postado em 23/06/2019 04:19
Lidar com uma emergência requer ânimo para quem recorre a hospitais e Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs) do Distrito Federal. Na terça-feira, na do Núcleo Bandeirante, não havia nomes de médicos na escala das 19h às 7h, quando o Correio esteve no local. Havia só dois nomes de médicos, que figuravam no horário das 13h às 19h. Sem encontrar profissionais ou informações, muitos pacientes optam por voltar para casa sem atendimento.
Consultora de vendas e moradora do Riacho Fundo 2, Thais Silva, 39 anos, deixou a unidade às 21h50, após nove horas e meia de espera. Ela saiu do trabalho com crise de enxaqueca e aguardou até as 19h40, quando conseguiu ser atendida. Durante esse tempo, a paciente vomitou na recepção do pronto-socorro. ;Comecei a filmar a situação às 15h, quando, finalmente, fiz a triagem, mas o atendimento só aconteceu à noite;, contou.
Thais acrescentou que ainda perdeu o dia de serviço. Isso porque o médico do último turno afirmou que não poderia dar um atestado referente ao horário da tarde. ;Fui diagnosticada com sinusite e recebi uma dipirona na veia, cujo efeito só vai durar seis horas. Sequer me deram um encaminhamento para um neurologista, mesmo eu sendo paciente com crises de enxaqueca. Para tomar uma dipirona na veia, eu não precisaria estar aqui;, reclamou.
Na mesma data, na UPA de Ceilândia, pacientes reclamaram da demora para o atendimento e dos constantes redirecionamentos. ;Viemos da UPA de Samambaia, passamos pelo HRC, fomos para uma das tendas (de hidratação para pessoas com sintomas da dengue), onde colheram meu sangue, e me mandaram para cá;, detalhou Vandeilma Pessoa, 40.
Com sintomas como dor de cabeça, vômito, falta de ar e dor nos rins, a moradora da região administrativa criticou o tratamento recebido. ;As pessoas mal olham para o paciente. É um descaso com o ser humano. Sempre que venho é mais espera. E, agora, acham que tudo é dengue;, afirmou. ;É preciso cobrar melhora no atendimento. Pagamos impostos. Nada disso é de graça;, completou Vandeilma.
Sem conseguir assistência em Vicente Pires, onde moram, a auxiliar administrativo Dayane Cordeiro Teles, 20, e o marido dela, o professor Lucas Brandão, 23, tiveram de se deslocar até a UPA de Samambaia. Lá, o atendimento estava restrito para pacientes em estado grave ou gravíssimo. Após espera de mais de três horas, e depois de confundirem as informações do prontuário de Lucas com as de outro paciente de mesmo nome, o jovem conseguiu passar por avaliação e ser medicado.
;Em Vicente Pires, disseram que não nos atenderiam, que teríamos de nos virar e que ;ele não morreria mais;, por isso, não havia motivo para nos preocuparmos. Sequer medicaram ele. Aqui em Samambaia, só há um médico. Ele estava com febre de 39,8;C, delirando e com tosse e dor no peito. A situação está precária. E sequer há previsão de alta para ele;, disse Dayane.
Justiça
A Organização Mundial da Saúde (OMS) não emite recomendações nem estabelece taxas ideais em relação ao número ideal de leitos, profissionais ou hospitais por grupos de habitantes. O mesmo vale para duração ideal das consultas médicas ou a quantidade de pacientes que devem ser atendidos por hora. Uma nota da entidade informa que estipular esses índices depende de fatores diversos, que divergem de região para região e de país para país. ;Isso torna impossível, além de pouco válido, o estabelecimento de uma ;cifra ideal; a ser aplicada de maneira generalizada por todos os países do planeta;, afirma o documento.
Ainda assim, um estudo do Conselho Federal de Medicina (CFM) apontou que, de 2010 até 2018, 664 leitos de internação do Sistema Único de Saúde (SUS) foram fechados no DF. A maior queda foi observada nos leitos pediátricos, com 284 unidades fechadas. Em compensação, na rede particular, esse número subiu 20%.
Especialista em gestão pública e professor no Centro Universitário de Brasília (UniCeub), José Simões acredita que o problema da saúde do Distrito Federal está na manutenção de um status quo e de modelos que não funcionam bem. ;É uma estrutura pesada, com muitos servidores e altos custos na folha de pagamentos, o que se reflete lá na frente, na falta de recursos;, avaliou José.
Ele comenta que a pressão de alguns grupos sobre o governo é um dos principais entraves para melhoras. ;Isso tem sido um fator para o GDF patinar e não deslanchar. Não estou falando em privatizar. O Executivo tem tido dificuldades para implementar o que funciona em outros estados, com parcerias, instrumentos de OSs (organizações sociais). Isso tem dado resultado e é um modelo que precisa ser testado e acompanhado de perto;, ressaltou o professor.
"É uma estrutura pesada, com muitos servidores e altos custos
na folha de pagamentos, o que se reflete lá na frente, na falta de recursos;
José Simões,
especialista em gestão pública