Correio Braziliense
postado em 12/01/2020 08:00
A quantidade de vítimas de homicídio no Distrito Federal em 2019 foi a menor em 25 anos e o índice de mortes por esse tipo de crime para cada 100 mil habitantes foi o mais baixo dos últimos 35. Os números, a que o Correio teve acesso em primeira mão, são do balanço consolidado pela Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF). Os dados devem ser divulgados nesta semana. A estatística positiva, no entanto, não se repete em relação aos feminicídios, que cresceram quase 18% em relação a 2018 (33 casos contra 28).
Em 2019, 415 pessoas morreram assassinadas na capital do país e, no ano anterior, 459 — redução de 9,5%. A análise dos dados da década revela que a tendência de queda mantém-se desde 2013. Naquele ano, houve 721 casos registrados, de acordo com os números da SSP. Em 2012, o pior período dos últimos 10 anos, a quantidade de vítimas chegou a 820.
A taxa de homicídios a cada 100 mil habitantes do DF ficou em 13% no ano passado. Em 2018, o índice era de 14,7%. Assim como ocorreu com o total de vítimas, o percentual segue em queda desde 2013 (25,8%). Em 2012, registrou-se a pior taxa dos últimos 10 anos, de 31%. Nas tentativas de homicídio, houve aumento de 0,5% entre 2018 e 2019: os casos sem sucesso saltaram de 797 para 801.
A metodologia usada para contabilizar os assassinatos em Brasília mudou em 2000. Até então, os registros eram do número de ocorrências, não da quantidade total de vítimas. Por exemplo: Se houvesse cinco pessoas mortas após uma única ocorrência, o balanço registraria apenas uma morte. Por isso, na avaliação de técnicos da pasta de Segurança Pública, o recorde de 2019 seria ainda maior se o método atual fosse considerado em relação aos números anteriores ao Século 21.
Consultor na área, George Felipe Dantas considera que há múltiplas causas que se refletiram na queda dos índices. Entre elas estariam a inversão da pirâmide etária da população; a diminuição do processo de urbanização súbita e desordenada; a atuação das forças de segurança; e a organização das áreas públicas. “A desordem induz ao crime na medida em que esse descuido com o espaço urbano dá impressão aos potenciais criminosos de que o Estado está ausente. E tem havido uma série de iniciativas da segurança pública nessa área”, avalia.
George acrescenta outros elementos com peso importante em relação aos tipos de crimes que subiram — tentativas de feminicídio, homicídio e latrocínio. “Os fenômenos de crimes que acontecem em ambiente intralar, que estão associados à dependência química e à delinquência de crianças e jovens, precisam de um tipo de tratamento para contenção que transcende a esfera da segurança pública. São (questões) bastante difíceis de controlar”, comenta o consultor.
Integração
O secretário de Segurança do DF, Anderson Torres, acredita que os números positivos são resultado da integração nas ações das corporações e na “racionalização do emprego de efetivo” com ações prévias de inteligência. “Atingir as expressivas marcas de redução da criminalidade no DF, em 2019, só foi possível inicialmente pela total autonomia de trabalho que nos foi dada”, acrescenta o chefe da pasta.
Torres afirma que a divulgação de resultados positivos terá impacto na sensação de segurança da população brasiliense. “É muito difícil competir com o valor-notícia do crime. Este sempre tem destaque quando ocorre, o que já não acontece com a prevenção. Por isso, nosso esforço continuado em comunicar, cada vez mais à população, as conquistas da Secretaria de Segurança Pública”, argumenta.
Feminicídio é obstáculo
Enquanto celebra os recordes em relação ao número de homicídios, a Secretaria de Segurança Pública e o governo local têm como obstáculo reduzir as vítimas de feminicídio. As mortes de mulheres motivadas por questão de gênero cresceram quase 18% em 2019. O assunto ganhou destaque e virou pauta em debate frequente no Distrito Federal.
O titular da pasta, Anderson Torres, reconhece que a questão é um desafio e ressalta a importância de a população se conscientizar sobre a importância das denúncias de violência doméstica. “Na maioria dos casos investigados, havia histórico de agressões, porém, sem qualquer notificação às forças de segurança”, comenta. “Nesse tipo de crime em particular, a participação dos vizinhos, familiares e amigos é vital para que o Estado tome conhecimento, o ciclo crescente de violência seja interrompido e o feminicídio, evitado”, completa.
Para a professora de antropologia da Universidade de Brasília (UnB) Lia Zanotta, o aumento das ocorrências de feminicídio representa uma “resposta aos tempos atuais” em que há um discurso centrado em um cenário autoritário e masculino. “É um discurso antigo, mas reforçado por essa narrativa de que o ‘homem de bem’ deve controlar a família e não respeitar individualmente a mulher ou os filhos. O primeiro efeito do discurso da intolerância tem sido contra as mulheres”, pontua a pesquisadora.
Além disso, Lia destaca que a saída passa não só pela educação, como também por medidas que garantam que os agressores se mantenham afastados das vítimas. “Os atendimentos nos setores de reeducação e reflexão precisam ser muito maiores. Depois de detidos, os agressores têm de ser encaminhados para grupos de reflexão, com possibilidade de superar a raiva e o intento. Temos de ver que a Lei Maria da Penha tem capacidade de punição, além de readequação (dos agressores) e de volta à vida em sociedade. Não só para que eles mantenham as mulheres vivas, como também para que interrompam a ação”, sugere a professora.
Redução
Dados integram balanço da Secretaria de Segurança Pública:
Ano Total de vítimas (números absolutos)
1995 479
1996 472
1997 462
1998 522
1999 501
2000 606
2001 549
2002 519
2003 613
2004 567
2005 526
2006 550
2007 594
2008 669
2009 780
2010 655
2011 745
2012 820
2013 721
2014 716
2015 626
2016 603
2017 508
2018 459
2019 415
Ano Taxa de homicídio no DF (%)*
1985 13,9
1986 16,7
1987 16,9
1988 15,2
1989 17,2
1990 21,7
1991 22,1
1992 18,4
1993 25,4
1994 23,0
1995 27,0
1996 26,0
1997 24,8
1998 27,1
1999 25,4
2000 29,5
2001 26,2
2002 24,2
2003 28,0
2004 24,8
2005 22,5
2006 23,1
2007 24,2
2008 26,2
2009 29,9
2010 25,5
2011 28,5
2012 31,0
2013 25,8
2014 25,1
2015 21,5
2016 20,2
2017 16,7
2018 14,7
2019 13,0
*Por grupo de 100 mil habitantes
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