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Após 38 anos separados, Sueli passará primeiro Dia das Mães com filho

Após 38 anos, Sueli Silva tem, pela primeira vez, os três filhos reunidos para um almoço de Dia das Mães

Alan Rios
postado em 12/05/2019 08:00
Sueli e Ricardo (ao centro), com Julia e Marco Antonio, os irmãos: família reunida após 38 anos de separação

É almoço de Dia das Mães. Cada parente leva um prato e aproveita para distribuir presentes e abraços às homenageadas da família. A cena comum a cada segundo domingo de maio será repetida hoje por Sueli Silva, 56 anos, mas de uma forma bem diferente. A mãe reencontrou Ricardo Araújo 38 anos depois do dia em que ele foi tirado de seus braços, na porta do Hospital Regional do Gama (HRG). Agora, ela passará a data com ele e seus outros dois filhos, finalmente reunidos. ;Será o melhor Dia das Mães que já tive!”, celebra.

Sueli, Ricardo, Julia Christina Gomes, 23, e Marco Antônio Gomes, 21, já se preparam com ansiedade para a reunião de toda a família de Brasília neste domingo. Só não foi possível juntar cada parente porque o número cresceu recentemente: ;Agora também sou avó, já que conheci os três filhos do Ricardo, mas eles ficaram na Paraíba por causa da escola;, contou a goiana. Quem está na capital vai para Águas Claras, no apartamento onde mora uma das quatro irmãs de Sueli, que receberá a festa.

;Estou me sentindo a mãe do ano, com o bebê do ano! E esse vai ser um dia muito especial, porque vamos reunir toda a família, as tias do Ricardo, os tios, os primos, os sobrinhos; Estou muito feliz e emocionada! Parece até que o tempo com ele está voando;, brinca. O sentimento não poderia ser outro, já que a história da pedagoga com os filhos teve episódios tristes antes do final feliz. A primeira gravidez de Sueli aconteceu quando ela era uma adolescente de 15 anos e sofria abuso sexual por parte do filho da dona do abrigo em que morava. O estuprador não assumiu a criança, mas Sueli deu nome à pequena Juliana e decidiu criá-la com todo amor que não havia recebido.

A menina nasceu em 1979 e ficou com a mãe na instituição na qual vivia. Um ano depois, a goiana engravidou de um ex-namorado, mas só soube do bebê depois que o homem se despediu, rumo aos Estados Unidos. Determinada a criar mais uma criança sozinha aos 17 anos, em fevereiro de 1981, nasceu Luís Miguel, nome escolhido pela mãe. ;Lembro de ficar olhando as mãozinhas dele, os pezinhos; Era um sonho.;

Dois dias depois do nascimento, veio mais um episódio violento. Uma funcionária do abrigo no qual Sueli morava tirou o pequeno do seu colo e desapareceu com a criança depois de dizer à mãe que ela não teria condição de criar o bebê. Aflita, a jovem não entendia o que estava acontecendo e ninguém respondia suas perguntas. Foram 38 anos de silêncio.

Fim da espera

Sueli ficou quase quatro décadas passando o Dia das Mães sem saber onde estava o filho. Nesse período, algumas pessoas disseram que era para ela esquecer o garoto, que ele poderia, inclusive, estar morto. Além da dureza dessa possibilidade, a realidade também não foi doce com a mulher. Em 1996, ela perdeu Juliana: ;Ela faleceu quando tinha 15 anos, devido a uma asfixia de glote por alergia à medicação. Naquele mesmo ano, conheci o céu e o inferno. Em janeiro, nasceu a minha outra filha, Júlia, e, em julho, a Juliana se foi. Hoje, tenho um casal lindo, uma boneca de 23 anos e um filho de 21 que adora jogar futebol;, conta. Sempre que os dois ouviam a história da mãe, alimentavam esperanças de conhecer o irmão desaparecido.

Quando chegou a notícia de que o bebê, agora um homem, havia sido encontrado, foi uma festa. ;Achei que eu era a filha mais velha, aí ele apareceu e mudou tudo, para melhor. Quando nos vimos, nos abraçamos como se a gente se conhecesse desde sempre;, comemorou Julia Christina. O nome escolhido por Sueli ficou para trás, mas sem ressentimentos. Luís Miguel foi registrado como Ricardo, nome falado com emoção pelos familiares que o conheceram apenas este ano. A tia Suelma Gomes, 51, não aguentou nem esperar a reunião de hoje e buscou o sobrinho no aeroporto na semana passada. ;Chegou uma hora em que a gente não imaginava mais que poderia encontrá-lo, então, foi muito emocionante vê-lo chegando a Brasília com a minha irmã. E eu também tenho um filho que se chama Ricardo, então, esse momento é incrível!”, vibrou a cozinheira.

Se depender de Suelma, o sobrinho terá mais um motivo para se apaixonar pelos ;novos; parentes. ;Quero fazer uma comida especial para ele, perguntar o que ele gosta e caprichar;, disse. Sueli contou que o almoço será inesquecível para o filho, já adiantando que o cardápio terá pernil, bacalhau, salpicão e muito mais. Ricardo, então, nem se aguenta de ansiedade. Brincando que já entregou o presente de Sueli, que é ele mesmo, o corretor de imóveis acredita ainda em motivação divina para poder estar ao lado da mãe em uma data de celebração da maternidade. Em dezembro do ano passado, ele perdeu a mãe de criação em um acidente de trânsito, na Paraíba.

;Eu creio que tudo em nossas vidas está escrito por Deus. Se nossa história tinha que acontecer assim do jeito que foi, tudo bem. Eu aceitei isso e sempre acreditei que Ele tem um propósito na vida para cada um de nós. Faz seis meses que perdi minha mãe de criação e agora tenho minha mãe biológica, então acho que tudo estava conspirando para isso acontecer;, se emocionou. Outro fato que mexe com Ricardo é ser acolhido por uma nova família: ;Não vejo a hora de juntar todo mundo, nos abraçarmos e fazer uma foto, que será histórica;, garantiu.

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