Mariana Machado
postado em 12/10/2019 07:00
Aprender a cair é a primeira etapa antes de andar. Quando criança, os passos incertos derrubam meninos e meninas até que a caminhada ganhe firmeza. Contudo, com o passar dos anos e a chegada da velhice, uma simples queda toma proporções que podem levar a fatalidades. Pesquisa da professora Juliana Nunes, da Faculdade de Educação Física da Universidade de Brasília (UnB), mostra que, três meses após fratura causada por queda, o índice de mortalidade de idosos chega a 20%.
As quedas são a principal causa de internações de idosos por acidentes no sistema público de saúde. Entre as pessoas acima de 60 anos, 30% sofrem pelo menos uma queda por ano. Além disso, à medida que as décadas avançam, o percentual aumenta. Metade dos idosos acima de 80 anos caem uma vez por ano, como afirma a especialista.
Buscando promover o equilíbrio na terceira idade, ela começou, em 2008, para o mestrado, a desenvolver um circuito de exercícios para prevenir quedas. Em 2017, a professora Juliana fechou parceria com o Sesc, criando o projeto multidisciplinar Prev-Quedas, em Taguatinga. ;Foi elaborado um cadastro com informações sobre saúde funcional, qualidade de vida, assim como os relatos de acidentes;, recorda. Antes de iniciar a parceria, 160 idosos foram avaliados, dos quais 20% tinham histórico de queda.
A partir daí, nasceu a primeira turma, com 28 alunos participando do circuito de 13 estações montado em uma quadra colorida do Sesc. A experiência mudou a vida deles, como conta a aposentada Maria das Mercedes de Santana, 67 anos. Em 2013, ela escorregou no banheiro de casa e rachou o crânio. ;Foram 11 pontos por fora e não sei quantos por dentro;, descreve. ;Eu nem sei como aconteceu. Quando acordei, estava no hospital.;
A mulher foi socorrida pelo marido e pela filha, que ouviram um barulho e os gemidos de dor dela. ;Meu esposo precisou arrombar a porta. Eu estava caída no chão e havia muito sangue escorrendo por baixo da porta.; Depois disso, Mercedes passou a ter medo de cair e levou seis meses até que ficasse completamente recuperada. Diagnosticada com artrose e osteoporose, para ela, outra queda como aquela poderia ser muito pior. Em 2018, no entanto, soube do Prev-Quedas e decidiu participar. ;Aquilo me fortaleceu muito. Indiquei para muita gente e, se Deus quiser, vou participar de novo.;
Adeus, bengala
Depois de três anos dependendo de uma bengala para se locomover, o objeto agora serve apenas como recordação para a aposentada Carmosina Francisca da Silva, 76. Sofrendo de dores causadas pela artrose, ela não tem mais cartilagem no joelho; por isso, não conseguia andar. Depois de participar do Prev-Quedas, no entanto, ganhou confiança e equilíbrio. ;Libertei-me da bengala. Hoje em dia, ando e sou muito feliz. Faço pilates, ginástica e adoro cantar;, celebra.
Cada turma demanda três meses, tem até 30 alunos, e as aulas de uma hora de duração ocorrem duas vezes por semana. Os exercícios incluem equilibrar-se em uma perna só, esticar-se para alcançar objetos em locais altos e arremessar bolas em caixas. Além disso, eles participam de rodas de conversa com orientações de segurança, como explica Adriana Costa, coordenadora de Assistência do Sesc/DF. ;Ficou comprovado que o circuito melhora a qualidade de vida da pessoa idosa em 8%. Parece pouco, mas, para quem andava de bengala, quem tinha dificuldade na marcha, é muito.; Nos próximos meses, o projeto será também implementado na unidade do Gama.
Sem medo
A Secretaria de Saúde também adotou o método nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). Lá, o foco é trabalhar coordenação motora, força muscular, equilíbrio e cognição, como explica Ângela Maria Sacramento, terapeuta ocupacional e técnica da área de Saúde do Idoso. ;A queda não é questão só de capacidade física; ela é multissensorial. Se você tiver visão, audição e cognição ruins, memória curta ou com declínio, também pode ter risco maior de cair;, alerta.
As aulas ocorrem duas vezes por semana, na Asa Sul, em Ceilândia, no Núcleo Bandeirante e em Brazlândia ; Asa Norte, Sobradinho, Vila Planalto e Guará oferecerão o serviço em breve. Segundo Ângela, as turmas incentivam a socialização dos participantes. ;Para o idoso, pertencer a um grupo ou estar em atividades sociais é uma forma de se proteger contra declínios cognitivos e até desenvolvimento da demência;, explica.
Aos 83 anos, Aureliana de Carvalho recuperou a força para andar sem ajuda depois dos dois meses de atividades na UBS de Ceilândia. ;Foi maravilhoso participar, ajudou demais. Eu andava caindo muito. Caí em fevereiro, fiz fisioterapia, acupuntura, tudo;, relata. Aureliana havia pisado em um buraco no quintal de casa e acertou o rosto no chão. ;Machuquei o nariz, bati com a testa e sangrou muito. O joelho ficou muito inchado.;
Depois do acidente, a idosa precisou andar de bengala ou sempre de braços dados com alguém. ;A minha filha comprou até andador. Eu mancava muito. Foi quando me chamaram para os exercícios no posto, e eu adorei;, revela, A família ainda fica de olho em Aureliana, mas, para ela, o pior já passou. ;Tem dias que o joelho dói, mas claro, já são 83 anos. Posso dizer que estou bem, Graças a Deus;, ri.
Atenção
Saiba onde procurar os circuitos de equilíbrio para idosos:
Circuito Multifuncional de Prevenção de Quedas das UBS
Ceilândia
UBS n; 6
EQNP 10/14
Módulo
E, F, G e H
UBS n; 10
QNN 12 ÁREA ESPECIAL 01
Asa Sul
UBS n; 1
SGAS 612, lotes 38/39
Núcleo Bandeirante
UBS n; 2
Rua 2, Setor dos Engenheiros, AE Metropolitana
Brazlândia
UBS n; 1
EQ 6/8, Setor Norte, Área Especial 3
Prev-Quedas
Sesc de Taguatinga Sul
Setor F Sul, AE 3
Três perguntas para Luís Rangel, geriatra do Hospital Brasília
Por que quedas são tão perigosas para os idosos?
Porque causam tanto a morte como a incapacidade física. Os pacientes podem fraturar o fêmur ou outro membro importante, e eles, frequentemente, podem ter também hematomas intracranianos. Tudo isso leva à incapacidade funcional que prejudica a qualidade de vida desses pacientes. Com o avançar da idade, aumenta a chance de osteoporose, que é a fraqueza dos ossos. Embora ocorra em homens, é muito mais frequente em mulheres, e está relacionada à queda de hormônios na menopausa.
A partir de que idade é preciso ter mais atenção aos riscos de quedas?
Todo idoso deve se preocupar. Uma grande consequência são as fraturas, e o principal fator para facilitar a ocorrência delas é a osteoporose. Existem outras questões também. A atrofia natural do cérebro com a idade. Ele fica mais solto dentro da calota craniana. Quando você cai, existe maior movimentação do cérebro dentro da cabeça, e isso favorece que uma veia lá dentro se rompa.
Como se prevenir?
A principal medida é a atividade física. Pensando especificamente na osteoporose, uma maior ingestão de cálcio. É possível fazer o diagnóstico precoce. Em mulheres, a gente começa a indicar depois da menopausa, mas, se o paciente tem fator de risco, pode ser antes. No homem, também está indicado fazer exame de rastreio depois dos 65 anos (densitometria óssea).