Mariana Machado, Alan Rios, Walder Galvão
postado em 01/10/2019 07:00
À medida que o julgamento de Adriana Villela entra na reta final, defesa e acusação correm contra o tempo para convencer os jurados. A arquiteta é acusada de ter ordenado o assassinato dos pais, o ex-ministro do TSE José Guilherme Villela e a advogada Maria Villela, além da empregada da família, Francisca Nascimento Silva. Os três foram mortos a facadas em 28 de agosto de 2009. Três pessoas já estão condenadas: Leonardo Campos Alves, Paulo Cardoso Santana e Francisco Mairlon Aguiar.Esperava-se que Adriana fosse interrogada ontem, mas, a pedido da promotoria, que buscava esclarecer e ressaltar os testemunhos dos acusados, o oitavo dia de julgamento teve exibição de vídeos dos condenados, depoimentos e entrevistas. Todos são peças do processo que reúne mais de 20 mil páginas, em 75 capítulos.
Para a defesa, não havia necessidade deste momento, pois os advogados consideraram que ;as provas estão maduras;. A etapa contou com leitura de depoimentos de cinco pessoas, divulgação de áudios e exibições de cinco vídeos, entre oitivas e reconstituições do crime.
O momento que mais marcou a manhã do julgamento foi o vídeo da oitiva de Leonardo Alves, ex-porteiro do prédio onde morava o casal Villela, à Coordenação de Crimes Contra a Vida (Corvida). A prova foi exibida pelo Ministério Público para confrontar pontos debatidos pela defesa.
Advogados da ré chegaram a dizer, na semana passada, que a delegacia especializada cometia torturas psicológicas para colher depoimentos que incriminavam a arquiteta. No vídeo, o MP quis demonstrar que Leonardo não estava sob pressão para responder às perguntas, e que ele deixou claro que o triplo assassinato aconteceu a mando de Adriana.
Em outro vídeo, o ex-porteiro leva os policiais civis a locais relacionados ao crime, como a Praça das Fontes, no Setor de Diversões Norte, em frente ao Conjunto Nacional. Lá, ele afirmou ter se encontrado com Adriana Villela duas vezes: em 3 e 14 de agosto. Nas conversas, eles teriam acertado o valor pago pelos homicídios: US$ 27 mil e joias. Nas imagens gravadas pelos agentes da Corvida, Leonardo se emociona: ;Eu não vou poder ver o crescimento dos meus filhos, não vou mais poder conviver com os meus irmãos. Agora, pelo menos, não tenho mais nada;, disse aos policiais.
Para o advogado da acusada, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, o MP recorreu aos depoimentos em um ato de desespero. ;Nós queremos ir para o debate. É muito raro a defesa conseguir fazer prova negativa, mas nós conseguimos. Não só temos certeza de que ela é inocente, como temos a prova;, afirmou. ;A Adriana é sincera, inteligente e sofreu muito. Ela morreu duas vezes: quando mataram os pais e quando foi acusada. Ela tem muito a dizer.; Ontem, o MP não quis se pronunciar.
Tortura psicológica
Para reforçar o argumento de que os assassinos só teriam nomeado Adriana como mandante após tortura e pressão psicológica, a defesa mostrou vídeos dos depoimentos deles à delegada Mabel Alves de Faria Corrêa, que liderava as investigações da Corvida. No interrogatório de Leonardo, ela insistentemente pergunta sobre uma mulher dentro do apartamento durante o crime.
Também foi exibido o depoimento do delegado Fabrício Falcão, que, a pedido de Mabel, falou com Paulo Cardoso Santana quando ele estava encarcerado na prisão mineira. Segundo ele, a solicitação era para que o suspeito confessasse o crime de mando. ;Mas ele falou que não houve mandante;, declarou.
Hoje, tem início o interrogatório da ré a partir das 9h. Não há previsão para o término. Após Adriana ser ouvida, defesa e acusação iniciam o debate e, logo em seguida, os jurados decidirão o veredito. É possível que o resultado do julgamento, que já acumula 85 horas, e é o mais longo da história do DF, seja dado durante a madrugada.
As palavras do irmão
Além de Adriana, o casal Villela teve um filho, o advogado Augusto Villela. Desde o início, ele acompanha diariamente o julgamento. Ontem, pela primeira vez, decidiu conversar com a imprensa. ;Essa tese de crime de mando é fajuta e foi criada por conta da incompetência da polícia em descobrir os verdadeiros assassinos;, criticou.
Para ele, o triplo assassinato se trata de um latrocínio, roubo seguido de morte. Augusto define as investigações contra Adriana como um chute dos investigadores para tentar solucionar o crime. ;Não há nada nesse processo, de todos os testemunhos, laudos e análises, para que a tese de latrocínio não seja aceita;, afirmou.
De acordo com Augusto, as investidas ;ruins; da Polícia Civil contra Adriana implicaram graves prejuízos à imagem, reputação e dignidade da família Villela. ;Agora, eles não admitem voltar atrás porque sabem que seriam penalizados pelos erros;, opinou sobre a Corvida. Logo depois do crime, ele chegou a mudar de endereço após se sentir perseguido pela Polícia Civil e pela imprensa.
A situação foi citada durante a apresentação das peças por parte da defesa. Os advogados mostraram trechos de um depoimento de Augusto à Polícia Civil em 2010. À época, investigadores cumpriram mandado de busca e apreensão na residência dele. O relato trata, também, da relação da ré com os pais e diz que ele nunca suspeitaria do envolvimento de qualquer parente na tragédia.
Aos policiais, Augusto contou que a irmã nunca brigou com os pais por dinheiro. ;Adriana e a mãe se amavam, mas tinham personalidades parecidas. Por isso, eram incompatíveis;, disse em um trecho do depoimento. O advogado disse que a ré tinha conflitos com Maria Villela, mas reforçou que não era algo fora do que acontece ;normalmente em um âmbito familiar;.
Personagens do júri
Veja quem são os nomes envolvidos no julgamento de Adriana Villela
Ré
Adriana Villela
- Filha do ex-ministro do TSE José Guilherme Villela e da Advogada Maria Villela, ela é acusada de mandar assassinar os pais, além da empregada da família, Francisca Nascimento Silva. Adriana tem 55 anos, é formada em jornalismo, arquitetura, e mestre em desenvolvimento sustentável. Tem um irmão, Augusto Villela, e uma filha, Carolina Villela. Atualmente, mora no Rio de Janeiro, onde desenvolve projetos de fotografia, animação e publicação.
Defesa
Antônio Carlos de Almeida Castro
- Conhecido como Kakay, tem 62 anos e é um dos juristas mais requisitados do país. Afirma que por amizade a José Guilherme Villela, e a pedido de outros ministros, optou por defender Adriana sem custos. Ao longo da carreira, já advogou para quase 30 ministros de Estado e cerca de 20 políticos investigados na Operação Lava-Jato. Também foi contratado como advogado de alguns ex-presidentes: José Sarney, Itamar Franco e Lula. A defesa conta ainda com o advogado Marcelo Turbay, 38 anos, graduado em direito pela Universidade de Brasília (UnB) e pós-graduado em direito penal econômico europeu e internacional pela Universidade de Coimbra, em Portugal.
Acusação
Maurício Miranda
- O procurador atua há mais de 30 anos em tribunais do Júri e é conhecido pela postura rígida. Esteve à frente de casos envolvendo a Máfia das Próteses, em Brasília. Em 2018, concorreu para a lista tríplice a procurador-geral de Justiça do DF, mas recebeu apenas 70 dos 946 votos. Em 2001, assumiu, de última hora, o caso dos jovens que atearam fogo ao índio Galdino. A acusação tem ainda os promotores Marcelo Leite Borges e Janaína Cristina Queiroz de Almeida, além de dois assistentes.
Juiz
Paulo Rogério Santos Giordano
- Titular da Vara do Tribunal do Júri de Brasília desde 2013, Giordano divide a magistratura com a Academia. Por 12 anos, foi professor do Centro Universitário de Brasília (UniCeub), e, hoje, leciona na Escola da Magistratura. No currículo, leva uma década como juiz da Vara de Entorpecentes e, no júri, atuou em casos emblemáticos, como o julgamento de Nenê Constantino e o feminicídio que vitimou a estudante Louise Ribeiro dentro do câmpus Darcy Ribeiro, da Universidade de Brasília (UnB).
Vítimas
- Em 28 de agosto de 2009, foram assassinados o ex-ministro do TSE José Guilherme Villela, 73 anos, a advogada Maria Carvalho Mendes Villela, 69 anos, e a empregada doméstica Francisca Nascimento Silva, 58 anos, que trabalhou com a família por três décadas. Segundo a perícia, eles receberam mais de 70 facadas. O crime aconteceu na residência do casal, um apartamento no Bloco C da 113 Sul. José Guilherme ficou conhecido após defender Fernando Collor durante o processo de impeachment do ex-presidente. Na época, ele fez a leitura da carta de renúncia durante a sessão do Senado que julgou o pedido de perda de mandato, em 29 de dezembro de 1992. Outro cliente famoso de Villela foi o ex-governador Paulo Maluf.