Correio Braziliense
postado em 04/02/2020 04:09
As obras de drenagem e asfaltamento de Vicente Pires serão intensificadas a partir de março. É o que afirma o administrador da região, Daniel de Castro. De acordo com ele, o cronograma está dentro do previsto pela administração, mas as chuvas recentes contribuíram para a diminuição do ritmo. “Criamos um cronograma, junto à Secretaria de Obras, em que previmos a finalização até dezembro de 2020. Mas, neste momento, a gente depende do clima. Ao passar a chuva, vamos para a finalização”, explica.
Ainda segundo Castro, desde dezembro, medidas paliativas vêm sendo tomadas, como a liberação de ruas obstruídas pela terra e o nivelamento de vias, além da construção de calçadas: “Estão acontecendo, mesmo que debaixo de chuva”.
No entanto, moradores e frequentadores da região administrativa sofrem com os transtornos e prejuízos causados pela falta de infraestrutura. Professora em uma escola particular localizada na Rua 3, Viviane Lima, 40 anos, reclama dos constantes estragos causados pela chuva. “Nesta época, enche de água e não tem para onde escoar. Também fica cheio de buraco. Para completar, toda vez que a chuva vem, leva o resto de asfalto que ainda tem. Aí, desce o barro vermelho até a EPTG (Estrada Parque Taguatinga). Isso é constante. Todo mundo tem medo de cair em um bueiro ou de ser arrastado. O carro da gente sempre anda sujo. Não tem como manter limpo”, relata.
Segundo a professora, os transtornos são temas constantes até nas redações dos alunos que moram na região. “Peço para eles descreverem a rua onde moram e eles sempre dizem coisas como ‘feia’, ‘cheia de buraco e de lama’. Podem morar no melhor condomínio, ou em uma casa maravilhosa toda estruturada, mas eles falam as mesmas coisas sobre as ruas”, conta.
A situação afeta o comércio local e compromete negócios de empresários da região. Jurandir Pereira Marinho, 58, é dono de um restaurante na Rua 3. Segundo ele, o maior problema é o acesso ao local. “A minha venda caiu 80% em um ano. Sábado e domingo eu tinha isso aqui cheio. Não tinha mais lugar para sentar. Esse movimento do meio de semana, em que temos que vender marmita para sobreviver, não paga a conta. O fim de semana que paga. Só que o pessoal não vai botar o carro aí. Quem é louco?”, pontua.
A alternativa passa a ser realizar promoções para atrair clientes na rua onde, segundo ele, cerca de 10 estabelecimentos fecharam em menos de seis meses, em função dos transtornos causados pela falta de infraestrutura. “Tem fim de semana que a gente coloca 15% de desconto e eu ainda digo ‘é para você lavar o carro’. A gente vai levando assim. Mas é difícil sobreviver nessas condições”, lamenta.
Ao Correio, o presidente da Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Vicente Pires (Acivip), Anchieta Coimbra, afirmou que, até março e abril do ano passado, havia um crescimento de estabelecimentos fechando as portas. No entanto, segundo Coimbra, a partir de maio de 2019, o quadro se estabilizou e o número de comércios locais cresceu. Ele não soube informar, entretanto, a quantidade de estabelecimentos que deixaram de funcionar no último ano.
Prioridades
Questionada sobre a conclusão das obras em Vicente Pires, a Secretaria de Obras afirmou que a empreitada está entre as prioridades do Governo do Distrito Federal (GDF). De acordo com a pasta, em 2019, as ruas 3A, 3B, 3C, 4, 5, e 6 foram totalmente asfaltadas e parte das ruas 7, 8 e 10, também. O que equivaleria a 30% do planejado para o setor habitacional. Segundo a secretaria, foram investidos R$ 90 milhões no ano passado.
Em nota, a pasta ainda afirmou que a conclusão da pavimentação asfáltica das ruas 3, 7 e 8 é prioritária em 2020, bem como a drenagem e o asfaltamento das ruas 4A, 4B e 12. Outra prioridade mencionada pela secretaria é a licitação do Lote 2.
Sobre os transtornos causados pelas obras, a pasta informa que tem ciência do impacto e pede “paciência à população”, já que “tudo previsto nos contratos estará concluído no fim deste ano”. A previsão é de que sejam investidos cerca de R$ 150 milhões em 2020.
Morador de Vicente Pires há 20 anos, Elival da Rocha, 40, vê progressos na região, apesar dos transtornos. “Quando tem chuva é duro. Mas as últimas obras melhoraram bastante. Tem uma melhora significativa aqui na Rua 5, só que ainda faltam algumas ruas. Quando chove, fica intransitável. Isso, devido às obras que estão acontecendo ainda. Mas vai melhorar, com certeza”, avalia.
Enquanto aguarda o fim das obras, o vendedor convive com os alagamentos constantes: “A gente fica ilhado. Vira uma lagoa (no cruzamento das ruas 5 e 6), definitivamente. Todas as águas convergem para esse ponto. É um dos lugares mais caóticos. A própria geografia da cidade favorece isso”.
Urbanização
De acordo com Sérgio Koid, professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília (UnB), os transtornos são consequência da ocupação desordenada da região administrativa. “Parece que o problema nunca termina. Mas a estrutura de urbanização não é adequada, justamente, porque não era para ser um núcleo urbano. Era um setor de chácaras. Os lotes
eram grandes e rurais. Não havia problema de infraestrutura. O que escoava da chuva não causava problemas. A partir da década de 1990, começou o fracionamento das chácaras. Com isso, virou uma área urbana com uma alta taxa de impermeabilização. As áreas verdes foram tomadas pelo concreto das casas, grandes galpões, cimento em jardins”, elenca.
Segundo Koid, em função da urbanização inadequada da região, as obras resolverão apenas parte dos problemas. Moradores e frequentadores de Vicente Pires continuarão a conviver com alagamentos. “Existe um planejamento. Mas ainda assim não vai resolver 100% dos problemas. As obras vão atender a maior parte das chuvas normais quando estiverem concluídas. Mas, toda vez que chover mais forte, vai haver alagamento, além de terra e asfalto que serão arrastados. Vai acontecer com menos frequência, mas uma vez a cada cinco ou 10 anos, isso vai se repetir. Não há obra de infraestrutura que suporte esse tipo de ocupação”, alerta.
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