Cidades

Professora morta por policial viveu dois anos sob ameaças e perseguições

Professora de 43 anos é a 13ª vítima de feminicídio no Distrito Federal neste ano

Alan Rios, Sarah Peres, Jéssica Eufrásio, Caroline Cintra
postado em 21/05/2019 06:00
foto de Debora, vítima de feminicídio no DF, e do autor do crime, Sérgio
A sede da Coordenação Regional de Ensino do Plano Piloto e Cruzeiro tornou-se palco do 13; feminicídio registrado na capital federal neste ano. Na manhã desta segunda-feira (20/5), o policial civil Sergio Murilo dos Santos, 51 anos, entrou com uma pistola calibre 40 no edifício da Secretaria de Educação, na 511 Norte, e disparou três vezes contra a ex-namorada, a professora Debora Tereza Correa, 43. Depois disso, ele se matou. A 2; Delegacia de Polícia (Asa Norte) investiga o caso. Ainda não há data prevista para os sepultamentos.

Segundo relatos, Debora Tereza enfrentava problemas com o companheiro desde o início do relacionamento, em 2017. Naquele ano, ela registrou uma ocorrência por injúria, ameaça e dano material contra Sergio na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam). Em agosto passado, uma discussão entre o casal terminou na 13; Delegacia de Polícia (Sobradinho), onde ele trabalhava.

Na ocasião, os dois estavam em um carro. Debora pediu para descer do veículo, mas Sergio não deixou. Após alguns minutos brigando, a vítima conseguiu sair e pediu para que um casal chamasse a polícia. O homem tirou fotos do policial civil, que se exaltou. Eles se agrediram e foram encaminhados para a delegacia. Ali, os dois homens acabaram autuados por lesão corporal, e a professora pediu medidas protetivas contra Sergio pelas ameaças sofridas.

Apesar de o pedido ter sido deferido pela Justiça, Debora não cortou relações com o agente. Eles permaneceram juntos e, em setembro, quando tiveram uma briga, ela acionou a polícia. Sergio não foi preso, sob a alegação de que a professora permitia o contato entre os dois, e usou como testemunha o porteiro do prédio onde ela morava à época. Segundo relatos de amigos, a vítima acabou o namoro no ano passado, ao descobrir que o policial era casado, e se mudou para a Asa Norte. Ela deixou de atuar em Sobradinho e passou a trabalhar no Plano Piloto.

Uma colega de trabalho que preferiu não se identificar disse que Debora queria terminar o namoro, mas Sergio não aceitava e a perseguiu ao longo de dois anos. ;Nesse dia, ela fez ocorrência, passou a ter medida protetiva e se mudou de Sobradinho, onde ambos moravam, para ele não encontrá-la mais;, relatou. Ainda segundo a servidora, os dois nunca viveram juntos e, mesmo após as denúncias, ele continuava atrás dela. ;Quando alugou um novo local, ela não colocou nada em nome próprio e mudou de celular, mas ele a rastreou pelo trabalho;, completou.

Feminicídio da servidora Debora Tereza Correa da Coordenação Regional de Ensino Publico do Plano Piloto e Cruzeiro na 511 Norte.

Pânico


Sergio chegou ao local em um carro de transporte por aplicativo e entrou armado no edifício, às 9h42. Aparentando tranquilidade na portaria, ele apresentou a identidade funcional e disse que precisava avaliar o andamento de um processo com entrada na Regional de Ensino de Sobradinho. Passou da recepção sem ser revistado. O policial civil, então, dirigiu-se ao terceiro andar, onde fica a Subsecretaria de Gestão de Pessoas, e pediu para falar com a ex-namorada, funcionária do setor. Não se sabe, ainda, se ambos conversaram, mas, depois de a vítima se virar de costas, ele atirou três vezes contra ela. Em seguida, disparou contra o próprio olho.

A professora da Secretaria de Educação e advogada Lucilene Marques, 44, chegou ao prédio minutos após os tiros, antes da Polícia Militar. ;Foi surreal, uma tragédia de cena de filme. Ele se apresentou como se fosse resolver um processo administrativo. E, quando viu a Debora, sorriu para ela. Mas, depois, deu os tiros;, contou a servidora, a partir de relatos de colegas.

A servidora da Secretaria de Educação Isabel Helena Rabelo, 47, estava em uma das salas de fundo do prédio quando ouviu um barulho. A princípio, pensou que alguns armários tivessem caído. ;O ruído foi muito forte. Não deu para identificar o tiro. De repente, todo mundo saiu gritando. Foi quando soubemos que um homem tinha atirado contra uma servidora. Foi um momento desesperador e de pânico;, relatou.

A Polícia Civil ainda apura os detalhes do caso. ;É um fato lamentável. Estamos tomando todas as providências para falar com as testemunhas e saber as causas e os porquês de algo tão trágico. A Corregedoria-Geral da Polícia também está investigando;, ressaltou o delegado Laércio Rossetto, da 2; DP. Em novembro, Sergio foi condenado pela Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Sobradinho por crime de violação à Lei Maria da Penha. A denúncia foi apresentada pelo Ministério Público, em defesa de Debora, mas o réu recorreu e, em março, foi absolvido em segunda instância.

Em nota, a Secretaria de Educação lamentou a morte da servidora. ;Neste momento de dor, a SEE/DF (Secretaria de Educação) se solidariza com a família, os amigos e os colegas da servidora. A pasta está à disposição para contribuir na investigação do caso.; O secretário de Educação, Rafael Parente, não estava no local no momento do crime e cancelou a agenda do dia para seguir até a Coordenação Regional de Ensino do Plano Piloto e Cruzeiro. ;Está todo mundo muito triste e em choque tentando saber o que fazer para que isso não aconteça mais dentro das regionais, dentro das escolas. A gente não pode viver com medo e estado constante de que alguma coisa vai acontecer;, disse Rafael.
filmagens mostram momento em que servidora é morta por ex-namorado no trabalho

Empenho coletivo


O governador Ibaneis Rocha (MDB) lamentou o caso e anunciou que o governo investirá em campanhas para combater o feminicídio. Segundo o chefe do Executivo local, para isso, será necessário que toda a sociedade contribua. A proposta do GDF, segundo ele, é investir em campanhas publicitárias para que familiares e vizinhos denunciem a violência e para que os índices desse crime diminuam. ;Temos de ter atuação mais forte. Também precisamos do Poder Judiciário mais presente. As mulheres não devem, de maneira nenhuma, se calar;, destacou.

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