Cidades

Crônica da Cidade

Correio Braziliense
postado em 23/02/2020 04:07
Bloquinhos na quadras

Muita gente pensa que a festa coletiva só se faz com os blocos que arrastam milhares de pessoas e entram para o Livro dos Recordes. Mas isso é uma miragem. A folia se brinca também e, principalmente, nos pequenos blocos.

Considero-me brincante, mas não no carnaval. O que me afastou da festa foi a violência. Certa vez, fui a Recife para cobrir um evento numa época de carnaval. Levaram-me para o centro da cidade e fiquei impressionado com algumas cenas que vi. As famílias participavam, as crianças maiores frevavam nas ruas e as menores ficavam encarapitadas no pescoço dos pais.

Tenho a impressão de que isso ocorre por causa do apelo de pertencimento. A folia não é mero pretexto para extravasar o ódio. É uma festa cultural. Por isso, saúdo os bloquinhos que irromperam nas superquadras e nas vias de Brasília desde 2013.

Fiquei encantado com o Ventoinha da Tesourinha, que, há dois anos, irrompeu na redação com as flautas de pífanos e bateria. Eles costumam sair nas superquadras e uma das plataformas da trupe é não crescer. Querem apenas brincar nas tesourinhas.

Contaram-me a história de um outro bloco no qual eu não fui, mas gostei: Vai quem fica. Nem sei se ele existe ainda, mas, de qualquer maneira, a plataforma utópica dele é tão boa que merece ser divulgada.

Aliás, você só vai se for convidado. E, para ser, precisa merecer. Os convites são estritamente individuais. Ninguém sabe de que lugar o bloco sairá. A folia sempre sai na Asa Norte. Mas os brincantes só são avisados do lugar em cima da hora.

Tanto cuidado e tantos dribles têm como objetivo combater pela raiz o mal que destrói todos os grupos que começam com uma proposta interessante, mas degeneram quando crescem. Os que ficam gigantes, costumam virar monstros sem rosto, sem valores e sem nenhuma direção. A violência passa a imperar.

Se o carnaval é a utopia de reverter os valores com humor, o Vai Quem Fica é a utopia dentro da utopia. Ele transforma em realidade a utopia de um carnaval civilizado, uma bagunça organizada: “Aqui estamos novamente para fazer a nossa brincadeira séria”, diz uma mensagem do comando do grupo aos seletos convidados: “Vamos destilar em poesia todas as tristezas desses tempos. Vamos nos abraçar e matar em cada encontro as saudades do tempo que nos escapa entre os dedos”.

E continua: “Primeiro, é preciso lembrar as coisas importantes de sempre. Gostaria de pedir muuuuito cuidado de todos com os canteiros dos prédios e com o lixo. Não pisem os canteiros, especialmente aqueles arrumadinhos. Colocaremos alguns sacos de lixo no caminho. Usem eles! Nada de latinhas no chão! Só confete e serpentina. Cuidem das nossas crianças. Prestigie e reverencie os mais velhos. Respeito acima de tudo”. Espero que eles não fiquem bravos com a divulgação. Mas, neste bloco, eu não fui e gostei.
 
 

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