. Em 13 de janeiro, o Correio noticiou o crescimento em mais 50% dos casos de feminicídio na capital no ano passado em relação a 2017, quando houve 18 mulheres mortas. Em 2018, foram 29. Os dados são da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal. A maioria dos assassinatos ocorreu na residência da vítima, após discussão por ciúmes ou não aceitação do término do relacionamento.


Responsável pelo caso, o delegado Laércio Rossetto, chefe da 2ª Delegacia de Polícia (Asa Norte), disse que o autor do crime não demonstrou arrependimento.




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