Cidades

Crônica da Cidade

Barbárie globalizada

Correio Braziliense
postado em 16/01/2020 04:07
Não dá para entender o que está acontecendo no mundo e no Brasil sem ler o sociólogo polonês Zigmunt Bauman. Ele escreveu mais de 30 livros sobre a pós-modernidade. Não são fáceis, mas vale a pena o esforço de entendimento, pois as análises e reflexões dele traçam um mapa essencial para se situar na selva selvagem da globalização.

São tempos regidos por três conceitos: a desregulamentação, a flexibilização e a individualização. A cada dia os cidadãos perdem os direitos duramente conquistados durante séculos e são lançados no desamparo. As instituições de proteção são desconstruídas e apagadas: “O mantra do dia não é mais ‘salvação pela sociedade’; infelizmente, o que se ouve agora, como homilias insistentes, é que devemos buscar soluções individuais para problemas produzidos socialmente e sofridos coletivamente”, comenta Bauman em entrevista a Maria Lúcia Palhares.

Toda a responsabilidade é jogada nas mãos dos indivíduos. Os desvalidos entram na linha do desespero e a classe média no limite da precariedade: “Foi uma catástrofe arrastar a classe média à precariedade. O conflito não é mais entre classes, é de cada um com a sociedade”.

Bauman defende uma postura ética de avaliar a qualidade de uma sociedade pela preocupação e o tratamento dado aos que se encontram em posição mais vulnerável: “A capacidade de carga de uma ponte não é medida pela capacidade média dos pilares, mas pela capacidade do pilar mais fraco. Eu sempre acreditei que não se mede a qualidade de uma sociedade pelo seu Produto Interno Bruto, mas pela qualidade de vida dos seus membros mais fracos”.

As novas tecnologias de comunicação não permitem mais alegar desconhecimento sobre as injustiças do mundo globalizado. Mas a internet também é mina de perigos. Baumam gostava de citar Ulrich Beck, que alertou sobre os intricados mecanismos da sociedade de risco, “nós, cidadãos, perdemos a soberania sobre nossos sentidos e, portanto, também sobre nosso julgamento... ninguém é mais cego para o perigo do que aqueles que continuam a confiar em seus próprios olhos”.

Bauman chamava a atenção para as dissimulações do mundo da internet: “Nas redes sociais, é tão fácil adicionar e deletar amigos que as habilidades sociais não são necessárias. As redes são muito úteis, oferecem serviços prazerosos, mas são uma armadilha.”

Bauman me parece pessimista e conformista com a individualização do mundo atual. A análise que faz do mundo globalizado é brilhante. Mas faltou formular uma teoria sobre a preservação das instituições e a reinstitucionalização das entidades destruídas. É preciso reconstruir as redes de proteção aos indivíduos. Sem isso estamos condenados à barbárie.

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