Cidades

O papel da imprensa

Evento discutiu melhores formas de os veículos de comunicação noticiarem casos de agressões e de feminicídio. O empoderamento de mulheres e a ocupação de cargos de destaque também foram tratados no encontro

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 29/11/2019 04:17
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Um dos objetivos do colóquio era discutir as melhores formas de a mídia tratar um tema tão delicado quanto o feminicídio. O debate é importante, em especial, após a declaração do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, que disse acreditar que os casos não deveriam ser noticiados. ;Assim como no caso de suicídio, eu entendo que, no feminicídio, não deveria ter divulgação. Estou estudando ainda e elaborando pesquisas;, afirmou o chefe do Executivo local. Para ele, a disseminação das notícias incentivaria mais crimes.

Durante o evento de ontem, a coordenadora de produção de Cidades do Correio, Adriana Bernardes, relembrou a campanha pelo respeito à faixa de pedestre encabeçada pelo jornal e que foi responsável por uma grande mudança cultural em Brasília. ;É uma prova de que, quando um veículo de comunicação se compromete a transformar uma realidade, consegue;, afirmou.

Adriana expôs matérias sobre violência doméstica publicadas pelo jornal ao longo dos anos. Também lamentou o fato de o problema atingir mulheres de todas as idades, o que foi tema de uma das reportagens da série Elas no Alvo, deste ano. A matéria mostrou que, em 2018, foram registrados 1.048 casos de violência doméstica em que as vítimas tinham menos de 18 anos, o que representa 7% do total. ;Com isso, autoridades policiais e judiciárias têm enquadrado casos de maus-tratos e abusos sexuais contra crianças como ocorrências de Lei Maria da Penha;, informa o texto publicado em agosto deste ano.

A jornalista explicou que o jornal se esforça para cobrir o tema ultrapassando o factual e exemplificou com uma matéria sobre masculinidade tóxica na Revista do Correio, publicação dominical, que mostra como alguns homens estão tentando desconstruir estereótipos. ;Homem não chora. Isso é coisa de mulherzinha. Meninos não usam rosa nem brincam de boneca. Homem não fala sobre sentimentos;, exemplifica a reportagem veiculada em junho. ;Essa é uma questão (noticiar violência contra a mulher) muito inquietante para nós, que estamos do lado de cá produzindo notícia. Nós recorremos a quem trabalha com isso fazendo pesquisa e mergulhando a fundo nesse universo para nos amparar;, disse Adriana.









Espaços de poder
O empoderamento de mulheres também foi mencionado como importante para a quebra da cultura do patriarcado. Na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), apenas quatro cadeiras são ocupadas por deputadas, entre as 24 existentes. No Congresso Nacional, a situação não é muito diferente. Na Câmara dos Deputados, a bancada feminina é composta por 77 parlamentares, isto é, 15% da casa. No Senado, elas são 12, de um total de 81 vagas. Apesar de a lei determinar que partidos políticos reservem 30% das candidaturas para mulheres, a representação é baixa.

Ainda assim, há aquelas que alcançam altos cargos. Durante o colóquio, a senadora Zenaide Maia (Pros), presidente da Comissão Permanente Mista de Combate à Violência Contra a Mulher, reforçou a necessidade de lutar pela representatividade. ;Temos que desafiar e ocupar. Não é competir com os homens, não estamos cobrando privilégios. Estamos cobrando direitos que estão, inclusive, na Constituição (Federal);. Ela afirmou que, até mesmo quando mulheres são eleitas, crenças antiquadas do papel que elas devem ocupar aparecem. ;Acham que a mulher tem o papel de cuidar, então querem que a gente fique apenas em comissões sociais. Não é que não sejam importantes, mas também queremos estar na Comissão de Constituição e Justiça, na de Tributação. Por que não?;

A fala foi reforçada pela diretora-geral do Senado, Ilana Trombka. Ela lembrou que a violência contra a mulher vai além da agressão física e pode ser dividida em psicológica, moral e patrimonial. ;Há uma violência que me preocupa sobremaneira. Não é a patrimonial nem a psicológica, mas a simbólica. É aquela que quer invisibilizar a mulher. Que não quer que ela tenha lugar de fala.;

De acordo com Ilana, a sociedade moderna carrega uma grande herança machista, que precisa ser combatida. O enfrentamento, no entanto, não é fácil. ;Eu não tenho dúvidas de que não sairemos ilesas. Eu tenho certeza de que pagaremos pela nossa ousadia, mas nós não vivemos para o hoje. Vivemos para muito mais do que isso;, concluiu.




"Há uma violência que me preocupa sobremaneira. É aquela que quer invisibilizar a mulher. Que não quer que ela tenha lugar de fala;
Ilana Trombka, diretora-geral do Senado




"A gente precisa combater o preconceito e a discriminação. Isso precisa ser feito com informação correta e qualificada, e não com fake news;
Cleide Lemos, especialista em direitos humanos













Reportagens veiculadas pelo Correio ao longo dos anos




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