Cidades

MP e Justiça eleitoral analisam denúncias de laranjas do Pros no DF

Denúncias divulgadas pelo Correio ajudaram a embasar pedido do órgão para apuração de possíveis irregularidades nas eleições. Partido, que destinou mais de R$ 5 milhões em material gráfico a 33 concorrentes, pode ter que devolver recursos

Alexandre de Paula
postado em 14/03/2019 06:00
As candidatas Amazônica e Adriana Lourenço dizem ser vítimas do partido

Os gastos milionários do Pros com candidatos que tiveram votação pífia nas eleições de 2018 ; revelados em reportagem do Correio ; estão na mira do Ministério Público e da Justiça Eleitoral. Levantamento feito com base nas prestações de contas entregues ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que a direção nacional da legenda destinou mais de R$ 5 milhões em material gráfico a 33 concorrentes a deputado distrital que, juntos, conquistaram apenas 11,9 mil votos. Mas muitos deles negam ter recebido o volumoso apoio da sigla e acusam a direção da legenda de desviar os recursos.

O suposto esquema do partido se deu por meio da transferência de materiais gráficos para os candidatos, com gasto médio de R$ 172 mil para cada um dos 33. A fartura dos itens, custeados por recursos públicos dos Fundos Partidário e de Financiamento Especial de Campanha (FEFEC), é tamanha que seria possível, por exemplo, estampar por três vezes todos os 1,7 milhão de automóveis da capital com os 6 milhões de adesivos que a legenda diz ter confeccionado.

Para concretizar as transações, o Pros teria usado uma brecha na legislação eleitoral, que dispensa a apresentação de comprovante e de recebidos na transferência de valores em material de campanha. As transações são apresentadas com ;receitas estimáveis em dinheiro;. Desse modo, na prática, a propaganda impressa ; produzida em gráfica do próprio partido ; não precisava ser comprovada na prestação de contas.

Em 28 de fevereiro, três dias após a publicação das denúncias no Correio, o Ministério Público emitiu parecer questionando os métodos do partido e pedindo apuração rápida do caso à Justiça Eleitoral. O MP fez o posicionamento no processo de prestação de contas de Gilberto Camargos, um dos candidatos ouvidos pela reportagem. Ele se recusou a assinar a prestação de contas produzida pelo Pros. Às pressas, elaborou uma nova prestação, entregue em janeiro deste ano, que inclui uma declaração em que justifica o atraso e detalha a suposta tentativa de fraude cometida pelo partido.

Depoimento

Com base na reportagem do Correio e na justificativa de Camargos, o MP, em petição assinada pelo procurador eleitoral José Jairo Gomes, requereu ao Tribunal Regional Eleitoral a oitiva do candidato para esclarecimentos dos fatos e a juntada da reportagem aos autos do processo de prestação de contas. O TRE-DF acatou o pedido e a audiência está marcada para o próximo dia 28. ;Entendo que a tomada de depoimento do candidato é medida necessária para esclarecer a verdade acerca dos gastos declarados com material de campanha, originários de recursos do Fundo Especial (FEFEC);, escreveu o desembargador Telson Ferreira, ao aceitar o pedido.

A decisão vai na linha da solicitação feita pelo Ministério Público que destaca os indícios de irregularidade cometidas pelo partido no caso. Segundo o órgão, se a suspeita se confirmasse, ficaria constatado que o partido declarou ;entrega de bens em volume superior ao que verdadeiramente seria distribuído;. O MP levantou também a hipótese de superfaturamento dos valores gastos em material gráfico. ;As irregularidades narradas, tanto pelo prestador de contas quanto pela imprensa, merecem ágil e percuciente apuração;, escreveu o procurador.

Ele ressaltou, como uma das justificativas, o expressivo repasse de recursos públicos ao partido. O Pros recebeu R$ 21 milhões do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e R$ 17 milhões do Fundo Partidário apenas no ano de 2018. ;O emprego ilícito de tais recursos não exime os responsáveis (no caso, o Pros) e os beneficiários de tais condutas (ou seja, seus candidatos) das cominações legais cabíveis, notadamente do dever de restituir ao erário os valores utilizados indevidamente.;

Adulterações

Alguns dos candidatos ouvidos pelo Correio alegam ter assinado a prestação de contas sob pressão, coagidos pelo alerta de que teriam complicações sérias com a Justiça Eleitoral, caso deixassem de entregar os documentos. É o caso de Adriana Lourenço, 49 anos. Cega, ela relata que assinou a prestação de contas sem saber o conteúdo real. Integrantes do Pros não disponibilizaram a versão digital, que poderia ser ouvida por meio de recursos de acessibilidade, tampouco descreveram a íntegra da documentação. Ela teria recebido R$ 154 mil do partido em material gráfico. Teve 190 votos e nega os valores tão altos. ;Recebi pouquíssimo material e tudo em cima da hora da eleição;, disse.

A datilógrafa Amazônica Brasil, 54, foi uma das candidatas que alertou Adriana da possível adulteração. Ela, no entanto, diz ter assinado a prestação de contas por medo. ;Sou servidora pública, estava em processo de aposentadoria. Deixar de fazer a prestação porque poderia me prejudicar;, contou. Ela e Adriana dizem se sentir impotentes. ;O que fazer? Negar e depois ter que procurar advogado e contador para fazer a declaração às pressas? Não temos recurso para isso. E ficaria sempre a nossa palavra contra a deles;, ponderou Amazônica. O partido destinou R$ 179 mil à ela, que teve 347 votos.

Irregularidades muito similares as que teriam sido praticadas no DF causaram a reprovação das contas de uma candidata a deputada federal de Goiás do Pros, Dona Cida. Mãe de Eurípedes Júnior, presidente nacional da legenda, ela recebeu R$ 1,7 milhão do partido. Chamou a atenção da Justiça, além de outros problemas, que parte considerável desses gastos não pudesse ser comprovada com a análise da contabilidade da campanha. O caso ainda está em fase de recursos.

No DF, o Pros elegeu um deputado distrital, o delegado Fernando Fernandes. Segundo mais votado, recebeu 29,4 mil votos e apenas R$ 20 mil do partido. Fernandes se licenciou para assumir a Administração Regional de Ceilândia e Telma Rufino (Pros) ficou com a cadeira na Câmar. A legenda investiu R$ 324 mil nela. No caso dela, porém, a maior parte da verba foi transferida, de fato, diretamente em dinheiro para pagamento de pessoal e não em recursos estimáveis.

Material suspeito

8.783.729
Número de santinhos impressos


5.989.812
Quantidade de adesivos 10 x 30


3.225.156
Quantidade de bótons


41.300
Número de adesivos 40 x 30


11.920
Total de votos conquistados pelos 33 candidatos

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