Cidades

Medida para desarmar agressor

Governador assina decreto que recolhe o armamento de servidores das forças de segurança acusados de crimes no âmbito da Lei Maria da Penha. Delegado ficará responsável por comunicar as corporações

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 24/05/2019 04:28


O assassinato da professora Debora Tereza Corrêa, 43 anos, pelo ex-companheiro e policial civil Sergio Murilo dos Santos, 51, motivou o governo a repensar as consequências do armamento de servidores das forças de segurança enquadrados em situações de violência contra mulheres. A partir de agora, policiais civis e militares, bombeiros, agentes penitenciários e qualquer outro trabalhador vinculado à Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal terão as armas recolhidas caso respondam a inquérito ou processo no âmbito da Lei Maria da Penha.

Sergio enquadrava-se nesse perfil, mas foi mantido o acesso à pistola da corporação, a mesma usada para disparar três tiros contra a servidora, dentro da sede da Coordenação Regional de Ensino do Plano Piloto e Cruzeiro, na 511 Norte. Depois de matá-la, ele usou a arma de trabalho para se matar.

A restrição foi oficializada por meio de decreto assinado ontem pelo governador Ibaneis Rocha. ;Essa é mais uma medida que nós estamos adotando para diminuir os índices de feminicídio no DF;, afirmou. Desde o início do ano, houve 14 casos na capital federal (leia reportagem abaixo). O governador promete, ainda, dar ênfase às campanhas de conscientização para mudar a postura social que contribui para casos de violência de gênero. ;Precisamos mudar, envolver a sociedade civil. Dizem que esse é um crime silencioso, mas não é. Aquela frase ;Na casa do vizinho não se mete a colher; tem de acabar. Assino esse decreto e vou assinar tantos outros que vierem para diminuir a questão do armamento do Distrito Federal;, adiantou.

O texto especifica que caberá ao delegado responsável pelo inquérito comunicar à corporação a qual o denunciado faz parte para que se tome as devidas providências. De acordo com o Executivo local, a medida vale também para as armas pessoais e só será revogada ao fim do processo respondido pelo servidor. Enquanto isso, o acusado deve ser remanejado para uma área administrativa.

A nova regra foi pensada pela Comissão Externa de Combate à Violência contra a Mulher da Câmara dos Deputados, e o pedido, protocolado e encaminhado ao governador pela coordenadora do grupo, a deputada federal Flávia Arruda (PL-DF). ;As forças policiais do Distrito Federal são formadas de homens de bem, corretos. São pessoas que, todos os dias, saem de casa para proteger a população e não querem os seus nomes ligados a homens que cometem crimes contra mulheres;, argumentou a parlamentar.

O secretário de Segurança Pública, Anderson Torres, apoiou a determinação. ;É mais uma medida no sentido de preservar vidas. As polícias concordam com isso, e aquele que está com problema, que agrediu, realmente, e que está respondendo por um crime, precisa ficar afastado da arma para evitar mais uma tragédia;, defendeu.

Ainda não há um levantamento de quantos servidores da área estão enquadrados nesse perfil. As forças de segurança têm 10 dias ; a partir da data de publicação do documento no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) ; para fazer essa análise e colocar em prática o decreto. Caso a pessoa que sofra a punição não cumpra a medida, sofrerá um processo administrativo, podendo culminar em demissão.

Próximas ações

Para que a nova medida garanta resultados efetivos, o governo orienta que as corporações forneçam assistência psicológica e psiquiátrica aos profissionais envolvidos em casos de violência doméstica. ;Trata-se de um crime no qual o agressor passa por um trauma e tem uma visão que também precisa ser tratada. Os corpos médicos das policlínicas precisam dar atenção necessária para tirá-los dessa zona de loucura e insensatez;, ressaltou Ibaneis Rocha.

A prioridade de combate ao feminicídio desencadeou o primeiro estudo da Secretaria de Segurança Pública que trouxe o perfil completo de todas as mortes por gênero no DF desde que o crime recebeu a tipificação, em março de 2015. É por meio deste levantamento que o governo embasará ações e estratégias de combate a esse tipo de crime.

Foram contabilizadas 68 mortes até meados de maio deste ano, das quais 91,7% ocorreram em ambiente familiar. Para o secretário Anderson Torres, essa característica limita o poder de polícia; por isso, exige uma ação integrada entre os poderes e as pastas. ;Não é fácil criar políticas públicas que entrem na casa das pessoas, mas é a prioridade. São crimes em que a cultura de uma sociedade moldada no erro se evidencia. Por isso, é preciso uma atitude integrada de Estado, incluindo a educação das novas gerações para quebrar o preconceito;, alegou.


Julgamento em Santa Maria
Até o fechamento desta edição, o julgamento de Alessandro Ferreira Floriano, 48 anos ; réu confesso do assassinato da mulher, Isa Mara Dantas Longuinho Floriano, 51 ; ainda não tinha sido encerrado. A vítima foi morta e teve o corpo incendiado e ocultado pelo marido, com quem era casada havia 18 anos. Parentes e amigos acompanharam a audiência e, do lado de fora do Fórum de Santa Maria, exibiram faixas com frases como ;Somos todos Isa Mara. Queremos justiça;. O crime aconteceu em 19 de janeiro de 2018, após Alessandro empurrar a vítima escada abaixo durante uma discussão.


Memória



Crime planejado
O policial civil Sergio Murilo chegou ao prédio da Coordenação Regional de Ensino do Plano Piloto e Cruzeiro, na 511 Norte, em um carro do sistema de transporte por aplicativo. Eram 9h43 quando as câmeras de vigilância do prédio o filmaram apresentando a identidade funcional e passando pelas catracas. Ele estava armado com uma pistola calibre 40, mas não foi revistado. Dali, o agente da Polícia Civil do Distrito Federal seguiu para o terceiro andar, onde a ex-namorada e professora Debora Tereza Correa, 43, trabalhava. Lá, ele se dirigiu à Subsecretaria de Gestão de Pessoas e, na recepção, pediu para falar com Debora. Às 9h45, a vítima apareceu e, ao se virar de costas, Sergio Murilo disparou três vezes contra ela. Em seguida, atirou contra a própria cabeça. Debora enfrentava problemas com o companheiro desde o início do relacionamento, em 2017. Naquele ano, ela registrou uma ocorrência por injúria, ameaça e dano material contra Sergio na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam). Em agosto passado, uma discussão entre o casal terminou na 13; Delegacia de Polícia (Sobradinho), onde ele trabalhava.

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