postado em 28/08/2019 04:07
A precariedade do sistema de transporte público do Distrito Federal se arrasta por décadas. Diante de um serviço falho, que não corresponde às expectativas da população, muitos brasilienses que dependem dele recorrem a outras saídas ; por vezes, mais arriscadas ; como forma de ter o direito constitucional à liberdade de locomoção garantido.
O assassinato de duas mulheres ; Letícia Sousa Curado de Melo, 26 anos, na sexta-feira, e de Genir Pereira Sousa, 47, em 2 de junho ; trouxe luz a essa situação. As duas foram mortas após confiarem que Marinésio dos Santos Olinto, 41, seria um motorista de transporte pirata. Na segunda-feira, o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), comentou a morte de Letícia Curado: ;Gente, utilizar ônibus, carro pirata dá nisso. E, certamente, a população toda chora quando vê uma jovem como aquela (Letícia) morta de uma forma tão brutal;.
Para a pesquisadora em mobilidade urbana Adriana Modesto, o cenário reflete os problemas da falta de um serviço de mobilidade de qualidade. ;Se o sistema não é suficientemente regulado, de modo que eu saiba a hora que o ônibus vai passar, fico à mercê e mais vulnerável também. Se há falhas, acabo optando por aquilo que não é o mais adequado;, analisa a doutoranda em transportes pela Universidade de Brasília (UnB).
No ano passado, além da tarifa paga pelos usuários, o governo do DF repassou R$ 650 milhões às empresas de ônibus, de acordo com levantamento do Ministério Público (MPDFT). A quantia subiu 200% quando comparado a 2014. Nos últimos cinco anos, a soma desses repasses alcançou mais de R$ 2,5 bilhões.
Obrigações
Presidente da Comissão de Transporte Aquaviário, Ferroviário e Mobilidade Urbana da Ordem dos Advogados do Brasil no DF (OAB-DF), Samuel Barbosa dos Santos lembra que a locomoção é um direito constitucional e humano fundamental e que uma alteração no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê penas mais graves para quem promove transporte irregular.
O advogado reforça que a medida obriga o governo a fiscalizar com mais intensidade esse sistema e propiciar transporte de qualidade, serviço ;essencial para a convivência em sociedade;. ;O transporte está inserido no mesmo patamar da saúde, habitação, educação. Isso atrai para o poder público a obrigação de propiciar esse serviço. Não é apenas uma previsão legal, mas de direitos humanos. Há uma obrigação de fazer. Ao não fazer, o Estado deixa as pessoas sem garantias mínimas;, destaca Samuel.
A Secretaria de Mobilidade e Transportes (Semob) informou que, ontem, não tinha ninguém habilitado para falar com a reportagem sobre o tema. Por meio de nota, a pasta afirmou que a frota do DF passa por processo de renovação e que mais de 230 novos ônibus foram entregues.