Cidades

Reservatórios de água estão um pouco acima do nível previsto para janeiro

Abastecimento do Distrito Federal depende não só das chuvas, mas da postura da população em relação à economia. Segundo a Adasa, volume dos reservatórios da capital está pouco acima do previsto para esta época do ano

Com os reservatórios no limite do estimado pelo governo, parte do equilíbrio hídrico do Distrito Federal passa não só pelas chuvas, mas pela consciência da população. Nesta quinta-feira (2/1), a Bacia do Descoberto estava com 67,7% da capacidade útil. Índice próximo ao definido pela Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do DF (Adasa) como o ideal para esta época do ano, de 64%. Essa diferença, a quatro meses do início da seca, liga o alerta à manutenção de hábitos sustentáveis a fim de evitar nova crise hídrica. “A gestão dos recursos hídricos começa na casa de cada um. A água é um problema de todo mundo e é preciso utilizar com parcimônia e responsabilidade”, afirma o diretor da Adasa, Jorge Werneck.


Segundo Werneck, novos parâmetros serão traçados para 2020, baseados em simulações da agência. A previsão é de que essa atualização dos dados seja feita em fevereiro. É levada em conta, por exemplo, a quantidade de chuvas no Distrito Federal no período. No entanto, a população tem responsabilidade direta em relação à oferta de água, pois as precipitações que aumentariam o volume dos reservatórios “são cada vez mais imprevisíveis”, de acordo com o diretor da Adasa.

A importância do uso consciente para o professor Giovanni Guevara, 51 anos, começou no período de racionamento de água e trouxe mudanças na rotina e no comportamento da família. “O corte de água que teve no DF em 2017 fez com que a gente passasse a se preocupar com a reutilização e a economia de água”, conta. “No banheiro que divido com a minha esposa, começamos a aproveitar a água do chuveiro para usar na descarga”, explica o morador do Lago Norte. A captação foi feita por meio de um sistema com quatro reservatórios, de 5 litros cada. “Eles ficam montados no chão, embaixo do chuveiro”, explica.

Nos outros banheiros da residência, a água fica em baldes. “Os dois filhos que moram comigo usam o recipiente para, também, usar nas descargas. Fazemos isso diariamente”, ressalta. Outra atitude dos moradores é na canalização da chuva para a piscina. “Ela tem capacidade para 40 mil litros e só vai esvaziar agora lá para o mês de maio”, prevê Giovanni. Na lavagem de roupas, há economia de recurso. “A água usada na máquina de lavar é armazenada em dois galões de 200 e 250 litros. Depois de jogar cloro, a gente reutiliza o líquido para lavar a garagem, os carros e a área da varanda”, detalha. A mudança de postura afeta as contas. “Antes, o valor girava em torno de R$ 700. Hoje, não passa de R$ 300”, contabiliza Giovanni. “Todo recurso natural é finito. Nós não podemos esperar medidas apenas do governo, temos de fazer a nossa parte.”

Francisco Emílio Marinho, dono do Beirute, na 109 Norte, também toma medidas sustentáveis. Por sugestão de um funcionário, ele investiu em um projeto de reaproveitamento. “Em 2017, compramos várias caixas d’água para a reciclagem da água utilizada nas máquinas de lavar prato e na cozinha”, relembra. “O sistema também filtra e limpa o líquido para uso nos banheiros”, completa.  A iniciativa coincidiu com o período de racionamento e, à época, adesivos foram colocados no estabelecimento com alerta para que os clientes colaborassem com o uso consciente do recurso. Desde então, a conta de água caiu de 20% a 30%. “A gente entende que foi um investimento importante”, avaliou Francisco.
 
 

A moradora de Samambaia Norte, Vanessa Antunes, 31, reaproveitava a água da máquina de lavar roupas para a limpeza da casa quando, em 2019, passou a captar chuva para molhar as plantas. Campanhas educativas e o sistema de rodízio implementado pelo GDF dois anos antes chamaram a atenção da autônoma. “Passei a sempre observar ações cotidianas que pudessem poupar o meio ambiente”, justificou. Além disso, práticas como evitar banhos demorados e manter um copo no banheiro para escovar os dentes viraram rotina. “São atitudes pequenas que fazem a diferença”, recomendou Vanessa.

A consciência do recurso hídrico é prioridade no dia a dia da moradora de Sobradinho Cíntia Almeida, 43. A analista de sistema começou a economizar há oito anos. Desde então, tenta aperfeiçoá-las. “À época, eu comprei uma caixa d’água para deixar na lavanderia e captar a água da máquina de lavar. Recentemente, para obter mais espaço no ambiente, troquei o utensílio por tambores de água, com cerca de 150 litros.” A prática possibilita o reúso para regar plantas e lavar a casa. “Hoje, é algo muito natural. Até me incomodo ao ver alguém lavando a varanda com água da torneira”, reconheceu Cíntia. “Quando é uma pessoa próxima, eu aconselho a tomar medidas que podem economizar água”, acrescentou.

Para o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB) Frederico Flósculo Pinheiro Barreto, os cerca de 3 milhões de habitantes do Distrito Federal exigem medidas particulares contra nova crise hídrica. “A gente tem de saber que, no DF, são águas contadas. Em qualquer população acima de 2,4 mil habitantes no mundo, há estresse hídrico. Aqui não é diferente”, explica.

Corumbá IV

Principal aposta do Governo do Distrito Federal para garantir o abastecimento da capital pelas próximas três décadas, o Sistema Produtor Corumbá IV acumula atrasos na obra. A empreitada é de responsabilidade de um consórcio do qual faz parte a Companhia Saneamento de Goiás (Saneago), em parceria com a Companhia de Saneamento do DF (Caesb). O último prazo dado pelo GDF para a entrega do complexo venceu em dezembro de 2019.

Questionada sobre os atrasos na construção, a Caesb informou que prevê o início de operação do sistema ainda no primeiro semestre de 2020. Segundo a empresa, a inauguração teve de ser reagendada devido a dificuldades encontradas pela Saneago na liberação fundiária de área para implementação da linha de transmissão de energia elétrica para Corumbá IV.

Memória

Rodízio no fornecimento

A maior crise hídrica da história do Distrito Federal começou em 2017. Durante 513 dias, a capital lidou com o rodízio de fornecimento de água feito pela Companhia de Saneamento Ambiental (Caesb). O racionamento acabou em 15 de junho de 2018, quando a Barragem do Descoberto chegou a 90% da sua capacidade e o reservatório de Santa Maria, a 56,5%. Estima-se que, neste período, os brasilienses economizaram 24,2 bilhões de litros de água, quantidade equivalente a cerca de 9,6 mil piscinas olímpicas cheias. O período também culminou na queda do consumo por habitante. Em janeiro deste ano, a estimativa da Caesb era de que cada morador de Brasília gastava, em média, 129 litros de água por dia.

 

*Estagiária sob supervisão de Guilherme Goulart