Cidades

Crônica da Cidade

Brasília no sambódromo

Correio Braziliense
postado em 26/02/2020 04:07
Fiquei curioso com o desfile que a Vila Isabel apresentaria, supostamente, para homenagear a passagem dos 60 anos de Brasília no sambódromo da Marquês de Sapucaí. O enredo Gigante pela própria natureza: jaçanã e um índio chamado Brasil é engenhoso. O curumim Brasil se transforma em um grande guerreiro animado pela força ancestral dos antepassados.

Brasília é a irmã do Brasil, que nasce para trazer a esperança. “O objetivo do enredo é humanizar o povo brasileiro. De leste a oeste, de norte a sul, o pequeno grande guerreiro conhece todas as culturas para unificar isso e, singularmente, demonstrar a identidade do povo brasileiro”, explicou o carnavalesco. Nenhuma palavra sobre Brasília.

O enredo, musicado pelos compositores Cláudio Russo, Chico Alves e Júlio Alves, só fala de Brasília no verso final: “Ô, viola! A sina de preto velho/É luta de quilombola, é pranto, é caridade/ó, fandango!/Candango não perde a fé/Carrega filho e mulher/para erguer a nova cidade”.

Os figurinos, as alegorias e as coreografias eram bonitos. Mas, na verdade, Brasília só entra no samba e nas alas de maneira incidental. O decorador Roberto Garrido representava Juscelino em uma caracterização muito distante da imagem do presidente.

Não sei se o projeto foi prejudicado pelas desavenças entre a direção de Vila Isabel e o GDF em relação a um acordo de cooperação. Pelo que li, o governo local não havia prometido patrocinar o projeto, mas, sim, ajudar a agremiação a arrecadar dinheiro com empresas pela Lei Rouanet. Mas, para quem conhece Brasília, foi frustrante.

O governo argumentou que o desfile seria muito importante para vender uma imagem positiva de Brasília, despertar o interesse em outros brasileiros e alavancar negócios. No entanto, tenho a impressão de que a chance de isso acontecer é próxima de zero. Embora do ponto de vista plástico e coreográfico, o espetáculo tenha sido belo, não houve nenhuma pesquisa sobre Brasília.

O enredo só tocou em questões genéricas e já encenadas. E seria importante lançar um outro olhar sobre Brasília neste momento em que a imagem da cidade está tão maculada pelos corruptos e pelos ineptos. Estava bonito o desfile, mas preferi a performance dos índios que, em 2017, atiraram 200 caixões pretos de papelão no gramado e no espelho d’água do Congresso em protesto contra a invasão de suas terras e a sua destruição.
 

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