Isa Stacciarini
postado em 18/05/2019 07:00
Na mesma região de Vicente Pires onde um prédio precisou ser implodido após cair e soterrar um trabalhador, outro empreendimento, o Park Residence, é erguido à revelia da lei. O edifício residencial tem seis andares e é construído irregularmente, sem alvará, desde 2017. Ele fica na Colônia Agrícola Samambaia, atrás do Taguaparque, a 400m do edifício colocado abaixo (leia Entenda o caso). A promessa é de que os apartamentos serão entregues até o fim do ano, mas alguns moradores ocupam o primeiro andar. O dono da estrutura é o sargento do Corpo de Bombeiros Carlos Eduardo de Andrade Muniz, conhecido como Cadim, acusado pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) de ser o líder de uma organização criminosa que, desde 2014, parcela lotes ilegalmente no DF e constrói para venda.
Na tarde de quinta-feira, a reportagem flagrou movimento de obra no Park Residence. Pelo menos quatro homens se dividiam no trabalho. Ao ver a equipe do Correio, eles fecharam a garagem do prédio. Um dia depois, na tarde de ontem, as faixas verdes afixadas na fachada do edifício que anunciavam a venda dos apartamentos com telefones para contato tinham sido retiradas. Todas as janelas estavam fechadas.
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Por telefone, o corretor do imóvel explicou que serão três apartamentos por andar, um total de 18. São unidades de um e dois quartos. A menor terá 40 metros quadrados e é negociada por R$ 120 mil. A segunda terá 60m; e custará R$ 160 mil. ;Temos seis moradores e, você comprando, nós já vamos trabalhar dentro dele e agilizamos a entrega;, explicou o vendedor, sem saber que falava com a reportagem.
Ele também garantiu a regularidade do empreendimento ilegal. ;Desde o início, o nosso prédio tem projeto, engenheiro e arquiteto. Está todo em dia. Quando você compra de um construtor que não tem nada, aí, é complicado. O nosso edifício é muito bem-feito, é o quarto do construtor, a empresa é dele, e o edifício está preparado para retirar o habite-se. Está tudo certo;, afirmou.
Mas a Secretaria de Proteção da Ordem Urbanística (DF Legal), antiga Agefis, confirmou a ilegalidade do empreendimento. O órgão explicou que a construção foi alvo de várias ações fiscais e, mesmo assim, continuou. A situação atual é de obra em fase de continuidade; por isso, a pasta vai encaminhar um ofício para a Polícia Civil. O empreendimento não pode ser regularizado, porque contraria as diretrizes urbanas para o setor.
Visita da administração
Depois que o Correio procurou a Administração Regional de Vicente Pires, uma equipe de engenheiros visitou o endereço. Em vistoria externa, eles identificaram o relógio da Companhia Energética de Brasília (CEB) do prédio desligado. A luz é fornecida a partir de uma fiação elétrica improvisada no poste público.
Os funcionários também observaram infiltração na laje por causa do acúmulo da água da chuva, manchas de mofo e deterioração da fachada. Algumas ferragens estão expostas.
O administrador de Vicente Pires, Daniel de Castro, explicou que o órgão formalizará um ofício e o encaminhará ao DF Legal. ;Orientamos que todo empresário procure a Central de Aprovação de Projetos, e a equipe analisa caso a caso;, alertou.
Na quinta-feira, a reportagem conversou novamente com o corretor. Ele irritou-se com a reportagem, explicou que comercializa diversos empreendimentos em Vicente Pires e disse que não passaria informações do proprietário. O Correio tentou contato com o sargento Carlos Eduardo, mas ele não atendeu as ligações. Por telefone, o advogado dele, Tiago Pugsley, alegou que a defesa não se manifestaria.
Liberdade provisória
O bombeiro foi preso quatro vezes acusado de parcelamento irregular do solo, dano ambiental, lavagem de dinheiro e associação criminosa. A última delas, em 21 de março de 2018, com os dois filhos. Ele está em liberdade provisória desde abril, beneficiado por um habeas corpus.
Edifício implodido
Em 5 de agosto de 2018, um empreendimento comercial que serviria para abrigar uma faculdade foi implodido depois que o técnico de edificações Agmar Silva, 55 anos, morreu soterrado, em outubro de 2017. A ação seguiu uma determinação da Justiça, após representação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). Mas a ação civil pública ajuizada pelo MPDFT foi arquivada após sentença que reconheceu a implosão como suficiente para o encerramento da questão judicial.