Bruna Lima
postado em 16/08/2019 06:00
As coloridas vias do Mercado Sul ganham ainda mais ritmo, cheiros, sabores e vida no próximo sábado. O tradicional Arraiá do Beco chega à 9; edição trazendo muita música, artesanato, apresentações artísticas e comida boa na QSB 12/13, em Taguatinga Sul. A festa colaborativa, produzida pela comunidade, é expressão cultural, política e de economia solidária do complexo que, ao longo dos anos, trouxe novo significado para as edificações abandonadas do antigo centro comercial de Taguatinga.
O evento conta, desta vez, com um apelo político e de resistência cultural ainda maior. Por meio dele, a comunidade local quer chamar a atenção das autoridades para conseguir a concessão de uso das 14 lojas ocupadas desde 2015. O espaço estava abandonado há quase duas décadas, o que comprometia a segurança e a saúde pública. É o que afirma o mímico e educador Abder Paz, 32 anos, que há 13 anos mora, trabalha e milita no Mercado Sul.
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;Eram locais lotados de lixo, bichos e com foco de dengue. Abrimos as lojas porque faltava espaço para os artistas se instalarem e produzirem, investindo na economia criativa. Cumpre-se, assim, um propósito social que antes não existia;, justifica.
O Coletivo Mercado Sul Vive, articulação que nasceu a partir da ocupação, recentemente moveu uma ação civil pública chamando o Governo do Distrito Federal (GDF) a se responsabilizar pelo projeto. Na segunda-feira (19), uma audiência de conciliação vai discutir a situação. ;As autoridades reconhecem a importância do espaço como fomentador da cultura popular brasileira e, por isso, pedimos o apoio formal à causa. Esperamos que o GDF vá para essa audiência com um norte, valorizando esse espaço efervescente, que respira, vive e faz cultura em Taguatinga;, diz Abder.
Festa
O Arraiá do Beco ocorre todo ano em agosto e é uma edição especial da Ecofeira, evento mensal que nasce a partir da ideia de comercializar os produtos dos moradores locais da região. Sem apoio financeiro, a comunidade se sustenta com base na economia solidária, desde a produção de artesanatos à cultura, que resgata as raízes brasileiras, com ênfase nas matrizes africanas e nordestinas.
É da música que Juraci Moura, 45, tira o sustento dele e da família. Encontrou no Mercado Sul o polo para estudar, produzir e transmitir conhecimento artístico. ;Faço meus instrumentos, vendo, toco, dou aula, oficinas e workshop. É meu estilo de vida, meu sustento, diversão. Minha liberdade veio por meio da música;, revela.
Juraci é vocalista e percussionista da banda Som de Papel, que se apresenta gratuitamente no sábado, ao lado de outros nove grupos. Todos os instrumentos de percussão são de produção dele, e o forro das peças é uma colaboração do trabalho de Virgílio Mota, 68, artesão que produz móveis e utensílios com papelão e sacos de cimento há 13 anos.
;Aqui a gente constrói junto, convive, sobrevive, luta um pelo outro. Isso aqui é uma família;, destaca Virgílio.
O artesão garante ter prazer no ofício, que divide com outros funcionários, como André Luis Salomão, 44. Na juventude, ele ficou entre a vida e a morte após ser atropelado por um ônibus e precisou encarar anos de reabilitação. Encontrou no Mercado Sul, ao lado de Virgílio, uma forma de reconstruir as próprias perspectivas. ;Eu faço o acabamento dos instrumentos. Gosto muito da minha função, das pessoas e de tudo que o Mercado Sul é e faz.;
9; Arraiá do Beco
Data: neste sábado, 17 de agosto
Local: QSB 12/13 ; Taguatinga Sul
Horário: das 15h às 23h
Atrações
; 15h Praça dos Mamulengos
; 16h Duo Ana Flor
; 17h Coral e Orquestra Experimental Voz Jovem
; 18h Baque Mulher BsB
; 18h Jongo do Cerrado (Palco Paralelo)
; 19h Raíz de Macaúba
; 20h Galeria Instrumental
; 21h Pé de Cerrado
; 22h Som de Papel
; 23h Forró do B.
Preocupação com a identidade
O Mercado Sul foi construído na década de 1950, sendo um dos primeiros centros comerciais do DF, e tinha como foco os candangos. O local funcionava como uma feira livre, com armazéns, armarinhos, açougues, lanchonetes. Com a chegada dos grandes supermercados, a área caiu no abandono e, nos anos 1980, se tornou um reduto da boemia, o que começou a atrair a classe artística.
Uma década depois, o Mercado Sul se firma como grande ponto cultural do DF, atraindo centenas de artistas e artesãos de todos os cantos. Em fevereiro de 2015, ocorreu a ocupação do espaço com a apropriação dos boxes ociosos pelos moradores e trabalhadores locais, que os utilizam para criação de ambientes de trabalho colaborativos e sustentáveis, como ateliês e cozinha comunitária.
A comunidade, em conjunto com o Coletivo Mercado Sul Vive, se empenham na missão de consolidar essa ressignificação do espaço como forma de geração de renda e preservação do patrimônio cultural brasileiro. Atualmente conta com ambientes artísticos, moradias, ateliês, oficinas, teatros e mais uma série de atividades.