Alan Rios
postado em 22/02/2019 06:00
Em um cômodo especial da casa de Luiz Cláudio Stawiarski, 76 anos, são guardadas décadas de memória afetiva. Dentro de pequenas caixas com tampa de vidro, o médico aposentado conserva cerca de 2 mil insetos, que eram utilizados para que seu pai, o famoso biólogo Victor Stawiarski, ministrasse aulas no Museu Nacional do Rio de Janeiro. ;Tenho um apego muito grande à nossa coleção, porque com ela eu me lembro das centenas de vezes em que nós dois saíamos atrás dos bichos. Então, o sinto perto de mim;, lembra.
Mesmo com o carinho que tem pelos bichinhos, o morador do Lago Sul resolveu doar todos eles ao museu carioca, que teve cerca de 90% das peças queimadas no incêndio de setembro em 2018. A ideia veio da filha, assim que soube da tragédia. ;Aquilo me doeu demais e nem quis acompanhar as notícias, porque lá era praticamente a casa do meu pai;, diz o aposentado. A sala onde Victor Stawiarski dava aulas para estudantes de escolas e faculdades ficou completamente destruída pelo fogo, deixando em cinzas um lugar que foi mais do que somente seu trabalho durante 30 anos. O filho do professor é enfático: ;Se ele estivesse vivo, não ia aguentar ver aquilo;.
Os insetos eram da coleção particular de Victor, mas ele os levava para o museu para deixar os visitantes encantados com sua seção de entomologia, o ramo da biologia que estuda esses animais. O acervo começou a ser elaborado de pouco em pouco, em passeios rotineiros, como conta Luiz. ;Eu andava até quatro horas com ele pelo mato. E assim íamos nos aproximando como pai e filho, conversando sobre a vida, ouvindo conselhos e aprendendo a crescer como pessoa. Tudo isso enquanto a gente caçava os insetos.; Ambos eram amantes da natureza e se encantavam com cada animal, criando um vínculo com as espécies.
Quando Victor faleceu, Luiz herdou a coleção e se comprometeu a aumentá-la. Passou a organizar os bichos, encomendou um armário com um carpinteiro para guardá-los e saiu em busca de mais borboletas e besouros. Quando foi chamado para trabalhar no Pará, não pensou duas vezes e aceitou o convite: ;Porque lá, como toda faixa equatorial, é um paraíso de insetos. Então eu fui caçar e, nas horas vagas, exercer medicina;, brinca o aposentado. Entre os ;xodós; de Luiz está uma borboleta de asas azuis.
Dando asas
Os insetos de Luiz vão voar para mais um capítulo importante da entomologia. Amanhã, uma equipe de biólogos do Museu Nacional virá a Brasília para buscar a coleção. ;No ano passado, eu fiz um contato com eles, visitei o Rio de Janeiro e mostrei fotos das caixas. Eles ficaram encantados!”, conta. Os especialistas devem chegar pela manhã de sábado em veículos apropriados para o transporte, que levarão os insetos para uma nova ala do lugar, em homenagem à memória de Victor.
Desde que decidiu doar os animais, Luiz dedica suas manhãs para organizar as caixas, aproveitando os momentos para se despedir. Em cada uma delas, ele enxerga uma memória que passará a fazer parte não só da sua história, mas também da história nacional.
A captura
Cada inseto é capturado de uma forma singular, dependendo da espécie. Luiz conta que nunca foi picado, porque sempre procurou respeitar cada forma de vida. As borboletas eram suas preferidas, e ele ensina:
1. A captura é feita em uma rede entomológica, que é produzida com filó
2. Quando elas são capturadas, o profissional tem extremo cuidado para que suas asas não quebrem
3. O biólogo dobra as asas com cautela e coloca dentro de um envelope próprio para esse trabalho
4. Depois, as borboletas são colocadas dentro de uma caixa de areia úmida, para que amoleçam
5. Então, com pinças e alfinetes finos, elas são abertas e espetadas na asa para serem conservadas