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Com caixa no vermelho, GDF corre risco de enfrentar mais perdas

Após duas derrotas na Corte de contas, o governo local, que já está com o caixa no vermelho, corre o risco de enfrentar mais perdas: outros dois processos relacionados tramitam no tribunal. O Executivo do DF busca agora alternativas

O Tribunal de Contas da União (TCU) impôs ao Palácio do Buriti, nos últimos seis meses, duas derrotas e, consequentemente, prejuízos bilionários por supostas irregularidades no uso de recursos do Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF), abastecido pela União e usado para manter as forças de segurança (leia O que diz a Lei). As perdas, no entanto, podem ser apenas o início das dores de cabeça do Executivo local. Na Corte, tramitam pelo menos mais dois processos relativos ao cofre que podem resultar em uma dívida de R$ 6,5 bilhões para a capital. O valor equivale a 15,47% do orçamento brasiliense previsto para 2019, de R$ 42 bilhões.

Com as contas no vermelho e a possibilidade de mais cortes, o Buriti apertou os cintos. A concessão de reajustes ao funcionalismo, por exemplo, está fora de pauta. ;São processos antigos. Diante da insegurança quanto ao FCDF, que corresponde a R$ 14 bilhões do orçamento, qualquer ação de aumento na folha de pessoal fica inviabilizada, assim como novas políticas de investimento e custeio em diversas áreas, a exemplo de educação, transporte e assistência social;, explicou o secretário de Economia, André Clemente. O titular da pasta acrescentou que o GDF dialoga com deputados federais e senadores do DF para buscar soluções para os questionamentos.

;Se pudermos dar mais clareza à lei que trata desse caixa, vamos provocar essa alteração;, adiantou. ;Em relação às duas primeiras derrotas, tentaremos revertê-las no Supremo Tribunal Federal (STF). Acreditamos que, em uma Corte imparcial, teremos sucesso. É o STF quem tem competência para solucionar os conflitos sobre interesses dos governos local e federal;, complementou. O procedimento em trâmite que pode causar maior impacto orçamentário aos caixas brasilienses trata do recolhimento das contribuições previdenciárias de servidores das polícias Civil e Militar, além do Corpo de Bombeiros.

Procedimento parado

O TCU analisa se o Distrito Federal precisa devolver ao Fundo Constitucional cerca de R$ 5,56 bilhões, arrecadados entre 2003, ano da criação do cofre, e 2015. A discussão começou depois que o então Ministério da Fazenda e a Advocacia-Geral da União (AGU) recorreram contra o acórdão que impediu o órgão ministerial de reter os valores mês a mês. Àquela época, a Corte entendeu que o montante não deveria retornar aos cofres do governo federal, nem ficar à disposição do DF.

A solução encontrada foi colocá-lo no Fundo Constitucional, vinculado ao pagamento das aposentadorias e pensões. Um grupo de trabalho, formado por órgãos federais e locais, ficou responsável por apresentar uma proposta e estudos, informando valores históricos, fundamentação dos acréscimos legais e valores corrigidos relativos às contribuições previdenciárias. Sob relatoria do ministro Aroldo Cedraz, está parado desde novembro de 2018 o procedimento relativo ao possível ressarcimento por parte do GDF da verba recolhida por 12 anos.


Auxílio-moradia

Outro processo estuda se o Fundo Constitucional deveria custear o reajuste do auxílio-moradia de policiais militares e bombeiros concedido em 2014, na gestão de Agnelo Queiroz (PT). O decreto n; 35.181/2014 estabeleceu os novos valores, com aumentos progressivos, até 2016. O benefício de um coronel com dependente, por exemplo, passou de
R$ 143,91, em agosto de 2014, para R$ 3,6 mil em setembro de 2016.

Em parecer, o Ministério Público junto ao TCU manifestou-se pela suspensão do pagamento da diferença entre o benefício previsto na Lei n; 10.486/2002 e o decreto de Agnelo, e recomendou a abertura de uma tomada de contas especial para a quantificação dos prejuízos do FCDF. À época, verificou-se um aumento de 317% nos gastos do GDF com auxílio-moradia entre 2013 e 2014 ; a cifra subiu de R$ 13,88 milhões para
R$ 57,87 milhões.

Após três anos, a conta chegou a R$ 459,11 milhões. Ou seja, entre 2014 e 2017, o acumulado atingiu R$ 948 milhões. O TCU estuda, agora, se esse montante deve ser ressarcido ao cofre mantido pela União. Sob relatoria do ministro Aroldo Cedraz, o processo chegou a ser incluído nas pautas de 27 de novembro e 4 de dezembro de 2018, mas, logo depois, foi retirado.

Cabo de guerra

Dois acórdãos do TCU deste ano deixaram as contas da capital no vermelho. Em março, a Corte de contas reconheceu que o Imposto de Renda incidente sobre o salário de servidores da Polícia Civil, da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros pertence aos cofres federais e, não aos distritais. A decisão implica em perda de R$ 680 milhões anuais na arrecadação do DF e em dívida de R$ 10 bilhões com a União, referente ao passivo acumulado. Para reverter o acórdão, a Procuradoria-Geral do DF recorreu ao STF. Em abril, o ministro Marco Aurélio de Mello atendeu o pedido do GDF e suspendeu, liminarmente, a determinação do TCU.

O tema, entretanto, ainda precisa ser analisado em plenário. No último dia 15, a Corte de contas impediu que o Buriti use recursos do Fundo Constitucional para pagar aposentadorias e pensões de novos inativos da saúde e da educação. Publicado na terça-feira, o acórdão prevê prazo de 180 dias para que o GDF apresente plano de ação para resolver a situação. A Procuradoria-Geral do DF aguarda o recebimento da notificação para acionar o STF. Devido às sequenciais derrotas, o governador Ibaneis Rocha (MDB) fez duras críticas aos ministros.

;Eles (ministros do TCU) têm de tomar vergonha na cara e parar de atrapalhar. Gastam bilhões por mês e não servem para merda nenhuma;, declarou Ibaneis, na data da última decisão. Com os acórdãos, o governo cortou gastos e descartou novas despesas. Decidiu-se, por exemplo, deixar de reduzir o interstício para a promoção de policiais militares e bombeiros ; tempo que o profissional deve cumprir na função antes de alçar um cargo mais alto.


Evolução de gastos


O Palácio do Buriti utiliza os recursos do Fundo Constitucional para investimentos, custeios e quitação de folhas de pagamento da segurança, saúde e educação. Confira os usos nos últimos anos

2017
Pessoal e encargos sociais
R$ 11.565.236.307,35
Outras despesas correntes
R$ 1.306.431.340,45
Investimentos
R$ 67.796.530,50
Total: R$ 12.939.464.178,30

2018
Pessoal e encargos sociais
R$ 12.216.101.810,52
Outras despesas correntes
R$ 1.501.171.945,57
Investimentos
R$ 94.724.130,70
Total: R$ 13.811.997.886,79

2019
Pessoal e encargos sociais
R$ 7.671.669.538,99
Outras despesas correntes
R$ 906.922.857,37
Investimentos
R$ 42.696.931,92
Total: R$ 8.621.359.328,28

Fonte: Portal Siga Brasil ; Senado Federal

Falhas encontradas

Ao longo dos últimos anos, o Tribunal de Contas da União apontou diversos usos irregulares do Fundo Constitucional que resultaram em impactos orçamentários para o Distrito Federal.

; Gratificações: em processo de 2002, a Corte de contas proibiu o uso de recursos do Fundo Constitucional para o pagamento de gratificações salariais criadas pelo GDF para servidores da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros. O acórdão obrigou o Buriti a ressarcir o caixa pelos repasses.

; Despesas: em 2010, o TCU instaurou uma Tomada de Contas para investigar o uso de dinheiro do Fundo Constitucional para a quitação de despesas da Secretaria de Segurança Pública e da Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso do DF (Funap) entre 2004 e 2007. A decisão inicial estabeleceu a devolução de R$ 300 milhões ao cofre. Entretanto, depois, a Corte estabeleceu que ;o desvio de objeto em benefício da comunidade afasta a ocorrência de débito;.

; Superavit financeiro: em 2018, o GDF requereu que os recursos orçamentários do Fundo não empenhados em um ano fossem transferidos ao próprio cofre no exercício seguinte, por meio de créditos orçamentários. O TCU negou o pedido.

O que diz a lei

A Lei n; 10.633, de 27 de dezembro de 2002, instituiu o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF), ;com a finalidade de prover os recursos necessários à organização e à manutenção da Polícia Civil, da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar do DF, bem como assistência financeira para execução de serviços públicos de saúde e educação;. Conforme a legislação, em janeiro de 2003, os recursos correspondentes passaram a ser entregues ao GDF até o dia 5 de cada mês.