postado em 11/09/2019 04:07
"As equipes são mínimas, não dão conta de atender toda a demanda"
Karina Figueiredo, membro da coordenação do Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes
Karina Figueiredo, membro da coordenação do Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes
O combate à violência contra crianças e adolescentes tem de envolver sociedade e Estado. O problema complexo, causado por múltiplos fatores, demanda trabalho conjunto de órgãos e instituições voltados para o bem-estar desse público. Quando esses atores falham, deixam meninos e meninas sujeitos aos mais diversos tipos de violações, excluídos de seus direitos. A reportagem de hoje da série Infância, um grito de socorro aborda os problemas na rede de proteção.
No DF, serviços públicos que deveriam contemplar crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade estão precarizados, aumentando o drama de quem deveria ser tratado com prioridade absoluta, conforme determina a Constituição. É o que apontam especialistas na área.
De acordo com eles, um dos gargalos no atendimento ocorre na Saúde, no Programa de Pesquisa, Assistência e Vigilância à Violência (PAV). Karina Figueiredo, membro da coordenação do Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, diz que o atendimento existe, mas é frágil. ;As equipes são mínimas, não dão conta de atender toda a demanda.; A declaração dela é corroborada por Fabiana Oliveira, conselheira tutelar no Paranoá. ;Uma criança que precisa, vai ser atendida, mas espera por meses, porque não existem profissionais em número suficiente;, afirma.
Fernanda Falcomer, chefe do Núcleo de Estudos, Prevenção e Atenção à Violência (Nepav), da Secretaria de Saúde, admite que há necessidade de mais recursos humanos. ;A nossa rede está funcionando com o mínimo do mínimo;, destaca. ;A violência demanda psicólogos, assistentes sociais, equipe de saúde. Mas não é uma política só de saúde. Eu preciso que funcionem também conselhos tutelares, delegacias, Ministério Público, tudo alinhado.;
;É guerra;
De acordo com Fernanda, as políticas de assistência social têm um peso considerável no combate às violações. ;Por exemplo, você vai mandar uma criança para o psicólogo da Saúde. A gente vai cuidar de que sofrimento primeiro? O da violência? O da fome? O do agressor, que está ali fazendo pressão e diz que voltará a dar comida e dinheiro se a denúncia for retirada? É guerra. A gente precisa de todas as políticas funcionando;, explica.
Famílias desestruturadas também têm de ser tratadas, para beneficiar, inclusive, as próprias crianças. Integrantes do núcleo familiar com dependência de álcool ou outras drogas, distúrbios mentais ou traumas de violações sofridas na infância tendem a deflagrar a violência doméstica. Mas os serviços de amparo às famílias, como os Centros de Referência Especializada de Assistência Social (Creas) e os Centros de Referência de Assistência Social (Cras) estão sucateados. ;Na Ceilândia, onde eu trabalho, o Creas tem duas pessoas na equipe para fazer atendimento. Há Cras com uma, duas pessoas. A gente não está tendo investimento;, diz.
Precariedade
O conselheiro tutelar da Estrutural Clóvis Souza afirma que o Cras da cidade não funciona. ;O Estado é o pior violador dos direitos de meninos e meninas;, frisa. Simone Machado, conselheira em Taguatinga, também reclama da falta de assistência: ;Levam-se até 40 dias para receber uma cesta básica emergencial;. Já Fabiana Oliveira critica a padronização dos recursos destinado às unidades. ;O limite de crédito de celular, por exemplo, é o mesmo que no Cruzeiro, no Lago Sul. A realidade de uma RA (região administrativa) não é a mesma de outra.;
Serviço imprescindível de proteção, alguns conselhos tutelares carecem de melhores espaços físicos. ;Os conselhos foram um avanço, eles são a porta de entrada de combate à violação, mas a estrutura de trabalho é precarizada;, constata Leslie Marques de Carvalho, promotora de Justiça do Ministério Público do DF e Territórios.
Denuncie
As violências contra crianças podem ser denunciadas nos conselhos tutelares, cujos endereços e telefones estão no site http://conselhotutelar.sejus.df.gov.br/wp-conteudo//uploads/2019/07/CONSELHOS-TUTELARES.pdf. Também é possível fazê-las em qualquer delegacia ou por meio do Disque 100 (o usuário disca para o número 100, seleciona a opção desejada e é encaminhado para um atendente); do aplicativo Proteja Brasil (o usuário vai à loja de aplicativos do seu celular e faz o download, gratuitamente, disponível para iOs e Android); e da Ouvidoria on-line (preenche um formulário disponível em www.humanizaredes.gov.br/ouvidoria-online/). O anonimato é garantido.
Eleição de conselheiros
Em outubro, a população do DF tem um compromisso importante na defesa dos direitos de crianças e adolescentes. No dia 6, será realizada a votação para escolha de 200 conselheiros tutelares e 400 suplentes para um mandato de 2020 a 2023. Cada cidadão poderá votar em um candidato da região administrativa correspondente à seção em que o Título de Eleitor esteja registrado. Mais informações no site: conselhotutelar.sejus.df.gov.br