Correio Braziliense
postado em 02/03/2020 04:06
A escolha da instituição de ensino ideal para matricular o filho é um dos principais desafios dos pais. Além de procurar aquela que apresente projeto pedagógico alinhado às expectativas da família, é importante pesquisar a situação junto à Secretaria de Educação. No ano passado, a rede pública de ensino precisou acolher cerca de 10 mil alunos de escolas que fecharam sem avisar previamente à pasta ou aos responsáveis.
O Sindicato dos Professores em Estabelecimentos Particulares de Ensino do DF (Sinproep-DF) estima que existam aproximadamente 100 estabelecimentos de ensino sem o devido credenciamento na capital federal. A maioria deles se instala em regiões administrativas mais distantes do Plano Piloto, mas há também casos de instituições irregulares na área central. Os dados oficiais da Secretaria de Educação estão sendo levantados.
O número elevado levou a pasta a lançar, em fevereiro, o Selo Escolas Credenciadas, que abrange toda a rede privada de ensino do Distrito Federal. O objetivo é ajudar os pais na fiscalização do cumprimento de exigências legais por parte das instituições de ensino, que devem colocá-lo em local visível. Por meio de QR Code, eles conseguem ter acesso, no celular, às informações a respeito de licenças e credenciamento.
Além disso, o material constitui uma forma de aproximar as escolas da secretaria, conforme destaca o subsecretário de Planejamento, Acompanhamento e Avaliação, Cláudio Amorim. “O selo vem para chamar essas instituições que estão na irregularidade a virem conversar conosco, que vamos ensinar o caminho das pedras, explicar qual a estrutura mínima necessária e sobre os profissionais que vão atuar nessas instituições”, elenca (leia Quatro perguntas para).
Alexandre Veloso, presidente da Associação de Pais de Alunos de Entidades de Ensino Público e Privadas (Aspa-DF), vê com bons olhos a medida, mas espera que, com o tempo, a consulta se torne ainda mais ampla. “A partir de agora, que (o selo) possa passar por aprimoramento e garanta o acesso a outras informações, como as trabalhistas e de ordem financeira, se a escola está inadimplente com professores, por exemplo.” Em caso de irregularidades, ele alerta que os responsáveis devem procurar os canais oficiais, como a Ouvidoria do GDF, pelo telefone 162, ou até mesmo a Aspa, que pode orientá-los sobre que medidas tomar.
Transparência
Para evitar problemas futuros com as documentações, os pais de estudantes matriculados no recém-inaugurado Colégio COC Sudoeste criaram uma comissão e acompanham o passo a passo do processo desde que o início do ano letivo precisou ser adiado, para a conclusão das obras e dos trâmites burocráticos.
Mãe de dois alunos da escola, a dentista Priscila Pagioro, 40 anos, faz parte desse grupo, de 15 integrantes, e conta que o diálogo com a direção foi essencial para retomar a segurança na escolha da instituição. “O vínculo e a transparência que a gente conseguiu foi o mais importante de tudo”, garante.
Outro revés, no entanto, deixa os responsáveis apreensivos. Na última quinta-feira, quando as aulas começaram, a Justiça concedeu liminar ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) para suspender as atividades no colégio até que o edifício, na Quadra 101 do Sudoeste, receba o Habite-se.
Apesar de estarem certos da segurança dos filhos, desde o início das obras, eles têm enfrentado problemas com moradores da região. Em carta-desabafo publicada nas redes sociais, um grupo de pais relata o assédio que os filhos, crianças e adolescentes, sofrem até mesmo por andar com o uniforme da escola pelos pilotis.
“Cansa ser pai e mãe no dia de hoje e lutar para que seu filho possa frequentar um hotel, um restaurante e, agora, a escola. Estamos exaustos, física e mentalmente. Nos sentimos constrangidos de andar com as crianças de uniforme. Só porque alguns não aceitam o barulho das risadas, das músicas infantis, da festinha junina que acontece uma vez por ano”, escreveram.
A servidora pública Gabriela Gonçalves, 44 anos, ouviu até de amigos questionamentos a respeito da escolha do colégio. “Isso é um transtorno psicológico fora do normal”, afirma. Ela e o marido optaram pela instituição de ensino no Sudoeste para matricular a filha de 7 anos em razão da proximidade de casa e porque acharam o valor da mensalidade justo. “Não fiz a matrícula enganada. Antes, pesquisei se o terreno era deles e estávamos conscientes da escolha. A angústia foi quando começou esse processo com o Ministério Público”, completa.
“A escolha de uma escola é uma coisa que pesa sobre os nossos ombros. Temos dúvidas não só com relação ao pedagógico, mas também à segurança da edificação”, observa o advogado Leandro Brito, 34 anos. Foi por isso que ele decidiu também fazer parte da comissão de pais que dialogou com a direção da escola onde as duas filhas estudam, e reforça que a transparência constitui elemento essencial.
“Aqui em casa estamos muito tranquilos em relação à opção que fizemos. Ontem e hoje elas nos deram retornos bem importantes”, diz Leandro.
Documentação
“Começamos a fechar as pré-matrículas numa obra. O pai comprou um sonho de uma escola para o filho”, afirma a mantenedora do COC Sudoeste, Wilma Matos. Ela garante que a instituição buscou todas as licenças necessárias com celeridade, desde outubro do ano passado.
De acordo com Wilma, após a concessão dos laudos dos Bombeiros e da Defesa Civil, foi possível solicitar a autorização de funcionamento à Secretaria de Educação, primeiro passo do processo de credenciamento. O documento foi obtido também na última quinta-feira e publicado no Diário Oficial do DF na sexta. Agora, a escola já pode imprimir e afixar o selo com o QR Code.
A carta de Habite-se, segundo as normas vigentes, não é obrigatória para pleitear essa regularização junto à pasta. Na avaliação do Ministério Público, no entanto, “essa autorização não afasta a necessidade do Habite-se para a ocupação das instalações”. O colégio solicitou o documento à secretaria responsável na quinta-feira da semana passada.
Ao Correio, o MP informou que existem diversas apurações relacionadas a ocupações irregulares por unidades de ensino. Preferiu, no entanto, citar apenas aquelas ajuizadas. As demais ainda não tiveram as investigações concluídas.
Além do COC Sudoeste, a Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística pediu a anulação da licença de funcionamento de uma escola e recomendou ao diretor da antiga Agência de Fiscalização do DF (Agefis) demolição de edificação e desobstrução da área pública ocupada por outra. Ambas estão localizadas no Plano Piloto.
Fechadas sem aviso
Um dos casos emblemáticos de fechamento de escolas no DF foi o do Colégio Alub. Mergulhada em grave crise financeira, a rede de ensino suspendeu as atividades em outubro do ano passado, nas seis unidades. Além disso, duas delas não contavam com a autorização da Secretaria de Educação para funcionar.
Com o filho Vítor Ataídes, 13 anos, matriculado em uma delas, a jornalista Vera Ataídes, 40, enfrentou dificuldades para conseguir transferi-lo a outra escola. À época, a Secretaria de Educação disse às famílias que garantiria a transferência de todos os estudantes prejudicados. Vítor, que estava no 8º ano do ensino fundamental, ficou cerca de 10 dias sem aulas.
O problema só se resolveu depois de a pasta conseguir vagas em escolas públicas para os alunos. “Foi um pesadelo. Você acha que está tudo ok, tudo organizado, mas, faltando um mês e meio para o fim do ano letivo, ele (Vítor) não teria como concluí-lo. Foi um momento bem complexo. Vi um desespero coletivo. Nós (os pais) não sabíamos o que fazer. Chegou um dia em que fiquei com medo de meu filho perder o ano”, relatou Vera.
Acordo
O mesmo aconteceu com o colégio Maxwell, no Guará, que fechou as portas também em outubro de 2019. Hoje, as duas instituições cumprem um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado com as Promotorias de Justiça de Defesa da Educação (Proeduc) e do Consumidor (Prodecon) do MPDFT para reduzir os prejuízos aos alunos.
Em 13 de fevereiro, a Proeduc promoveu reunião com representantes do Alub, que solicitou mais 60 dias de prazo para a preparação do acervo que deverá ser remetido à Secretaria de Educação. O Maxwell também precisará fazer o envio à pasta, que ficará responsável por receber os documentos e arquivá-los, para posterior requisição dos alunos que necessitarem dos históricos escolares.
Quatro perguntas para
Cláudio Amorim, subsecretário de Planejamento, Acompanhamento e Avaliação
Por que houve a necessidade de criação do Selo Escolas Credenciadas?
No ano passado, grande número de instituições privadas fecharam as portas sem comunicação prévia aos pais ou à Secretaria de Educação. Então, nós tivemos que abarcar todos os alunos sem planejamento estratégico. Foram quase 10 mil estudantes só na rede pública. A partir daí, verificamos que muitas dessas instituições, principalmente dos grandes grupos, que possuem várias unidades espalhadas no Distrito Federal, contavam com credenciamento em uma unidade e em outra, não. A população acredita que a instituição está regularizada como um todo, mas não está. A ideia, portanto, é facilitar a comunicação com a população do DF.
Quando começou a ser desenvolvido?
A secretaria é apenas um pequeno pedaço dessa fiscalização, nós fiscalizamos a parte pedagógica e legal da instituição, mas precisamos também verificar se ela está seguindo a legislação vigente com relação à estrutura adequada para o atendimento, e aí entram outros órgãos e secretarias, como DF Legal e Corpo de Bombeiros, que fazem os alvarás de funcionamento. É um grupo bem amplo que fiscaliza e tem sua parcela de responsabilidade. Todo esse diálogo começou em agosto, a partir de denúncias que fomos recebendo ao longo de 2019, de fechamento de instituição, principalmente das que atendem crianças de 0 a 3 anos, creches.
Ele garante que todas as licenças tenham sido concedidas?
Exatamente. É um selo bem inteligente, um QR Code, os pais utilizam o celular, entram na página da Secretaria de Educação e veem quando foi a autorização, credenciamento ou recredenciamento, até quando valem, e toda a documentação que aquela instituição tem junto à secretaria.
Já começaram a ser distribuídos?
Sim, e vamos terminar este mês. A tendência é a própria instituição imprimir, fazer o adesivo e colocar nos murais. As que estão credenciadas e autorizadas recebem o selo da Secretaria de Educação.
» Colaborou Jéssica Eufrásio
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