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GDF negocia renovação de contrato de aluguel para a Rodoviária do Entorno

O aluguel com a empresa responsável pelo Edifício Touring - localizado ao lado da Rodoviária do Plano Piloto e utilizado desde 2014 como terminal de ônibus - expirou no ano passado e não foi renovado.

Alan Rios, Augusto Fernandes
postado em 19/02/2019 06:00
foto da Rodoviária do Entorno, no DF

Um impasse na renovação do contrato de locação do imóvel em que hoje funciona a Rodoviária do Entorno pode atrapalhar a vida dos mais de 200 mil passageiros que dependem do serviço de transporte semiurbano para se deslocar de Goiás até o Distrito Federal. O aluguel com a empresa responsável pelo Edifício Touring ; localizado ao lado da Rodoviária do Plano Piloto e utilizado desde 2014 como terminal de ônibus ; expirou no ano passado e não foi renovado. Como medida emergencial, o GDF requisitou a administração do espaço. A solução, no entanto, é provisória: vale até 26 de março.

Até lá, o Transporte Urbano do Distrito Federal (DFTrans) cuidará da conservação do local. O órgão explicou que entrou com pedido de requisição administrativa do edifício (leia O que diz a lei) por temer que a interrupção dos serviços pudesse causar prejuízos de consequências incalculáveis ao atendimento dos usuários do transporte.

Um dos motivos de o contrato não ter sido renovado, de acordo com o DFTrans, foi que a empresa que administra o Touring, a Esplanada Participações Ltda., fez exigências que não constavam no contrato de locação estabelecido em 2014 (leia Memória). A empresa queria que a autarquia ocupasse áreas do pavimento superior e do mezanino, e não apenas a plataforma inferior, como ocorre hoje. Tais áreas, segundo o órgão do GDF, não têm finalidade para o terminal.

O DFTrans ainda alegou que a Esplanada Participações estipulou um preço para renovação muito acima do que o avaliado pela Companhia Imobiliária do DF (Terracap). ;A empresa solicitou a reavaliação do ato e estão sendo feitas as tratativas para que haja uma solução satisfatória para ambas as partes;, informou a autarquia, por meio de nota oficial. A Secretaria de Mobilidade garantiu que o terminal rodoviário não corre o risco de ser desativado e que as negociações estão avançadas.

Advogado da empresa, Ewan Teles afirma que a Esplanada Participações foi pega de surpresa com a decisão do governo. Segundo ele, a responsável pelo edifício pediu a revogação do ato administrativo e pretende apresentar ainda esta semana uma nova proposta ao GDF. ;A intenção da empresa é continuar cedendo o espaço para que ele funcione como terminal rodoviário. O dano social seria enorme caso aquela rodoviária tivesse de ser desativada. A nossa empresa não quer instalar o caos no Distrito Federal;, diz.

Teles nega que a empresa tenha solicitado valor acima do esperado para que o contrato de locação fosse restabelecido. ;Ainda não havíamos combinado valores ou prazos com o GDF até o fim do ano passado. Por isso, queremos ter a oportunidade de apresentar as nossas considerações. Do jeito que está atualmente, não dá. Esperamos, pelo menos, a garantia de segurança jurídica;, detalha.

Polo cultural


O Edifício Touring estava previsto no relatório arquitetônico elaborado por Lucio Costa em 1956. No documento, há até comparações com modelos internacionais: o imóvel foi projetado para ser um centro de diversões semelhante à Times Square, em Nova York, e a Piccadilly Circus, em Londres.

Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB), Frederico Flósculo diz que o uso do espaço está completamente desconfigurado. ;Lá deveria ter uma casa de chá, um lugar de encontro, repouso, cultura e convívio, mas nunca tivemos isso. O uso como rodoviária parece até ironia. O que existe hoje é uma mobilidade desajeitada, improvisada;, observa.

Para o especialista, órgãos como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) deveriam tomar providências para a preservação do espaço. Em nota, o Iphan lembrou que, apesar de ser um edifício tombado, é de propriedade particular e cabe ao proprietário a responsabilidade ;sobre questões como gestão, conservação, uso e manutenção;.

Quanto aos prejuízos arquitetônicos, o Iphan tem uma visão diferente: ;O espaço inferior do edifício, onde se instalou provisoriamente o terminal de ônibus, abrigava o posto de gasolina e as oficinas mecânicas do Touring Club, há muito desativados. Portanto, esse é um uso compatível com o edifício e não lhe causam nenhuma disfunção arquitetônica ou funcional;.


Problemas


Quem passa todos os dias pelo terminal rodoviário reclama das condições do local. A dona de casa Shauana da Silva, 27 anos, fica incomodada principalmente com os bancos quebrados e a sujeira deixada por outros passageiros. ;Enquanto espero o ônibus chegar, tenho que ficar em pé, pois a maioria dos bancos daqui tem algum defeito e não dá para sentar;, reclama.

Um vigilante que trabalha no posto da administração da Rodoviária do Entorno reconhece que a segurança no espaço é pouca. Além dele, outros três trabalham no terminal. ;Desde que esse espaço foi inaugurado, nos prometeram que seria feito um posto da Polícia Militar. Até hoje, ele não existe. Quando acontece alguma situação de confronto, os vigilantes daqui tentam inibir, mas é perigoso, pois não trabalhamos armados;, detalhou o homem, que não quis se identificar. Em julho de 2018, mãe e filho foram assassinados a tiros no local. No mês passado, um homem de 74 anos foi esfaqueado após reagir a um assalto enquanto esperava por ônibus.

Apesar das reclamações, o Centro de Comunicação da Polícia Militar do DF informou que a corporação usa diferentes modalidades de policiamento na Rodoviária do Entorno: a pé, com motocicletas e com viaturas. ;O patrulhamento no local é ininterrupto e há um posto policial no mezanino da Rodoviária do Plano Piloto, com policiais que circulam por toda a área;, afirmou a PMDF, por nota. De acordo com a Secretaria da Segurança Pública (SSP/DF), há três câmeras de videomonitoramento na região do terminal.

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Memória


Inauguração em 2014

Com o nome oficial de Terminal Rodoviário Touring, a chamada Rodoviária do Entorno foi inaugurada em 4 de junho de 2014 e entrou em operação quatro dias depois, ao custo de R$ 11,6 milhões. Localizada entre a Rodoviária do Plano Piloto e o Complexo Cultural da República, fica no térreo do antigo Touring. A necessidade da reforma do prédio para receber coletivos veio com as obras da estação do Expresso DF Sul na Rodoviária do Plano Piloto, iniciadas em março de 2014, quando os passageiros das cidades do Entorno passaram a pegar os ônibus na plataforma superior do local. As reclamações de falta de estrutura eram constantes e forçaram o GDF a construir um novo estacionamento para abrigar os 300 mil usuários. O terminal tem capacidade de receber mais de 600 coletivos por dia. O imóvel foi locado em 9 de junho pela então Secretaria de Transportes, hoje Secretaria de Mobilidade, que usaria o pavimento inferior e o mezanino do edifício. O aluguel estabelecido foi de R$ 293 mil, o correspondente a mais de R$ 14 milhões durante toda a vigência do contrato, de 48 meses.


O que diz a lei

Requisição é a modalidade de intervenção estatal pela qual o Estado utiliza bens móveis, imóveis e serviços particulares em situação de perigo público iminente. A requisição administrativa está prevista na Constituição Federal. O inciso XXV do artigo 5; define que, no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurando ao proprietário indenização ulterior, se houver dano. A medida também tem respaldo no artigo 202 da Lei Orgânica do Distrito Federal, o qual estabelece que a intervenção do Estado na propriedade particular tem como objetivo principal a proteção aos interesses da comunidade.

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