Cidades

Pros-DF é investigado por suspeita de superfaturamento eleitoral

Reportagem do Correio Braziliense resulta no cumprimento de mandados de busca e apreensão na sede e na gráfica do partido. Legenda é suspeita de adulterar gastos com material de campanha de 33 candidatos a deputado distrital

Alexandre de Paula, Ana Viriato
postado em 16/08/2019 06:00
Policiais federais estiveram na sede do Pros, no Lago Sul, pela manhã: apreensão de documentos, computadores e material usado nas eleiçõesO Pros está na mira da Justiça Eleitoral e da Polícia Federal por suspeitas de superfaturamento nas prestações de contas de diversos concorrentes a deputado distrital nas eleições de 2018. Nesta quinta-feira (15/8), agentes da PF estiveram na sede nacional do partido, no Lago Sul, e na gráfica da legenda, em Planaltina de Goiás, em busca de documentos, computadores, celulares e materiais que possam comprovar as supostas irregularidades. A diligência foi determinada pelo desembargador do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) Telson Ferreira após pedido do Ministério Público Eleitoral (MPE). O processo corre em sigilo, mas a operação foi deflagrada após denúncia do Correio Braziliense, em fevereiro.

A decisão que autorizou as buscas nos endereços do partido, obtida pela reportagem, foi embasada também pelo depoimento prestado, na terça-feira, pelo secretário nacional da sigla, Edmilson Boa-Morte. À Justiça, ele confirmou o superfaturamento nas contas de candidatos do DF e de outras unidades da Federação. Além disso, detalhou o modus operandi do presidente da legenda, Eurípedes Júnior, e da tesoureira do partido Cintia Lourenço da Silva.

O documento a que o Correio teve acesso revela também que o Ministério Público Eleitoral solicitou o encaminhamento da cópia dos autos com depoimentos e documentos anexados ao processo à Polícia Federal. O MP pretende, com isso, requisitar a abertura de um inquérito policial para apuração dos fatos sob a ótica criminal. Nesse caso, os alvos principais seriam Eurípedes Júnior e Cintia Lourenço. A solicitação não foi analisada pelo desembargador, que, pela urgência, analisou inicialmente apenas o pedido de busca e apreensão.

Comprovantes

Em fevereiro, o Correio revelou que o Pros declarou à Justiça Eleitoral gastos de R$ 5,7 milhões com material gráfico da campanha de 33 concorrentes à Câmara Legislativa. Entretanto, os candidatos que, no total, somaram apenas 11,9 mil votos no pleito de 2018 garantem que caciques da legenda inflaram os números e negam o recebimento das vultosas quantidades de santinhos e adesivos.

A fartura dos itens, declarados pelo partido e custeados por recursos públicos dos Fundos Partidário e de Financiamento Especial de Campanha, é tamanha que seria possível, por exemplo, estampar três vezes todos os 1,7 milhão de automóveis da capital com os 6 milhões de adesivos que a legenda informou ter confeccionado.

Para concretizar o repasse médio de R$ 172 mil em propaganda impressa a cada candidato, o partido teria utilizado uma brecha na legislação eleitoral que dispensa a apresentação de comprovantes e recibos na transferência de valores em material de campanha. Essas transações são apresentadas como ;receitas estimáveis em dinheiro;.

A gráfica responsável pela impressão do material é do próprio partido ; o que se comprova pelo CNPJ estampado em alguns dos santinhos ; e fica em Planaltina de Goiás (GO). Conforme os relatos de candidatos, Eurípedes Júnior teria ciência das supostas irregularidades e se beneficiaria delas.

Coação

O mandado de busca e apreensão baseia-se no processo de prestação de contas de Marizete Pereira. Segundo o documento produzido pelo Pros, ela recebeu R$ 159 mil em material para a campanha de 2018. Teve 490 votos. Em depoimento ao TRE, Marizete admitiu que sofreu pressão para assinar a declaração às pressas e não teve tempo sequer de conferir os valores apresentados pela legenda.

;Eu me dei conta do valor de mais de R$ 100 mil quando o meu celular começou a tocar (após reportagem do Correio Braziliense). Só soube depois que saiu na imprensa;, afirmou. ;Fiquei sabendo, quase nos últimos minutos, que tinha que fechar as contas. Se eu não fechasse, seria prejudicada. Eu que mantenho minha família e criei os meus dois filhos. Fiquei com medo de ser prejudicada no TRE;, declarou ao Tribunal e ao Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT).

A ex-candidata a distrital negou ter recebido a quantia de material gráfico descrita pelo partido. ;Recebi zero, zero, zero, como está nos autos. (Não recebi) Nem em espécie. Foi colocada nos autos a minha conta bancária. O material chegou quatro dias antes. Foi uma terça-feira. E a eleição era no domingo;, contou.

Em nota, o Pros alega que o material impresso para os candidatos da legenda foi produzido em gráfica do partido, o que tornaria impossível a hipótese de superfaturamento. ;Ao ser doado ao candidato, é necessário haver uma estimativa do valor, que é diferente do custo real de produção. Portanto, se o valor informado é mais elevado ou mais baixo, isso não significa vantagem financeira para o partido, já que não houve mescla de dinheiro.;

A legenda destaca que a ação da Polícia Federal não é de natureza criminal. ;Trata-se de uma diligência determinada em um processo de prestação de contas, de natureza cível;, informa o texto. ;Dessa forma, o partido reitera que desconhece qualquer atitude de malversação de recursos na campanha eleitoral e continuará aguardando a apuração dos órgãos competentes;, complementa.

Para saber mais

Reprovação das contas em Goiás

Irregularidades muito similares às que teriam sido praticadas no DF causaram a reprovação das contas de Dona Cida, candidata a deputada federal por Goiás pelo Pros. Mãe de Eurípedes Júnior, presidente nacional da legenda, ela recebeu R$ 1,7 milhão do partido. Chamou a atenção da Justiça, além de uma série de outros problemas, que parte considerável desses gastos não pudesse ser comprovada com a análise da contabilidade da campanha. O caso está em fase de recursos.

Memória

Denúncia em fevereiro

Em 28 de fevereiro, três dias após a publicação das denúncias no Correio, o Ministério Público emitiu parecer questionando os métodos do partido e pedindo apuração rápida do caso à Justiça Eleitoral. O MP fez o posicionamento no processo de prestação de contas de Gilberto Camargos, um dos candidatos ouvidos pela reportagem. Ele recusou-se a assinar a prestação de contas produzida pelo Pros. Às pressas, elaborou uma declaração em que justifica o atraso e detalha a suposta tentativa de fraude cometida pelo partido. Com base na reportagem do jornal e na justificativa de Camargos, o MP, em petição assinada pelo procurador eleitoral José Jairo Gomes, requereu, à época, ao Tribunal Regional Eleitoral a oitiva do candidato para esclarecimentos. No mesmo período, o órgão solicitou audiência com Marizete Pereira, cujo processo é base para a operação da Polícia Federal.

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