Cidades

Referência na luta por igualdade

Delegada-chefe da 6ª Delegacia de Polícia (Paranoá), Jane Klébia usa a experiência de vida para aproximar a população da segurança pública. Ao CB.Poder, a investigadora também chamou a atenção para temas como feminicídio e questões humanitárias

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 03/12/2019 04:18
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; ALAN RIOS

Mulher, negra e de família de baixo poder aquisitivo, Jane Klébia venceu barreiras sociais e se tornou a delegada-chefe da 6; Delegacia de Polícia (Paranoá). Hoje, ela usa o cargo para ir além do caráter punitivo, criando aproximação entre a população e a segurança pública, promovendo conscientizações que eliminem futuros crimes e se tornando uma referência para quem também precisa ultrapassar as desigualdades. Em entrevista ao CB.Poder ; parceria do Correio com a TV Brasília ;, Jane lembrou o começo da carreira, quando precisou concorrer com quem veio de família rica e teve mais oportunidades. A delegada também comentou sobre o trabalho diário de combate à violência contra a mulher, o aumento de agressões contra negras e legislações como o excludente de ilicitude e lei de abuso de autoridade.




Qual é a importância de expandir o trabalho policial para fora das delegacias?
O trabalho de delegacia é muito importante, mas acredito que algumas questões precisam ser levadas para a população. Hoje, as pessoas me observam como referência, e é uma responsabilidade grande representar mulheres, negras e pessoas humildes. É impressionante que, quanto mais próximo eu vou à população, mais as pessoas têm confiança, e isso reflete na segurança pública. Temos pessoas mais simples com autoestima baixa achando que não podem chegar a lugar nenhum. Mas eu passei pelos problemas que a pessoa passou e, ainda assim, cheguei aonde cheguei. Levar isso é importante para dar empoderamento real.

Há poucas delegadas no DF e menos ainda negras. Como a senhora se vê nesse papel?
Hoje, sou mais conhecida das pessoas, mas, no início de carreira, há 22 anos, passei por situações até engraçadas. As pessoas imaginam o delegado como o padrão de homem e branco. Não conseguem imaginar que uma pessoa simples pode chegar a um cargo dessa representação.

No DF, tivemos 32 casos de feminicídio no ano.
Por que
tantos homens matam mulheres?
Temos de acabar com essa história de que existe ;lugar de mulher; e ;lugar de homem;. Parece banal, mas tem importância. Começam as agressões quando a mulher sai do lugar comum de onde o homem imagina que ela deveria estar. Por exemplo, o homem diz que ;mulher minha não usa batom, decote, não conversa com outros;. Qualquer vontade manifesta dela que foge disso, ele reage com violência. Ele pensa que ela é propriedade dele, que pode matar. Dos 32 feminicídios, investiguei cinco. O relato das pessoas é esse, da mulher que quer dar um fim à violência e vê o homem passando a persegui-la e, depois, cometendo feminicídio.

Como evitar a reincidência?
A violência doméstica é complexa, porque envolve filhos, dependência financeira e emocional, medo, vergonha. São vários fatores. A mulher, muitas vezes, ainda quer resgatar o relacionamento. Pensa que o homem pode parar as agressões se tiver uma conversa. De cada 10 ocorrências que vão a juízo, oito mulheres desistem da denúncia. A resolução passa pela conscientização, de entender que mulher tem seu espaço e seu direito. Isso passa pela educação, pela escola.

A ascensão do pensamento conservador dificulta?
Imensamente. Quando se faz essa luta de direita e esquerda, empobrecem as ações sociais. As pessoas acham que questões de empoderamento de grupos minoritários são de esquerda. Não são, são questões humanitárias. Com essas divisões, a sociedade não vai crescer como um todo. Precisamos de políticas afirmativas. Incentivar políticas prioritárias não é de esquerda ou de direita, é de gente, humanidade.

Como a senhora enxerga o excludente de ilicitude?
Não podemos, sob pena de perder a legitimidade, utilizar a lei para referendar situações equivocadas. Se a gente banalizar o instituto, com se tivesse autorização para matar, colocando arma falsa ali em cena de crime, por exemplo, é muito grave. A excludente é um instrumento necessário que vamos precisar em algumas situações, mas não podemos banalizar. A polícia foi feita para guardar o cidadão, a segurança, e não pode se tornar tão criminosa.

A senhora pensa em concorrer nas próximas eleições?
Tive uma primeira experiência em 2018, foi exitosa, porque conheci por dentro o processo. Então, é quase que um caminho natural, mas vou avaliar em 2022. Eu entrei no mundo da política, achei interessante, mas vi muitas dificuldades. Agora, quero usar a minha exposição para convencer a mulher a fazer denúncia de violência doméstica, empoderar as mulheres, os negros e mais atitudes nesse sentido.

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