Correio Braziliense
postado em 27/07/2019 04:07
No mês em que se comemora os 50 anos da viagem do homem à Lua, Brasília recebeu a astronauta norte-americana Anna Fischer, 69 anos, a primeira mãe a visitar o espaço. Além disso, há pouco mais de 40 anos, ela foi uma das seis mulheres selecionadas para integrar a equipe da Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (Nasa, sigla em inglês). Em palestra realizada ontem no auditório do Correio Braziliense, ela contou um pouco da experiência de viver oito dias fora da Terra.
Médica especializada em medicina de urgência, Fischer descreveu, em 1h, a preparação para a viagem, feita em 1983, e o dia a dia no espaço. “Parece que você está em casa. Quando você vai para o espaço, muda a perspectiva de onde você vem. Você sabe que é um cidadão, independentemente de onde venha. Mas ver o planeta Terra sem limites, sem borda, faz você pensar”, disse a astronauta.
Assim que recebeu o convite para viajar ao espaço, Fischer teve de tomar a decisão mais complicada de sua vida: deixar na Terra a filha de 1 ano e 4 meses para realizar um sonho. “Essa foi a coisa mais difícil que eu fiz na minha vida, porque eu me comprometi com a Nasa. Quando eles me ofereceram o voo, eu tive de aceitar. Várias mulheres precisam deixar seus filhos para trabalhar. Hoje, existem tecnologias como videoconferências, mensagens, celulares. Mas, à época, não tínhamos isso”, lembra.
A vontade de ser astronauta surgiu na infância. Aos 12 anos, o amor por matemática e ciências se revelava evidente. No entanto, o desejo parecia distante, principalmente porque todos os profissionais da Nasa eram homens. Hoje, após tudo o que viveu, encoraja as meninas que querem o mesmo. “Se tiver um sonho, não desista dele”, reforçou. Em 1978, Fischer compôs o primeiro grupo de mulheres a trabalhar na estação espacial.
Para a astronauta, hoje, todas as áreas da ciência estão abertas para as mulheres. No entanto, observa que elas se interessam menos por matemática e, geralmente, seguem para biologia ou outros setores. Sobre o anúncio feito pela Nasa afirmando que o próximo humano a pisar na Lua será uma mulher, ela afirmou: “Estou muito entusiasmada com isso. Espero que aconteça logo.”
Futuro
O auditório ficou tomado por crianças. Muitas delas, com os olhos brilhando, contaram que pretendem ser astronautas. A estudante Yasmim Moreira, 9 anos, chegou vestida a caráter. Com um macacão da Nasa, presente dado por uma amiga da mãe dela, Natima Alencar, 43, a menina tem o desejo de ser médica na Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço. Após ouvir a palestra de Fischer, a vontade ficou maior. “Não dá para escolher uma parte da história dela que é a minha preferida. Todas as partes são legais. Agora, me deu mais vontade ainda de seguir essa profissão”, admitiu Yasmin. “Que oportunidade. Que história incrível. Ouvir tudo isso é de arrepiar. O que eu puder fazer para inserir a minha filha cada vez mais nesses eventos, vou fazer. A gente incentiva bastante”, ressaltou Natima.
Recém-chegada da segunda viagem à Nasa, nos Estados Unidos, Sofia Kasbergen Gomide, 12, é apaixonada pela estação espacial desde os 4 anos. Mesmo com poucas lembranças da primeira experiência, a vontade de ser astronauta existia desde lá. Hoje, um pouco mais velha, tem certeza do que quer ser no futuro. “Ouvir a Anna foi muito incrível e inspirador. Eu só tinha visto astronauta e suas histórias pela internet. Essa oportunidade de ver uma pessoalmente foi demais. Eu estou muito feliz”, comemorou.
O evento promovido pela Embaixada dos Estados Unidos no Brasil contou com a presença do diretor executivo dos Diários Associados, Guilherme Machado.
* Estagiária sob supervisão de Guilherme Goulart
Três perguntas para
Anna Fischer, astronauta
Três perguntas para
Anna Fischer, astronauta
A ciência ainda é um campo hostil para as mulheres?
Eu não acho que nenhuma área da ciência ainda seja hostil para as mulheres. Na verdade, o problema que tem acontecido é atrair mulheres para a matemática. As cientistas estão indo para a biologia e para várias áreas da ciência. Mas há uma grande busca por mais mulheres na matemática. Eu realmente acredito que todas as áreas da ciência estão abertas para as mulheres. Se tivesse alguma coisa que eu pudesse dizer, eu diria: “Mulheres, eles te querem na matemática! Então, pensem sobre isso!”.
Você aceitou o convite para viajar ao espaço e deixou a filha pequena. Como foi tomar essa decisão?
Essa foi a coisa mais difícil que eu fiz na minha vida, mas a decisão não foi difícil, porque eu me comprometi com a Nasa, então não existia decisão. Quando eles me ofereceram o voo, eu tive que aceitar. Não foi fácil deixá-la quando ela tinha apenas 16 meses, mas várias mulheres precisam deixar seus filhos para trabalhar. Hoje, existem tecnologias como videoconferência, e-mails, mensagens, celulares, o que faz ser muito mais fácil. Mas, à época, nós não tínhamos isso, então, foi ainda mais difícil. Minha filha agora está passando o mesmo com a filha dela. Ela é jornalista e vai cobrir as eleições americanas, o que exigirá que ela fique, às vezes, até três semanas longe de casa. Ela veio me perguntar o que eu pensava sobre isso e eu perguntei: “Você se lembra quando eu fui embora?”, e ela disse que não. Perguntei, então, se ela estava orgulhosa, feliz, de eu ter feito o que fiz, e ela disse que sim. Então, eu falei: “Bem, então Clara também ficará feliz. Será mais difícil para você. Clara ficará bem”.
Que conselhos você daria para as crianças que sonham se tornar astronautas?
É realmente muito difícil se tornar um astronauta. Nos Estados Unidos, são em média 18 mil aplicações para 12 vagas e acredito que a concorrência deve ser muito grande para programas de outros países também. É difícil ser selecionado, então, a primeira coisa que eu diria seria: escolha alguma coisa que você ama. Esse é o conselho número um. Não escolha coisas pensando que no futuro isso te ajudará a se tornar um astronauta se você realmente não gostar disso. Escolha uma área que ama, pode ser a medicina, pode ser cientista, tanto faz. Existem duas formas de ser um astronauta. Você pode ser um piloto, e aí o caminho mais fácil é entrar na Força Militar. Não é uma exigência, mas há uma grande chance de ser selecionado. A outra forma é se tornar um especialista e, de verdade, é possível escolher quase qualquer área da ciência. Um colega meu era veterinário! Depois, é preciso ter um nível alto de estudo, PhD, realmente se dedicar, tirar licença privada de pilotagem, qualquer coisa que mostre que você tem o perfil para se tornar um astronauta. Saber russo também é um grande ponto de destaque. Se eu pudesse apostar, apostaria que, nos próximos anos, será necessário ter conhecimento de chinês também. Então, aprender mandarim não seria uma má estratégia.
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