Cidades

Polícia vai usar imagens para tentar identificar autor de latrocínio

Bandido mata cadeirante de 57 anos que tentou segurá-lo durante roubo a coletivo na BR-020, em Sobradinho. Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública, a cada 5h25, um coletivo é assaltado no Distrito Federal

Caroline Cintra, Sarah Peres, Thais Umbelino*
postado em 30/10/2019 06:00

[FOTO1]A polícia recorrerá a imagens de câmeras de segurança e a depoimentos de testemunhas para identificar e prender o suspeito de matar a tiro o cadeirante Marcilio Pereira da Silva Neto, 57 anos. A vítima seguia no ônibus da empresa Piracicabana assaltado na BR-020, em Sobradinho, por volta das 10h30 desta terça-feira (29/10). Depois de cometer o latrocínio (roubo com morte), o suspeito fugiu a pé com 11 celulares e R$ 419. ;Os relatos confirmam que Marcilio reagiu à ação. Mas ele tinha dificuldade de fala e era possível notar a condição dele. O assaltante agiu de forma bárbara, demonstrando qualquer desvalor para com a vida da vítima. O interesse único era o roubo. Ele não se importou com o que deveria ser feito para chegar ao objetivo final;, afirmou o delegado Hudson Maldonado, chefe da 13; Delegacia de Polícia (Sobradinho).


O assaltante entrou no coletivo no ponto do Bar do Mocotó, na BR-020, depois de fazer sinal para a parada do veículo. Anunciou o assalto antes de passar pela catraca. Armado, rendeu o motorista, o cobrador e cerca de 70 passageiros da linha 640.2 ; ela sai da Rodoviária de Planaltina e segue para a W3 Norte e Sul. Além de exigir os celulares, o criminoso mandou que todos os passageiros baixassem a cabeça e passassem os aparelhos de mão em mão, até que chegassem a ele.

Depois de dar as instruções, o suspeito caminhou até o meio do coletivo, onde há espaço reservado para pessoas com necessidades especiais. Ali, encontrava-se Marcilio, que segurou o assaltante pelas pernas. Para intimidá-lo, o acusado fez um disparo para o alto. O cadeirante, porém, não o soltou. O bandido, então, atirou no peito da vítima. Segundo testemunhas, mesmo após atingir o passageiro, o suspeito continuou a recolher os telefones. ;Estava no último banco. Gosto de sentar atrás, justamente por ter medo de estar na frente durante um assalto. Quando ele deu o primeiro tiro, no teto do ônibus, todo mundo gritou. Foi a pior situação da minha vida;, contou uma vendedora de 52 anos, que pediu para não ser identificada.

Um adolescente de 16 anos relatou ao Correio a frieza do criminoso. ;A todo momento, ele foi muito covarde, pois agia agressivamente. Ele fazia ameaças de morte constantes;, contou. ;Quando tudo acabou, ele exigiu que o motorista o deixasse na parada de ônibus e que saísse rápido do local. Antes de descer, ele falou que, se isso não ocorresse, atiraria nos passageiros. Apavoradas, as pessoas começaram a gritar;, relembrou o jovem, sob anonimato.

Um coletivo que seguia logo atrás do ônibus da Piracicabana filmou o criminoso fugindo pela BR-020. Ele usava roupa e boné escuros. Nas mãos, levava uma sacola plástica, na qual estavam os celulares e o dinheiro das vítimas. A imagem mostra o homem atravessando a rodovia entre os carros. Pouco depois, o condutor avistou uma equipe da Polícia Militar e deu luz alta, sinalizando que precisava de ajuda. Nessa hora, os passageiros pediram socorro. ;Foi só mais um assalto, como acontece em outros dias. Mas, desta vez, o bandido foi mais violento do que o comum. Para nós (rodoviários), essa situação de violência é corriqueira, infelizmente;, comentou motorista, que não quis se identificar.

Investigação

Testemunhas detalharam à polícia que o suspeito é baixo, magro e branco. Segundo informações da Polícia Civil, a empresa de transporte não entregou a filmagem interna do veículo, alegando problemas técnicos. Ainda no início da tarde desta segunda-feira (29/10), os agentes recuperaram os celulares roubados. Os aparelhos estavam enterrados na Quadra 10 de Sobradinho. Segundo o delegado Hudson, 17 vítimas do roubo prestaram depoimento.

Além das imagens do coletivo, os investigadores procuram testemunhas que possam ter visto o suspeito fugindo pela BR-020. Qualquer informação sobre o homem pode ser repassada anonimamente pelo 197. A reportagem entrou em contato com a assessoria da Piracicabana, que preferiu não comentar o caso.

Marcilio Neto morava em Planaltina de Goiás com a mãe, Maria Carmelita Pereira Nunes, 76, que sofre de mal de Alzheimer. A irmã da vítima, Maria Benedita Pereira Nunes, 47, vive no fundo da casa. Na tarde desta segunda-feira (29/10), os familiares reconheceram o corpo no Instituto de Medicina Legal (IML). Não havia informações sobre o enterro até o fechamento desta edição. ;Ele era uma pessoa boa, mas por causa dos problemas de saúde, tinha a tendência a ficar nervoso. O meu tio era uma pessoa de bom coração, que buscava estar sempre perto de Deus e da família. Eu sei que ele não aceitaria ver uma injustiça e não fazer nada para impedi-la;, disse a copeira Jéssica Pereira Nunes Silva, 29, sobrinha da vítima.

;Ele tinha sido vítima de outros dois roubos em ônibus e, quando reagiu, apanhou. Os bandidos percebiam que o meu tio não tinha condições plenas de responder por aqueles atos;, ressaltou. A jovem destacou que a família insistia para que Marcilio ficasse em casa. ;O meu tio gostava de saber que ainda conseguia seguir com a vida dele e não depender de ninguém. Sei que ele reagiu, só que isso não justifica o ato violento. Nada explica ele ter sido morto daquele modo, dentro de um coletivo;, acrescentou.
Em alta

Dados da Secretaria de Segurança Pública mostram que houve 1.209 roubos em transporte público no Distrito Federal de janeiro e setembro. A média é de um caso a cada 5h25. O dado, no entanto, é menor na comparação com o mesmo período do ano passado, quando houve 1.290 casos. Na quarta-feira da semana passada, um motorista de ônibus sobreviveu a um tiro no rosto, em Sol Nascente. O condutor da Expresso São José manobrava o coletivo quando foi surpreendido por dois assaltantes. Não havia passageiros. Os bandidos fugiram com R$ 70. Um adolescente ajudou a dupla. Agentes da 23; DP (P Sul) prenderam os suspeitos em flagrante.

Em nota oficial, a Polícia Militar destacou que o trabalho de ronda ostensiva é realizado diariamente, em todas as áreas. ;A corporação tem conseguindo reduzir os casos, como indicam os dados da Secretaria. Os números não caem ainda mais, pois grande parte dos criminosos que nós prendemos voltam às ruas em pouco tempo. Isso ocorre por causa das brechas na lei. A PMDF tem feito a sua parte, prendido e trabalhado com afinco a fim de garantir a tranquilidade;, destacou o texto.

A vítima

Marcillio Pereira da Silva Neto
; Tinha 57 anos
; Nasceu em Bom Jesus, no Piauí
; Morava em Planaltina de Goiás
; Vivia com a mãe, de 76 anos, que sofre de mal de Alzheimer
; Era portador de necessidades especiais desde o nascimento

Palavra do especialista

Sensação de insegurança

;Existem duas coisas que são diferentes: os números e a sensação de medo. Não basta ocorrer a queda nos índices de criminalidade se isso não é trabalhado nas comunidades. É fundamental resgatar a sensação de segurança. Podemos citar as regiões de Planaltina, Ceilândia e Sobradinho, que não têm estrutura sólida do governo. Há pessoas nesses locais que precisam estar às 4h em uma parada de ônibus para seguir ao trabalho por causa da baixa qualidade do transporte público. Nisso, se esbarra na falta de iluminação e o pouco policiamento. Esses pontos são armadilhas do próprio Estado, que não fornece à comunidade a proteção necessária. Quando se fala em segurança pública, passa-se a ideia de que o maior cliente é o bandido. Mas não é. O cliente é a comunidade daquela cidade, que precisa ver que é contemplada pelo governo. Assim, pode-se diminuir a onda de medo.;, Leonardo Sant;Anna, especialista em segurança pública e gestão estratégica.

Insegurança

Veja dados relacionados a assaltos com morte no DF:

Crime ; 2018* ; 2019* ; Variação:

Latrocínio ; 19 ; 17 ; -10,5%
Tentativa de latrocínio ; 142 ; 155 ; 9,1%
Roubo a coletivo ; 1.290 ; 1.209 ; -6,2%
* De janeiro a setembro
Fonte: Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSPDF)

*Estagiária sob supervisão de Guilherme Goulart

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