Cidades

Reverência à literatura

Autores lançam livro inspirado na trajetória de projeto voluntário de leitura para crianças. Tapete vermelho conta a história desse símbolo de respeito e mostra que ele pode celebrar bem mais que a passagem de reis e rainhas

postado em 26/10/2019 04:08
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Estender um tapete vermelho representa mais que uma reverência. É sinal de respeito. Como rei ou rainha, quem pisa nos fios tingidos pelo pigmento vivo pode sentir a potência do gesto. Ao longo de 13 anos, foi isso o que o projeto Roedores de Livros fez, ao acolher e transportar crianças e adolescentes a um mundo que se desvela sobre o tapete mágico. A trajetória desse trabalho voluntário virou também livro, que será lançado hoje.

O projeto se abriga atualmente num canto cheio de aconchego no Shopping Popular de Ceilândia. A ideia é levar a literatura aos roedores ; como são chamados os leitores que frequentam o espaço ; desde cedo. O contato se dá por meio da mediação de leitura, e os que gostam podem emprestar as obras apresentadas ou escolher qualquer outra do acervo de mais 5,3 mil títulos da ;bibliotoca;.

Sobre o tapete, descalços, todos se igualam e se abrem para ouvir atentamente as histórias e embarcar juntos em cada fantasia. É um pouco desse poder simbólico que Ana Paula Bernardes e Tino Freitas (leia Os autores) contam em Tapete vermelho. Com ilustrações de Sandra Jávera, o livro faz um passeio pelo pigmento, antes caro e difícil de ser obtido. Apenas os donos das maiores riquezas tinham túnicas rubras, que dirá, um tapete.

É dessa forma que os Roedores de Livros recebem as maiores riquezas do mundo: as crianças. Debruçadas nas almofadas sobre o vermelho vibrante, elas escutam as histórias mais variadas da literatura infantojuvenil. De quarta-feira a sábado, o espaço educativo atrás das lojas dos feirantes recebe o público ávido pelas aventuras de personagens coloridos.

Ao longo da última década, Ana e Tino viram crianças se tornarem adultos e voltarem com saudade. ;A literatura infantil tem uma coisa interessante. Acham que para esse público só existe ;livrinho;, mas hoje eles são trabalhados. São verdadeiras obras de arte;, garante Ana Paula. ;Esse aqui é um espaço de pluralidade e de apresentar o mundo para as crianças. Temos livros sobre indígenas, cultura africana, escritores de Brasília e muito mais.;

Ela conta que o trabalho de mediação fomenta a leitura. ;Não basta ter uma biblioteca ou o acesso ao livro. É preciso ter alguém que possa te mostrar esse caminho para que, lá na frente, você possa caminhar com as próprias pernas, como leitor;, explica a autora. O objetivo agora é alcançar um público mais amplo, em Ceilândia e no restante do Distrito Federal. Escolas interessadas podem agendar um horário para levar os alunos. O tema da leitura normalmente é escolhido pela coordenação do projeto, mas os professores podem fazer sugestões.

O começo

Quem vê as salas recheadas de livros e decoradas com ilustrações de artistas nas paredes não imagina que houve uma época em que o acervo era transportado em caixas de papelão ; uma biblioteca ambulante. A ideia do projeto nasceu, em 2006, da parceria entre Tino e Ana, à época, casados. Ela, professora, ministrava cursos em que falava da importância da literatura, mas ouvia de colegas sobre a dificuldade em colocar aquilo em prática dentro da sala de aula.

Pouco depois, em um evento na 312 Norte, no Açougue Cultural T-Bone, que contou com a presença do escritor Ziraldo, Tino lançou a proposta de trabalhar literatura infantil no espaço. A ideia foi aceita e, por cerca de um semestre, a dupla passou a fazer leitura para crianças todos os sábados. ;Mas era uma coisa de uma vez só. Elas iam e não voltavam mais. A gente queria formar leitores;, lembra Tino.

Surgiu, então, a proposta de levar o trabalho para Ceilândia. Dois anos depois, chega a notícia de que não poderiam mais ocupar a sala na creche em que se reuniam. Para manter o projeto vivo, os dois passaram a contar as histórias em um gramado, mas então, um novo problema: formigas e outros insetos que incomodavam as crianças. Assim o tapete vermelho chegou, abrigando e confortando os jovens leitores.

De lá, o grupo conseguiu a sala no Shopping Popular, em local que estava abandonado. ;Nós revitalizamos, e hoje a cara é outra. Isso também é educação;, afirma o escritor. ;O amor é uma assinatura importante, talvez a mais importante de todas, mas a gente trabalha nisso porque a gente tem teimosia e esperança. Isso que move o Roedores;, resume Tino.




Os autores
  • Ana Paula Bernardes é graduada em artes plásticas pela Universidade de Brasília (UnB) e professora da Secretaria de Educação do DF. Fascinada por literatura, na faculdade se aproximou da vertente infantil. É idealizadora e coordenadora do projeto Roedores de Livros. Atua como educadora na formação de mediadores de leituras e como consultora em programas de promoção do livro e leitura no Brasil.
  • Tino Freitas é jornalista, músico, escritor e contador de histórias, além de mediador de leitura do Roedores de Livros, onde se apaixonou pelo trabalho com crianças. Autor de 24 livros infantis, teve obras premiadas com o Jabuti e o Selo Altamente Recomendável para Crianças, da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ).

Tapete vermelho
De Ana Paula Bernardes e Tino Freitas
Ilustrações: Sandra Jávera. Editora do Brasil
Número de páginas: 32
Preço: R$ 44
Lançamento: hoje, às 17h, com a participação dos autores e mediação de leitura para crianças. Sebinho, 406 Norte, Bloco C, Loja 44



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