Cidades

Liga dos Autistas luta para derrubar estigmas relacionados ao transtorno

Para se livrar dos estigmas carregados com o diagnóstico de autismo, organizações unem esforços para desmistificar o transtorno e mostrar a importância da inclusão e do respeito

Jéssica Eufrásio
postado em 03/04/2019 06:00
Raquel, Dácio e Érica fazem parte da liga: treinamento para socializações reais
Lidar com autismo é encarar estigmas. O transtorno ainda habita no senso comum revestido de estereótipos: comum apenas entre meninos; de manifestação típica em crianças; e caracterizado por sinais severos. Afirmações como essas têm dificultado a procura por diagnóstico, informações e contribuem com a disseminação do preconceito. Ontem, Dia Mundial da Conscientização do Autismo, organizações sem fins lucrativos e grupos do Distrito Federal aproveitaram para chamar atenção ao que ainda precisa mudar.

Fora as dificuldades com a identificação dos sinais típicos do Transtorno do Espectro Autista (TEA), problemas para encontrar tratamento e a falta de inclusão são desafios enfrentados pelos integrantes da Liga dos Autistas. A comunidade surgiu como uma forma de reunir adultos diagnosticados e de se tornar uma fonte de apoio coletivo. O Instagram do grupo é acompanhado por mais de 7,5 mil seguidores.

No Facebook, dois grupos nasceram tendo os ;neurodiversos; como alvo e interessados em saber mais sobre essa condição. A liga visa desmistificar o transtorno e mudar a visão de pais e mães. Durante todo o mês, o grupo promoverá ações nas mídias sociais e de fiscalização quanto ao respeito dos direitos dos autistas, que também são considerados pessoas com deficiência.

Uma das 12 administradoras do coletivo, Érica Matos, 36 anos, conta que a proposta nasceu inspirada pelo trabalho de outros ativistas que lutam para dar visibilidade às causas dos autistas. Em grupos do Facebook e do WhatsApp, participantes de Brasília e de outras cidades do país conversam sobre o TEA e compartilham experiências. ;Funciona como um campo de treinamento para socializações reais. E temos resultados positivos;, ressaltou Érica, diagnosticada aos 35.

A interação com pessoas diagnosticadas ajudou Raquel Abiahy Paes, 40, a lidar com a depressão. A doença surgiu como uma comorbidade do autismo. ;Não são sintomas simples. Trata-se de um transtorno que envolve autoconhecimento e muitos profissionais não acreditam que somos autistas. A maioria dos tratamentos foi pensada para crianças. É um absurdo ter de convencê-los de que você precisa ser ouvido, porque alguns estão despreparados para considerar o TEA como uma possibilidade para o seu caso;, analisa. A moradora do Núcleo Bandeirante recebeu o diagnóstico no ano passado.

Locais cheios, barulhentos e interações sociais com muitas pessoas ao mesmo tempo costumam provocar ansiedade em Raquel. ;É como viver em um globo da morte diariamente;, relata. Ela ainda conta que a falta de apoio de conhecidos gerou momentos difíceis. ;Algumas pessoas dizem que queremos achar mais um problema para não ter uma vida estruturada, como a dos demais;, lamenta.

Bullying, incompreensão e preconceito estão entre alguns dos obstáculos que muitos dos integrantes da Liga precisam encarar. A situação se complica quando esse padrão de comportamento nasce em casa. ;Meu irmão e eu somos autistas. Nosso pai é médico e dizia que isso era frescura, coisa de ;retardado mental;. Ele não quis acreditar que tínhamos esse transtorno;, relembra o universitário Dácio Rogério Vieira, 19.

Índices


Estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que uma a cada 160 crianças do mundo tem TEA. No Distrito Federal, a Secretaria de Saúde não tem dados oficiais de quantas pessoas foram diagnosticadas com esse transtorno. No entanto, segundo informações da Secretaria de Educação, há 2.291 estudantes da rede pública de ensino com autismo.

Durante as eleições de 2018, o governador Ibaneis Rocha (MDB) prometeu transformar a Residência Oficial de Águas Claras em um centro de atendimento para pessoas com deficiência e doenças raras. De acordo com a assessoria do GDF, a iniciativa continua, e há estudos de impacto em andamento. Entretanto, o Buriti não tem mais detalhes a respeito da concretização do projeto.

Presidente da Associação Brasileira de Autismo, Comportamento e Intervenção (Abraci), Lucinete Ferreira de Andrade é voluntária na organização sem fins lucrativos que atende 60 famílias. Mãe de uma adolescente de 15 anos que também foi diagnosticada com TEA, ela lamenta que ainda exista um longo caminho a percorrer em relação à oferta de serviços para autistas.

;O dia 2 de abril não é para se comemorar. É para conscientizar. No DF, estamos em uma situação bastante limitada quanto a serviços públicos e inclusão. O diagnóstico ainda está bastante ineficiente;, comenta Lucinete. Ela acrescenta que encontra barreiras para que a filha tenha as mesmas oportunidades que outros adolescentes e torce por mudanças.

;Quero uma realidade diferente para que ela possa desenvolver as áreas nas quais tem habilidades, o que nem sempre é possível. Espero que haja mudanças na forma de as pessoas se comportarem quando veem algo que não se encaixa nos padrões de normalidade impostos pela sociedade. Nós e nossos filhos precisamos nos sentir acolhidos;, destaca a conselheira tutelar.

Conscientização

No Distrito Federal, a Lei n; 6.193, de 31 de julho de 2018, confere prioridade no atendimento da pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e autoriza a inserção do símbolo do autismo (fita do quebra-cabeça colorido) nas placas prioritárias. O Palácio do Buriti ficará iluminado, até o fim de abril, com as cores vermelha, amarela, azul e roxa, representando o logotipo
símbolo do autismo. A Câmara Legislativa do DF também terá luzes coloridas.

Para saber mais


Etapas de acolhimento


Saúde

Na Secretaria de Saúde do Distrito Federal, há duas portas de entrada para o atendimento por demanda espontânea de pessoas com autismo: as unidades básicas de saúde e os Centros de Atenção Psicossocial (Caps). O acompanhamento dos pacientes é feito nos Caps Infantojuvenis (Capsi), no Centro de Orientação Médico Psicopedagógica (Compp), no Centro Especializado em Reabilitação (CER II Ceal), no Adolescentro e no Hospital da Criança de Brasília (HCB) José de Alencar. Os Caps II atendem adultos e o Caps I atende a todas as faixas etárias.


Educação

Todas as instituições de ensino públicas do DF podem receber qualquer estudante. Segundo a Secretaria de Educação, eles passam por um processo de avaliação para detecção dos serviços e do apoio necessários para o pleno desenvolvimento.


Programe-se


Sábado

Programação especial no Centro Cultural Banco do Brasil (Setor de Clubes Esportivos Sul, Trecho 2). Todas as atividades são gratuitas e têm censura livre.

; 11h - Sessão BB Azul de Cinema com exibição do filme O touro Ferdinando

; 14h - Desenhaço na sala do Programa Educativo (perto da bilheteria)

; 16h -
Café com acessibilidade %2b visita sensorial à exposição 50 anos de Realismo: do Fotorrealismo à Realidade Virtual
(com interpretação em Libras)

; 18h - Apresentação musical: Uma Sinfonia Diferente

Domingo


Dia do Autista no Parque

Tarde com brincadeiras e apresentação da Banda dos Fuzileiros Navais
Local: Parque da Cidade ; Estacionamento do Parque Ana Lídia
Horário: das 14h às 18h ensura livre. Entrada franca.

23 de abril

Programação especial no Centro Cultural Banco do Brasil (Setor de Clubes Esportivos Sul, Trecho 2). A atividade é gratuita, tem censura livre e é necessário se inscrever pelo site: www.ccbbeducativo.com.

19h às 21h - Curso Transversalidades: Especial pelo Dia Mundial da Conscientização do Autismo (com interpretação em Libras)

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