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Legalização da Fazenda Sálvia, próxima a Sobradinho, fica mais próxima

Acordo de cooperação técnica deve facilitar a legalização da área de 10,8 mil hectares entre Sobradinho e Planaltina. Região é ocupada, principalmente, por produtores rurais, que reclamam dos altos valores cobrados pela taxa de ocupação

Produtores rurais, chacareiros, condomínios urbanos, integrantes do Movimento Sem-Terra (MST) e de outras organizações sociais e até ciganos dividem uma das maiores propriedades da União no Distrito Federal. Com 10,8 mil hectares entre Sobradinho e Planaltina, a Fazenda Sálvia está separada em 238 glebas que hoje estão irregulares. Ocupantes da área, principalmente produtores que querem incrementar os investimentos, reivindicam há décadas a legalização das terras. Nesta sexta-feira (5/7), representantes da Secretaria de Patrimônio da União (SPU) e integrantes da Associação Brasileira de Produtores Rurais em Áreas da União assinam um acordo de cooperação técnica para regularizar a Fazenda Sálvia.

Esse é o primeiro passo para a legalização fundiária do terreno. O acerto deve servir de modelo para outras áreas rurais do governo federal no DF e no Brasil. Na Sálvia, há atividades como piscicultura, pecuária, além de ecoturismo. Com a escritura dos imóveis em mãos, os produtores querem expandir os negócios. A ilegalidade dos terrenos emperra a concessão de financiamento.

Não há dados precisos sobre o uso das terras da Fazenda Sálvia, e o acordo de cooperação deve incluir a realização de um levantamento atual e preciso dos ocupantes. Quem comprova a utilização da terra para fins rurais, com atestado de produtividade, obtém descontos na taxa de ocupação cobrada pelo governo federal. Hoje, cerca de 90% de quem está na área da fazenda têm direito a esse abatimento, o que mostra a destinação predominantemente rural das glebas. O certificado é concedido pela Empresa de Assistência Técnica e Expansão Rural do Distrito Federal (Emater).

O presidente da Associação Brasileira de Produtores Rurais em Áreas da União, Guilherme Magalhães, explica que o objetivo do acordo com o governo federal é ;unir forças visando à regularização;. ;A União tem 3 milhões de imóveis, mas só tem controle de cerca de 20% deles. Se ela regularizasse 10 por dia, ainda assim, seriam necessários mil anos para resolver a situação;, comenta Magalhães, defendendo a necessidade de normatização para legalizar terras rurais. ;Cada imóvel tem uma particularidade, mas a gente precisa de soluções padronizadas para que o processo seja como uma esteira de produção, em que o imóvel entra irregular e sai legalizado;, argumenta Guilherme.

Renda

Produtor de arroz, mandioca e verduras, Miguel Zuvanov ocupa 35 hectares desde 1981, dos quais 29 hectares estão preservados. ;Temos espécies ali que não são vistas em outras áreas;, conta. Miguel reclama dos altos valores cobrados pela SPU como taxa de ocupação e lembra que a exigência não é suficiente para resolver a falta de financiamento bancário. ;Na última sexta-feira, paguei um boleto da taxa de ocupação anual no valor de R$ 14,2 mil. Para recuperar isso com a produção, é muito difícil;, lamenta.

Manoel Messias comprou 22 hectares na Fazenda Sálvia em 1989. ;Comprei sem saber que era da União;, alega o criador de tilápia. Nas últimas três décadas, ele produziu hortifrutis e vendeu leite. ;Somos produtores, geramos emprego e renda;, lembra. Segundo ele, a Lei n; 13.465/2017, conhecida como Lei de Regularização Fundiária, trouxe instrumentos para legalizar terras da União. ;A venda desses imóveis será revertida em dinheiro para saúde, segurança e educação. É uma medida que beneficia toda a sociedade;, justifica o produtor. ;Dentro da Fazenda Sálvia, há muitas ocupações que não são usadas por produtores. Ainda assim, defendemos que a regularização seja para todos;, conclui.

A heterogeneidade das ocupações, no entanto, pode ser um empecilho à regularização completa da Fazenda Sálvia. O acordo com a SPU deve focar na legalização das terras usadas para produção rural, mas ficará pendente de solução a legalização de outras ocupações. Dentro dos 10,8 mil hectares da Sálvia há, por exemplo, acampamentos de movimentos sociais, como o MST. Em 2009, a SPU repassou ao Incra 760 hectares para a criação de um assentamento da reforma agrária.

Além disso, os condomínios urbanos construídos ilegalmente na zona rural, sobretudo às margens da DF-330, terão de passar por outro trâmite, que inclui mudanças na legislação, como o Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot). A reportagem procurou a Secretaria de Patrimônio da União desde a última segunda-feira, mas não obteve retorno até o fechamento da edição.

Acordo

Em 2015, a SPU e o Ministério dos Direitos Humanos assinaram termo de cessão de duas áreas somando 5,7 hectares a ciganos da etnia Calon. O acordo beneficiou mais de 150 pessoas, que chegaram à área há cerca de 10 anos. O Ministério Público Federal no Distrito Federal (MPF/DF) também cobrou medidas do GDF e do governo federal para proteger a área ocupada pelos ciganos.