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Correio Braziliense
postado em 09/03/2020 04:36


Há muito tempo, talvez mais de 500 anos, o Brasil é um campo de batalha entre homens e mulheres. Os colonizadores europeus já chegaram aqui estuprando as índias e matando nativos em geral. A cultura da violência patriarcal tornou-se ainda mais cruel com as mulheres.

Passados mais de 500 anos, em 2015, mais exatamente em 9 de março, foi sancionada a Lei nº 13.104, que prevê o crime de feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio. O parágrafo segundo, do artigo 121 do Código Penal define o homicídio qualificado, estabelecendo-se o feminicídio como um desses crimes. Sendo o feminicídio um homicídio qualificado, foi incluído no rol dos crimes hediondos.

Como a própria palavra já diz, feminicídio é, obviamente, o assassinato de pessoa do sexo feminino. No entanto, para que essa conduta esteja configurada de maneira destacada e não abrangida pelo tradicional crime de homicídio, está claro que alguma peculiaridade esse delito contém. Não se trata de qualquer assassinato de mulher, mas, como explicitado na lei, consiste em “matar mulher por razões da condição de sexo feminino”.

Assim, a lei, de cuja construção tenho orgulho de ter participado, deixa muito clara a diferença entre homicídio de mulher e feminicídio. Em resumo, a criação da figura penal do feminicídio veio esclarecer que uma pessoa que morreu assassinada não teria morrido nas mesmas circunstâncias se não fosse mulher. Trata-se de escancarar a violência de gênero e aumentar seu rigor punitivo, medida importante na intimidação do agressor.

Com uma taxa de 4,8 homicídios a cada 100 mil mulheres, em um grupo de 83 países, o Brasil ocupa a vergonhosa posição de quinto pior país no ranking da violência de gênero, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2015. Em comparação com os dados referentes aos países considerados civilizados, o Brasil tem 48 vezes mais feminicídios do que o Reino Unido, 24 vezes mais do que a Dinamarca e 16 vezes mais do que o Japão. Nosso país está atrás apenas de El Salvador, que ocupa o lamentável primeiro lugar mundial de violência contra a mulher, com uma taxa de 8,9 mulheres assassinadas a cada 100 mil; da Colômbia, com 6,3, e da Guatemala, com 6,2 (dados colhidos pelo Ipea entre os anos de 2011 e 2013 e divulgados em 2015).

Desta forma, conclui-se que, na verdade, os maiores genocídios da história não precisaram de mísseis, pois os homens tonam-se armas de destruição massiva em relação às mulheres.

O Brasil deu vários passos na defesa da integridade física e psicológica da população feminina, mas as medidas adotadas ainda não se mostraram suficientes para fazer diminuir os índices de violência de gênero. Por essa razão, devemos continuar buscando caminhos para alcançar a eficiência que nos possibilitará viver em uma comunidade pacificada.

* Luiza Nagib Eluf é advogada criminalista, ex-procuradora de Justiça do Ministério Público de São Paulo e autora de sete livros, entre eles o best-seller A paixão no banco dos réus.





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