Cidades

Mais estudantes relatam supostos casos de assédio em escola militarizada

Sargento de 54 anos é afastado após denúncias de importunar estudante em escola militarizada. Ele teria mandado a mensagem ''beijos no cantinho da boca'' a celular de aluna de 17 anos. Outras relatam mais casos contra policiais que trabalham no colégio

Alan Rios
postado em 05/06/2019 06:00
Alunos exibem cartazes em protesto no interior do colégio público;Beijos no cantinho da boca;. A mensagem enviada por um sargento da Polícia Militar ao telefone celular de uma aluna de 17 anos do Centro Educacional 3 (CED 3), em Sobradinho, levou os alunos da instituição a se manifestarem contra um possível série de assédios sexuais. A unidade é uma das quatro escolas com gestão compartilhada entre as secretarias de Educação e de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF). Estudantes fizeram uma manifestação e cobraram medidas da direção. O caso, que veio à tona nesta terça-feira (4/6), é investigado pela Polícia Civil.

A receptora da mensagem que desencadeou a revolta é aluna do terceiro ano do ensino médio. Estuda no turno matutino, em seu primeiro ano no Centro Educacional 3. ;Eu vim para cá quando fiquei sabendo que a escola iria ser militarizada. Mas esperava uma espécie de segurança aqui dentro, e não foi isso que aconteceu;, contou a menina ao Correio. Ela relatou o caso à direção do colégio na segunda-feira. No mesmo dia, o militar, de 54 anos, foi afastado da função. ;Não vamos tolerar qualquer tipo de violência em nossas escolas, muito menos vinda de profissionais;, manifestou-se o secretário de Educação, Rafael Parente, no Twitter.

Também pela internet, outras alunas do CED 3 de Sobradinho divulgaram casos de assédio na escola. Apresentado-se como alunas do 6; e do 3; ano, três adolescentes afirmaram terem sido ;assediadas por policiais;. ;A militarização nas escolas públicas era para melhoria e até nossa segurança, até onde esperávamos. Porém, o que está acontecendo não é bem isso;, diz um dos relatos publicados. ;Uma aluna foi assediada por um sargento, e a outra levou um tapa na bunda. O mesmo pegou seu número e o de sua irmã em arquivos escolares e, por meio do WhatsApp, incomodou-a com frases do tipo ;Beijinhos no canto da boca;;, escreveu outra.

A vítima da mensagem disse que o texto não foi o primeiro ato de assédio do sargento. ;Um dia, eu estava passando mal e ele disse que o único remédio que poderia me dar era uma respiração boca a boca. Depois disso, foi essa mensagem do beijo. Então, tudo isso me deixou indignada e com medo;, comentou a adolescente. Aos superiores da PM, o acusado tentou se defender alegando que queria escrever aquela frase para a esposa, mas cometeu um erro no celular.

A corporação informou que o afastamento é um procedimento padrão quando há abertura de inquérito de investigação de conduta. ;O caso está sendo apurado pela Corregedoria e, até que se chegue a uma conclusão, o militar seguirá afastado;, comunicou a PM, por meio de nota. ;Sempre que há algo a ser investigado, distanciamos o envolvido para não prejudicar a apuração. Vamos colher novas provas e depoimentos para verificar se houve mesmo o assédio;, explicou o responsável pela diretoria disciplinar da instituição, major Gislando Alves. A apuração deve durar 30 dias.

Protestos

Cópia da imagem da conversa entre a garota e o sargento foi divulgada por meio das redes sociais e provocou indignação entre os alunos. Os estudantes expuseram, dentro do colégio, cartazes com dizeres como ;Basta!” e ;Não ao assédio;. Para ouvir e orientar os alunos, representantes da Secretaria de Educação estiveram no CED 3 na manhã desta terça-feira (4/6). ;A partir do momento em que ficamos sabendo que poderia ter tido um suposto assédio, começamos a verificar e tomar as providências;, afirmou Vanessa Garcez, secretária executiva de relações institucionais da pasta.

Um dos protestos foi marcado para o intervalo da aula, e a direção aproveitou o momento para dialogar com os estudantes. ;Reunimos todas as turmas e deixamos claro que estamos abertos a receber qualquer tipo de reclamação. Em um primeiro momento, eles nos passaram que têm medo de realizar denúncias, mas dissemos que não devem se sentir coagidos ou amedrontados;, comentou a representante da educação.

Uma aluna do CED 3 relatou ao Correio ter presenciado mais de um assédio. ;Eu mesma, a cada dia, fico mais desconfortável em ir para a escola. Uns policiais ficam olhando para a bunda (sic) das garotas e até fazem comentários machistas;, disse. Segundo ela, o problema acontece desde o começo do ano letivo. ;A diretora falou que esse acusado que mandou as mensagens era um ótimo policial, só isso;, destacou a garota.

Responsável pela direção pedagógica da instituição, Andreia Martins garantiu ter feito todos os procedimentos necessários quando ouviu a denúncia da mensagem de assédio. ;Falei à aluna envolvida que iríamos verificar tudo, conversar com as partes envolvidas e averiguar. Não consegui contato com os pais nem com a irmã responsável dela, então, pedi para ela aguardar. Até perguntei se poderia ser assim e ela concordou.; A garota afirmou que a direção só passou a dar importância ao depoimento após ver a proporção que o caso foi tomando nas redes sociais.

Mais uma manifestação está marcada para o intervalo de quarta-feira (5/6), no CED 3. ;Estamos apoiando os manifestos deles, até pelo índice que temos no DF de violência contra a mulher. E também vamos trazer projetos para a escola para discutir o assédio;, disse Vanessa Garcez. O major Gislando Alves completou: ;Eles deixaram claro que o protesto é contra o ato em si, não contra o modelo de gestão compartilhada.;

Depoimentos

Policiais da 13;Delegacia de Polícia (Sobradinho) foram ao colégio, onde tomaram depoimentos. O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) divulgou em nota que ;a Promotoria de Justiça de Defesa da Educação, no âmbito das suas atribuições, acompanhará o caso para verificar as medidas a serem adotadas;.

O deputado Fábio Felix (PSol) também esteve na unidade de ensino, representando a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Câmara Legislativa. ;A comissão tem atuado desde que recebeu relatos sobre a conduta de policial militar. Estamos acompanhando o caso de perto e elaboraremos relatório com as denúncias já registradas na CDH para que o GDF, a Corregedoria e o Ministério Público se pronunciem;, explicou o distrital.

Ampliação

Quatro escolas têm gestão compartilhada com a Polícia Militar no DF: os centros educacionais 3 de Sobradinho; 308 do Recanto das Emas; 1 da Estrutural; e 7 de Ceilândia. O governador Ibaneis Rocha (MDB) afirmou que o programa será continuamente ampliado. Até julho de 2019, serão 20 escolas da PMDF, número que vai dobrar até o fim do ano.
Ele prevê que, até o término de seu mandato, o DF terá 200 escolas militarizadas.

Memória: Agressão no pátio de escola

Outra instituição com gestão compartilhada entre as secretarias de Educação e de Segurança Pública foi palco de controvérsias recentes. Em 26 de abril, um policial militar foi filmado agredindo e imobilizando alunos na quadra de esportes do Centro Educacional 7, em Ceilândia. Segundo a corporação, a ação foi uma resposta para separar uma briga entre estudantes. Hoje, 40 dias após o caso, a PM disse que ainda apura se houve excesso.

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