Cidades

Venda de cirurgias no HRT é alvo de operação

O Ministério Público e a Polícia Civil apuram denúncias de que ex-funcionária do Hospital Regional de Taguatinga cobrava até R$ 5 mil para agilizar procedimentos na unidade. A enfermeira também é suspeita de falsificar atestados e receitas médicas

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 06/07/2019 04:21
Suspeita é de que ex-funcionária cobrava até R$ 5 mil para acelerar cirurgias no Hospital Regional de Taguatinga (HRT)

Uma ex-funcionária do Hospital Regional de Taguatinga é acusada de cobrar até R$ 5 mil para agilizar cirurgias e passar pacientes na frente de outros na lista de espera de procedimentos, além de ameaçar vítimas. A enfermeira Ruby Lopes atuava como supervisora de emergência da unidade até maio, quando foi exonerada do cargo comissionado. Também há suspeitas de que ela vendesse atestados e receitas falsas.

De acordo com as apurações no âmbito da Operação In Corruptionem (contra a corrupção, em latim), Ruby se aproveitava da função de supervisora para identificar possíveis vítimas e aliciá-las. ;Ela tinha muita entrada no Hospital Regional de Taguatinga e analisava a situação dos pacientes e o poder financeiro deles. Ela mesmo abordava e fazia a oferta;, detalha o delegado-chefe da Coordenação de Combate à Corrupção, aos Crimes contra a Administração Pública e contra a Ordem Tributária (Cecor), Leonardo Castro.

Os preços cobrados variavam de acordo com a particularidade de cada procedimento oferecido. Há relatos com registros de pagamentos que vão de R$ 350 a R$ 5 mil. A servidora também é acusada de ameaçar as vítimas que manifestavam a intenção de revelar as irregularidades. Ela dizia que tinha influência política para prejudicá-los, segundo as denúncias. Ruby trabalhou na Câmara Legislativa de abril de 2018 até o fim daquele ano, lotada no gabinete da deputada distrital Telma Rufino (Pros).


Conforme a investigação, há casos em que o pagamento foi feito, mas o procedimento de fato nunca chegou a ser realizado. Em outros, porém, houve a concretização das cirurgias. Os responsáveis pela apuração tentam desvendar de que maneira Ruby articulava para passar os pacientes para melhores posições nas listas de espera. O caso foi aberto no fim do ano passado, quando denúncias anônimas chegaram ao Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) e à Polícia Civil. Ruby trabalhou no HRT em diversas oportunidades, e as apurações indicam que os crimes eram cometidos desde 2017. Ela voltou ao hospital, em cargo de comissão, no início deste ano.

Material encontrado

Quatro mandados de busca e apreensão foram cumpridos ontem. Um deles no próprio HRT e outros três em residências relacionadas a Ruby, em Taguatinga e Ceilândia. Em um dos apartamentos, os agentes encontraram diversos documentos com timbre da Secretaria de Saúde e blocos de atestados e receitas. Além disso, havia quatro carimbos de médicos, com números de registros do Conselho Regional de Medicina (CRM).


Segundo o delegado Leonardo Castro, os blocos encontrados indicam que Ruby, além das propinas cobradas para cirurgia, vendia atestados e receitas falsificadas. O celular dela, que estava escondido embaixo de um colchão, também foi apreendido.

Existe a suspeita de que outras pessoas façam parte do esquema, mas ainda não é possível, de acordo com os investigadores, precisar se os médicos, cujos nomes e registros no CRM constavam nos carimbos, estavam envolvidos diretamente nas irregularidades. ;Esses carimbos encontrados podem indicar a participação desses médicos ou eles também podem ter sido vítimas dela;, explicou o delegado. Um dos focos da próxima fase da operação será identificar possíveis suspeitos de ajudar Ruby nas fraudes.


Medidas cautelares

A pedido do MPDFT, o juiz da 2; Vara Criminal de Taguatinga Wagno Antônio de Souza determinou a aplicação de medidas cautelares contra Ruby, entre elas o pagamento de fiança no valor de R$ 9.980 e a proibição de manter contato, de se aproximar de vítimas e testemunhas e de frequentar as unidades de saúde do Distrito Federal, a não ser em caso de necessidade de atendimento médico. O descumprimento pode motivar prisão preventiva.

O promotor Clayton Germano destaca que é fundamental que possíveis vítimas de Ruby procurem o MPDFT ou a PCDF para apresentar novas denúncias. ;É importante ressaltar que essas pessoas são vítimas e não responderão por nenhum crime;, destacou. ;Também é preciso que se diga que servidores que cometem irregularidades são alcançáveis pelo sistema de Justiça e devem pagar pelos crimes praticados;, acrescentou. Ruby pode responder pelos crimes de corrupção passiva, falsidade ideológica, falsificação de documento público e ameaça.

A operação foi realizada sob responsabilidade da 2; Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde (Prosus), do MPDFT, e da Divisão de Repressão ao Crime Organizado (Draco), da Cecor.


Intrigas

O advogado de Ruby, Radam Nakai, diz que a defesa aguardará o desenrolar da investigação para tomar medidas, mas refuta as acusações. ;Isso são intrigas, disputas políticas e amorosas. A Ruby nega tudo e não há como provar que ela recebia dinheiro, até porque a função dela não dava controle sobre as cirurgias;, argumenta. Ruby Lopes é o nome social da ex-servidora, que é mulher trans. Nos registros do Diário Oficial do DF e do Portal da Transparência, ela é identificada como Edson dos Santos.

Radam também contesta a hipótese de que os materiais apreendidos ontem possam indicar a venda de atestados e receitas. ;Ela é enfermeira, estava em casa com documentos de trabalho. Foi o que ficou lá, que alguém esqueceu. Eles querem fazer essa ligação, mas não tem como;, alega.

A assessoria da deputada Telma Rufino informou que não se manifestará sobre o caso e destacou que a investigação não tem qualquer relação com o mandato. Em nota, a Secretaria de Saúde informou que a direção do HRT está à disposição para colaborar com a apuração policial.


R$ 1.385,61
Salário líquido recebido por Ruby no HRT, de acordo com Portal da Transparência

R$ 9.980
Valor determinado como fiança para Ruby por medida cautelar diversa à prisão

2.762
Quantidade de cirurgias feitas no HRT nos últimos 180 dias


"É preciso que se diga que servidores que cometem irregularidades são alcançáveis pelo sistema de Justiça e devem pagar pelos crimes praticados;
Clayton Germano, promotor da 2; Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde (Prosus)


"Ela tinha muita entrada no Hospital Regional de Taguatinga. Ela analisava a situação dos pacientes e o poder financeiro deles;
Leonardo Castro, delegado-chefe da Cecor

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