Ana Dubeux
postado em 04/08/2019 15:00
Tomar o todo pela parte frequentemente leva à injustiça. Mas, neste caso, se justifica. O Brasil mata mulheres em série. Ou institucionalizamos a violência doméstica como um problema de Estado, ou continuaremos gritando em pequenos cômodos de quatro paredes. Ou mostramos diariamente que, por trás de assassinatos, está o machismo, ou a violência de gênero será sempre um ato isolado de um maluco possessivo e ciumento qualquer. E não é.
O feminicídio e as agressões em geral contra as mulheres são problemas crônicos, sociais e institucionais no Brasil ; talvez no mundo. Que tal olhar para isso em vez de surfar na pororoca de idiotices e imbecilidades que dominam as redes sociais? Vamos discutir o Brasil real? Na semana em que a Lei Maria da Penha, um indiscutível avanço contra a violência de gênero, completa 13 anos, o Correio publica reportagens de Helena Mader, Adriana Bernardes e Deborah Fortuna, que vão mostrar o impacto das agressões em meninas e mulheres.
A narrativa da covardia se repetiu 14.985 vezes no ano passado ; número de ocorrências de violência doméstica registradas nas delegacias do Distrito Federal em 2018. Ou seja, a cada 35 minutos, uma mulher desesperada expôs detalhes de seu martírio a uma autoridade policial. Sem contar as milhares de vítimas de violência física e psicológica que se calaram sobre o seu sofrimento.
Dos casos registrados, 1.048 ; ou 7% ; deles foram abusos contra vítimas que tinham menos de 18 anos. São meninas que sofrem nas mãos de seu primeiro amor, de seu pai, padrasto, avô, tios, irmãos, vizinhos, tornando o vínculo afetivo um fardo a carregar e levando a uma vida de sofrimento. Hoje, a Lei Maria da Penha é um reforço ao Estatuto da Criança e do Adolescente, aumentando a proteção às meninas que sofrem violência doméstica.
Os avanços indiscutíveis proporcionados pela Lei Maria da Penha foram na direção da inclusão de políticas de Estado para a proteção das mulheres. Mais do que punição ao agressor, levam ao afastamento dele do lar e às medidas protetivas para mantê-los longe das vítimas. Além disso, coloca o Brasil na condição de responsável por reduzir a violência. ;Quando o meu processo foi debatido, a OEA encaminhou um relatório ao Brasil solicitando a desconstrução do machismo por meio da educação. O governo precisa investir nos ensinos fundamental e médio para que haja uma sensibilização desde a infância;, disse Maria da Penha, na entrevista que você lê hoje aqui no Correio.
Colhemos e relatamos, a partir de hoje, depoimentos de intenso sofrimento, dor e martírio. Ouvimos especialistas no tema e profissionais que lidam com a rotina de receber, escutar e acolher vítimas no DF. Esperamos que fiquem conosco durante esta semana, na certeza de que esta é uma discussão a ser feita sempre e por muitos. Precisamos estar fortes e juntos para combatermos o machismo. Precisamos ampliar essa voz que grita contra o machismo. Precisamos libertar a mulher da condição de oprimida, violentada, subjugada, torturada, assassinada. Vamos falar, discutir, exigir mudanças? Vocês são meus convidados.