Ana Viriato
postado em 22/03/2019 06:00
Em um périplo para atrair e ampliar a atuação de empresas no Distrito Federal, o governador Ibaneis Rocha (MDB) viajou ontem para o interior de São Paulo. Em Hortolândia, o chefe do Palácio do Buriti fechou um protocolo de intenções com a gigante farmacêutica EMS. Pelo acordo, a companhia, que funciona há oito anos no Polo de Desenvolvimento Juscelino Kubitschek, em Santa Maria, deve expandir os negócios e gerar, no mínimo, 300 empregos diretos, além de contratar serviços terceirizados só de empresas estabelecidas em Brasília. O aquecimento do setor produtivo é uma das apostas do Executivo para fomentar o desenvolvimento econômico e fazer crescer a arrecadação tributária, que amargou queda real no último mês, em comparação ao mesmo período de 2018.
Secretário de Fazenda, Planejamento, Orçamento e Gestão, André Clemente acompanhou Ibaneis Rocha na viagem a São Paulo. Segundo o titular da pasta, a companhia farmacêutica vai fazer a ampoliação em território candango ainda neste ano. ;Sentimos um clima de confiança no novo governo. Em Brasília, a empresa deve ter um faturamento de cerca de R$ 1 bilhão ao ano, o que renderá uma boa arrecadação em impostos e avanços na área de pesquisa;, observou. E emendou: ;Eles fabricam 1,5 bilhão de comprimidos por mês e distribuirão tudo a partir de Brasília. Isso aumenta muito a demanda por serviços de transporte e armazenamento, por exemplo;.
Para garantir a ampliação dos negócios da EMS na capital, o GDF concederá incentivos à empresa. Entre os benefícios, constam o financiamento da construção da fábrica e da aquisição de equipamentos com recursos do Fundo de Financiamento do Centro-Oeste (FCO); a isenção, por 15 anos, do IPTU e da Taxa de Limpeza Pública; a liberação de valores do Financiamento Industrial para o Desenvolvimento Econômico Sustentável (Ideas-Industrial); e o terreno que abrigará as novas instalações.
Turismo
Essa não é a primeira investida do governo em busca do aquecimento da economia local. Há uma semana, Ibaneis esteve em Lisboa, capital de Portugal, para assinar um protocolo de intenções com a companhia aérea TAP, sediada no país. O acerto prevê a transformação de Brasília em uma cidade stopover. Dessa forma, passageiros que viajarem da Europa para o Brasil, com conexão em solo candango, poderão permanecer na cidade por até cinco dias, sem custos extras na passagem.
Com a medida, o Executivo local espera atrair 20 mil turistas à capital no primeiro ano de funcionamento do programa. A ação faria girar a economia do setor hoteleiro, de restaurantes e bares e de pontos turísticos do DF e do Entorno. Representantes da empresa esperam tirar o projeto do papel no próximo semestre, quando ficarão prontos os aplicativos e plataformas on-line para os usuários que tiverem interesse na experiência. Na visita à capital portuguesa, o emedebista também se encontrou com construtoras para tratar da implementação do VLT na W3, da Avenida Interbairros e da quarta ponte sobre o Lago Paranoá, além da expansão do metrô e da criação de Parcerias Público-Privadas (PPPs) no setor de educação.
O aumento da receita tributária do DF trata-se de prioridade absoluta do governo por ser necessário para o cumprimento de diversos compromissos de campanha, como o pagamento da terceira parcela do reajuste do funcionalismo. O retroativo da dívida, em aberto desde setembro de 2015, equivale a R$ 4 bilhões. O montante não contempla o valor do ajuste previsto para o período entre janeiro e dezembro deste ano, que chega a R$ 1,3 bilhão. Justamente em razão da falta de dinheiro em caixa, o GDF ainda não estabeleceu uma data para os repasses.
Também estão condicionados ao incremento da receita a quitação de dívidas com fornecedores, o investimento em obras públicas e a ocupação do Centro Administrativo de Brasília (Centrad), a qual depende da compra de mobiliário e a implementação de itens de tecnologia, por exemplo (veja Palavra do Especialista).
A assessoria de comunicação da Secretaria de Fazenda, Planejamento, Orçamento e Gestão informou não ter consolidado os números da arrecadação dos dois primeiros meses do ano. A reportagem, porém, realizou um levantamento de dados com base nas informações constantes no Sistema Integral de Gestão Governamental (Siggo).
Em janeiro, o Executivo arrecadou R$ 1,2 bilhão em impostos, taxas e contribuições de melhoria, cerca de R$ 50 milhões a mais que o montante angariado no mesmo período do ano anterior. Nos 31 primeiros dias de 2019, o crescimento nominal verificado ficou em cerca de 4% ; ou seja, foi maior que a inflação acumulada em 12 meses, que girou em torno de 3,75%. Portanto, ocorreu um aumento real da receita.
Mas, no último mês, a arrecadação ficou aquém das expectativas da Fazenda, que informou esperar mais, mas não quanto. O governo recolheu dos contribuintes R$ 1,43 bilhão. No mesmo mês de 2018, esse valor foi de R$ 1,40 bilhão. Isso quer dizer que a receita tributária cresceu apenas 2,2%, e, levando em consideração a inflação do período, o quadro é de queda. Em relação a este mês, até ontem, o Executivo local havia chegado a R$ 701,4 milhões ; no ano anterior, a cifra ao fim de março era de R$ 1,1 bilhão.
Planos
Mesmo em meio ao delicado cenário, para turbinar a receita, a Fazenda ainda aposta na redução de alíquotas tributárias, como o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCD) e o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) ; a proposta tramita na Câmara Legislativa. ;Ajudaria-nos a enfrentar a inadimplência;, resumiu André Clemente. Para aprovar o projeto, o governo precisa do sinal verde de 16 deputados. No entanto, nesta semana, a base aliada ao Buriti não garantiu o quórum necessário em plenário.
;Também investiremos R$ 50 milhões na modernização de sistemas para ampliar a fiscalização e implementaremos um sistema de metas para a equipe de receita e arrecadação;, completou o titular da supersecretaria. O governo acredita que o início do funcionamento do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania/Fiscal amplie a arrecadação. Por meio da proposta, o GDF prevê a mediação de débitos de pessoas físicas e jurídicas na ordem de R$ 32 bilhões ; do total, R$ 19 bilhões referem-se à inadimplência de grandes empresas.
R$ 741 milhões
Valor arrecadado pelo GDF, em março, com impostos, taxas e contribuições de melhoria até ontem
R$ 2,7 bilhões
Montante tributário angariado pela Fazenda entre janeiro e fevereiro
R$ 2,6 bilhões
Valor recolhido em impostos e taxas pelo GDF entre janeiro e fevereiro de 2018
Palavra de especialista
Roberto Piscitelli, professor de Finanças Públicas na UnB
A redução dos impostos
;O panorama é de incerteza na esfera federal: houve queda do nível de atividade econômica brasileira no primeiro trimestre, o futuro da reforma da Previdência é incerto, existe uma contínua crise política e não estão definidas as políticas econômicas do governo. Tudo isso impacta os estados. Assim, não se pode esperar aumentos significativos na arrecadação do Distrito Federal. Devido ao cenário, acredito que o governador Ibaneis Rocha enfrentará dificuldades para cumprir compromissos de campanha. Um deles merece destaque pelo risco.
A redução das alíquotas de impostos, neste momento, parece prematura. Todos nós gostaríamos que acontecesse, mas é importante que o Buriti o faça no momento em que esteja certificado de que há margem. Até mesmo as propostas que dependeriam apenas da União merecem cuidado. Por exemplo, com a concessão do reajuste à Polícia Civil, paga pelo Fundo Constitucional, médicos, professores e outros servidores vão pleitear o mesmo benefício. Ao mesmo tempo, o governo precisa garantir recursos para obras prioritárias, como a recuperação de pontes e viadutos. É tempo de agir com cautela;.