Jéssica Eufrásio
postado em 11/05/2019 07:00 / atualizado em 19/10/2020 15:13
A vida pós-maternidade envolve coragem e organização. Não bastassem os desafios inerentes aos cuidados com uma nova vida, muitas mães precisam encontrar formas de se dividir entre dezenas de tarefas para dar conta da vida profissional e da pessoal. Na véspera em que se comemora o dia delas, algumas mães que não desistiram do sonho de empreender nem da maternidade compartilham com o Correio histórias sobre a jornada múltipla com a qual lidam desde o nascimento dos filhos.
Para Luzineide Getro de Carvalho, 50 anos, dividir-se entre o trabalho, a maternidade e a vida pessoal exigiu inteligência. Mãe de Caio, 20, e João Pedro, 13, a piauiense da cidade de Corrente também é empresária, administradora de um escritório de advocacia há 24 anos, além de duas imobiliárias. Nesse período, o apoio de pessoas próximas viabilizou os cuidados com as crianças. E os filhos acompanharam a rotina da mãe desde os primeiros meses de vida. “É preciso se organizar. Isso serve para mães e pais. Tem de ter responsabilidade, carinho e tempo. Tudo depende de você”, avalia Luzineide.
O lado materno da empreendedora se estendeu para o ambiente de trabalho, onde tornou-se conhecida pelo acolhimento oferecido aos demais. No escritório de advocacia, ela é considerada a “mãe” dos cerca de 50 funcionários da empresa. “Quando têm problemas, todos vêm aqui, pedem conselhos. Não são só seus filhos. Aqueles que estão próximos de você, se puder ajudar, é muito importante”, pondera a empresária.
Apesar da rotina intensa, Luzineide faz questão de reservar momentos para se inteirar sobre o dia dos filhos. “Encontro com eles, almoçamos, conversamos um pouco e, depois, levo o mais novo para a escola. Esse é um bom horário para eu sentir o que eles estão pensando”, comenta. Fins de semana juntos coroam os momentos partilhados entre o trio. “Não posso dar independência a eles ainda. Mas é muito gostoso chegar em casa, deitar com os filhos, ver um filme”, completa a empresária, moradora do Lago Sul.
Frutos
Quanto ao futuro, a expectativa de Luzineide é de que o sucesso na carreira seja passado adiante. Enquanto o filho mais novo ainda não decidiu qual carreira seguir, o mais velho estuda direito e se interessa pelo trabalho da mãe. Para auxiliar no desempenho dos meninos, a empresária tenta evitar a superproteção, mas sem abrir mão do diálogo.
“Um dos grandes desafios que temos é educar. Isso exige que você esteja sempre presente, ligada e antenada aos jovens. Temos de deixá-los aprender mais e serem mais independentes”, pontua Luzineide. “As maiores lições que posso passar a eles são honestidade e respeito ao próximo. Isso é fundamental.”
Amor pela educação
Desde o momento em que Paula Coelho, 36 anos, se tornou mãe, a vida dela ganhou novos rumos e passou por uma espécie de renovação. O gosto da empresária pelo ensino aflorava desde a época em que cursou pedagogia na faculdade. Mas o amor aumentou a partir do momento em que a vontade de ficar com o filho, Luís Guilherme Coelho, 9, se misturou ao desejo de empreender.
Ao perceber que as atividades extraclasse de Luís Guilherme eram sempre em locais diferentes, Paula teve a ideia de investir em um espaço onde ele e outras crianças pudessem receber acompanhamento educacional, principalmente para aprenderem a estudar. Pensando nisso, ela decidiu tirar o foco do direito, última área em que atuou, para inaugurar um espaço de atividades extraclasse e se dedicar exclusivamente à empreitada.
A psicopedagoga e outras duas pessoas se dividem entre os trabalhos na empresa, que oferece acompanhamento escolar e psicopedagógico. “Há crianças que passam duas horas lá. Outras, o turno inteiro. Tentamos juntar o máximo de serviços em um só local. O serviço de coaching educacional, por exemplo, ensina técnicas de estudo. São habilidades que não aprendem na escola, mas que os estudantes precisam ter”, explica Paula.
O sonho de uma vida havia ficado para trás com as demandas do trabalho. Mas, com o tempo, a rotina e a relação com o filho favoreceram para que este ano fosse o momento ideal de iniciar um negócio. “Tem pouco mais de um mês que abrimos o espaço, e já estamos de olho em outros locais. Pedagogia sempre foi minha paixão. Amo aprendizagem, crianças e o tanto que nosso trabalho faz com que elas se desenvolvam”, confessa a maranhense.
Desafios
Chegar até aqui não foi fácil, no entanto. Luís Guilherme nasceu enquanto Paula cursava direito. Com quase toda a família em Roraima, ela precisou trancar a faculdade por um tempo para cuidar do bebê. Mas, à medida que o filho crescia, a mãe conseguiu continuar os estudos, acompanhada do neném até em sala de aula. “Sempre prezei muito por cumprir meu papel. Até tive pessoas próximas que se ofereceram para ajudar, mas eu o levava comigo, porque era minha forma de me sentir segura e tranquila”, recorda-se.
Ainda segundo ela, a chave para mães no mesmo barco, que pensam em empreender ou que são empresárias e pensam em ter filhos, é a programação. “Na fase em que são bebês, eles realmente vão precisar muito de você. Mas, com força, garra, determinação e clareza, é possível, sim, juntar as duas coisas e se sentir realizada como mãe e profissional. Temos de compartilhar nossos sonhos e objetivos com nossa família. Assim, eles sabem como podem colaborar”, destaca Paula.
Passatempo que virou profissão
Paula Viana, 46 anos, abriu mão de um emprego de quase duas décadas como executiva em uma multinacional para se dedicar a algo que, até pouco tempo, era um passatempo. Mãe de Valentina, 7, e de Henrique, 4, a empresária atuava na área de tecnologia da informação antes de investir em um negócio próprio. Os trabalhos de criação de identidade visual, customização de itens de papelaria e elaboração de convites para eventos se transformaram em um nicho no qual ela decidiu investir há cerca de três anos.
A veia artística é de família. A mãe dela pinta e o tio é artista plástico. Ainda assim, a criação do negócio não foi programada. O volume das demandas aumentou e ela passou a gerenciar a empresa de madrugada, nos fins de semana, feriados e período de férias. O esforço levou ao patamar de estabilidade que o empreendimento alcançou e, com isso, Paula conseguiu mais flexibilidade para se dedicar exclusivamente ao emprego ou aos filhos. “É uma jornada pesada, mas gratificante. Empreendedor não trabalha menos de 10 horas por dia, mas o horário que tiro para estar com meus filhos, estou com eles”, destaca Paula.
Mundo encantado
A dedicação à profissão, à família e à vida pessoal requereu esforço. Paula reconhece que a filha mais velha, Valentina, sentiu um pouco a ausência da mãe, que ainda se dividia entre o emprego na multinacional e os trabalhos na empresa que surgia. O mais novo, entretanto, nasceu quando a mãe já trabalhava em casa. “Eles entendem que, quando trabalho, não podem atrapalhar, e sabem que, na hora em que estou com eles, é a hora deles. Os dois me veem fazendo convites, criando artes e, para eles, é um mundo encantado. Quando chega o aniversário deles, dizem: ‘É a minha vez’”, relata.
A experiência de um MBA na área de gestão contribuiu com os planos da brasiliense, que, apesar dos sacrifícios dos dois últimos anos, levou o negócio adiante. Hoje, ela celebra o fato de poder tirar folgas e viajar com os filhos. “A primeira coisa necessária é ter planejamento e organização. Costumo dizer às pessoas que não fiquem fazendo algo que não queiram. Às vezes, vale a pena voltar um pouco no sentido de salário ou de posição na empresa para fazer o que gosta e, lá na frente, colher os frutos”, recomenda Paula.