Cidades

Investigados por fraude

Ao menos cinco ex-servidores da fundação são investigados por desviar dinheiro de bolsas-salários de detentos dos regimes fechado e semiaberto. Polícia Civil cumpriu oito mandados de busca e apreensão ontem

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 03/08/2019 04:07
Mais de 1,4 mil detentos que cumprem pena no DF prestam algum serviço, dentro ou fora de presídios

Ao menos cinco ex-servidores da Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso (Funap) são investigados por desviar dinheiro das bolsas-salários de detentos dos regimes fechado e semiaberto, que exercem alguma profissão por meio da entidade. As fraudes foram identificadas em março deste ano, por meio de relatório do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF). A Polícia Civil, com o apoio do Núcleo de Controle e Fiscalização do Sistema Prisional (Nupri) do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT), deflagrou ontem a Operação Pecúlio para apurar o caso. Foram cumpridos oito mandados de busca e apreensão contra o grupo, que atuou no setor financeiro da entidade entre 2017 e 2018.

A investigação sobre o caso ainda é preliminar e, portanto, não foi estipulado o valor do prejuízo causado pela suposta fraude aos cofres públicos. A Funap estima um rombo inicial de R$ 300 mil. Os detentos que trabalham, dentro ou fora dos presídios, recebem uma bolsa de pelo menos R$ 750. De acordo com o delegado Rodney Martins Farias, da Divisão de Repressão à Corrupção e aos Crimes Contra a Administração Pública (Dicap), os ex-servidores comissionados fraudavam esses contratos. ;Eles chegavam a criar contratos com empresas fictícias, com valores das bolsas maiores dos que as oferecidas oficialmente;, detalha. O excedente, explica o delegado, ficava com os investigados. ;Os presos não chegavam a saber de nada, pois sequer tinham acesso às informações. Os suspeitos omitiam os dados;, completa.

Uma segunda modalidade do golpe era referente à parte da bolsa dos apenados depositada em cadernetas de poupanças. Os saques desses valores ; que variam de um a dois terços do salário mínimo ; eram realizados em dinheiro. Nesses casos, o detento só pode retirar a quantia quando em liberdade. Mais uma vez, por meio do esquema fraudulento, os ex-servidores ficavam com uma fatia do montante, sem o conhecimento do apenado.

;Quando o preso conseguia o regime aberto e ia à fundação para receber o valor, acontecia a mesma coisa: o repasse menor da quantia e a falta de informação ao apenado. Temos diversas declarações, coletadas em depoimento, em que o preso explica que não conseguia ter acesso ao extrato da conta. Os ex-servidores se esquivavam para não dar as informações;, diz o delegado Rodney Farias.

Agentes apreenderam uma arma de fogo, aparelhos telefônicos, eletrônicos e documentos em residências no Gama, no Núcleo Bandeirante e em Samambaia Norte. Um homem foi preso em flagrante por posse ilegal de arma de fogo. O diretor da Dicap, Wenderson Souza e Teles, destaca a importância dos materiais apreendidos. ;Tudo passará por uma análise minuciosa, para termos mais provas que comprovem todas as fraudes e como era o modus operandi do grupo.;

Destruição de provas
Dois servidores da gestão passada foram afastados das funções em março de 2019, quando começou uma inspeção interna nas contas da entidade, de acordo com a diretora executiva da Funap, Deuselita Martins. Os suspeitos estavam atrapalhando a obtenção de dados e documentos sobre as supostas fraudes. Além disso, um detento do semiaberto foi flagrado engolindo papéis referentes aos desvios de dinheiro, no mesmo mês.

Deuselita Martins afirma que, antes de assumir a chefia da fundação, em fevereiro, foi acionada pelo secretário de Estado de Justiça e Cidadania do Distrito Federal, Gustavo do Vale Rocha, sobre o caso. Ao questionar os servidores comissionados, não obteve parte dos documentos necessários para uma análise completa. ;A falta de organização indica um esforço em impedir a descoberta de que o suposto esquema estava acontecendo.;

O detento foi autuado em flagrante pelo delito e encaminhado à 30; Delegacia de Polícia (São Sebastião), responsável pelos crimes que ocorrem no Complexo da Papuda. A Polícia Civil não deu informações sobre o caso nem informou se há presos envolvidos no esquema, para não atrapalhar as investigações. A Funap afirma que os detentos que realizavam serviços nas áreas administrativas e financeiras foram realocados. Além disso, os apenados não trabalharão mais nessas funções e todos os documentos da entidade serão digitalizados.

Prestação de contas
O Tribunal de Contas informou, em nota, que a auditoria realizada em março deste ano nas contas da Funap de 2015 a 2017 identificou diversas falhas. ;Verificou-se que a Fundação realizou diversas despesas que não tiveram o devido registro contábil, as quais foram realizadas à margem do Sistema Integrado de Gestão Governamental (SIGGO) e resultaram no descompasso entre o aspecto financeiro e contábil de suas contas. Essa foi a principal razão indicada pelo Conselho Fiscal da Funap/DF para a declaração de irregularidade das contas da Fundação, pelo próprio conselho, no período de 2015 a 2017.;

Para Deuselita Martins, da Funap, a elaboração de um plano de carreira dos servidores da entidade contribuiria para coibir esse tipo de crime. ;Diminuiria a possibilidade de desvios de carreira e fraudes, como as que foram detectadas por esta gestão. Enquanto a proposta passa por análise, acompanhamos as investigações e os possíveis suspeitos. Quando tiver o aval da Cecor (Coordenação Especial de Combate à Corrupção, ao Crime Organizado e aos Crimes Contra a Administração Pública), para não atrapalharmos o andamento do caso, vamos iniciar uma apuração disciplinar quanto à conduta desses servidores;, garante a diretora executiva.



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