Cidades

O desastre da omissão

Participaram dessa cobertura: Otávio Augusto, Ana Maria Campos, Flávia Maia, Ana Viriato, Isa Stacciarini, Luiz Calcagno, Simone Kafruni e Thiago Soares; Bruno Lima, Deborah Novais, Alexandre de Paula, Pedro Grigori (especiais para o Correio); e Jéssica Eufrásio, Walder Galvão, Murilo Fagundes, Hellen Leite e Suzanny Costa (estagiários).

Correio Braziliense
postado em 24/03/2020 06:00

Queda do viaduto sobre a galeria dos estados no início do eixão sulEsta matéria foi publicada originalmente na edição de 7 de fevereiro de 2018 do Correio. Sua republicação faz parte do projeto Brasília Sexagenária, que até 21 de abril de 2020 trará, diariamente, reportagens e fotos marcantes da história da capital. Acompanhe a série no site especial e no nosso Instagram

 

Pela segunda vez, em três dias, Brasília voltou a ser assombrada pela falta de manutenção em construções da cidade, um problema que se perpetua governo após governo. Ontem, faltavam 15 minutos para o meio-dia quando parte do viaduto que fica sobre a Galeria dos Estados ruiu, abrindo uma cratera em duas faixas do Eixão Sul. Apesar de a via ser uma das mais movimentadas da capital — por lá passam cerca de 100 mil veículos diariamente —, ninguém se feriu. Quatro carros foram destruídos. Um raio de 40 metros,a partir do local do acidente, ficará isolado até 19 de fevereiro. “A estrutura que ficou ainda corre risco de desabamento”, diz Henrique Luduvice, diretor-geral do DER, responsável pelo laudo que deve apontar as causas do desastre. Em 2012, auditoria do TCDF relacionou seis construções públicas que precisavam de reparos urgentes. O viaduto era uma delas.

 

O concreto já rachou

Dois acidentes semelhantes em dois dias escancaram as consequências da falta de manutenção das estruturas do DF. Desta vez, o viaduto da Galeria dos Estados desabou, levando ao chão duas faixas do Eixão Sul. Ninguém se feriu

 

Uma das mais jovens capitais brasileiras e uma das únicas do mundo a ser planejada, Brasília está em alerta após dois desabamentos. Prestes a completar 58 anos, obras erguidas à época da construção da cidade começam a ruir. Ontem, parte do viaduto sobre a Galeria dos Estados, no Eixo Sul, desabou. Esse é o segundo acidente do tipo. Antes, a laje da garagem de um bloco da 210 Norte cedeu, no domingo, provocando um prejuízo de R$ 2 milhões (leia mais na página 24).

 

Passados 30 anos do tombamento, a primeira cidade moderna a receber o título de Patrimônio Cultural da Humanidade da Unesco, em dezembro de 1987, Brasília tem o desafio de reciclar as estruturas prediais. O desenho do urbanista Lucio Costa, executado à risca no governo de Juscelino Kubitschek, que, em abril de 1960, inaugurou uma nova forma de se viver no Brasil e garantiu aos moradores da capital uma qualidade de vida única no país, precisa de revitalização. Especialistas são categóricos: o desleixo com a manutenção fragilizou as estruturas.

 

Faltavam 15 minutos para o meio-dia quando um bloco de concreto de 30 metros caiu e abriu uma cratera em duas faixas do Eixo Sul — uma das principais vias expressas da capital federal, por onde passam pelo menos 100 mil carros diariamente. Logo abaixo, um amontoado de ferro retorcido e concreto parou o trânsito. Ninguém se feriu, e o tráfego precisou ser completamente interrompido. Um raio de 40m ficará isolado até 19 de fevereiro. O metrô e as lojas da Galeria dos Estados funcionam normalmente.

 

Quem passava pelo local narrou cenas de horror. Um estrondo e uma nuvem de poeira engoliu a visão. Pelo menos 50 mil pessoas circulam na região do desabamento. A empresária Paula Miranda, 38 anos, é proprietária do Restaurante Floresta. O estabelecimento fica embaixo do viaduto e acabou parcialmente destruído. “Ouvimos um forte barulho. Quando vimos, uma parte da parede estava no chão”, detalhou.

 

O desabamento aconteceu no Eixão, nas imediações do Setor Bancário Sul e perto da Rodoviária do Plano Piloto, pontos estratégicos para a mobilidade da capital federal: reparo pode levar mais de um ano 

 

O garçom Miele Nunes, 29, trabalhava quando o viaduto caiu. Desesperado, saiu correndo. “Saímos sem nem saber o que estava acontecendo”, contou. Depois, o rapaz retornou ao local. “Voltei para ver se tinha alguém lá dentro. Essa é uma tragédia anunciada. Havia rachaduras. Qualquer um percebe que não tinha manutenção”, reclamou.

 

O governador Rodrigo Rollemberg (PSB) esteve na Galeria dos Estados logo após o desabamento e admitiu que a estrutura não passou por reformas. “Brasília é uma cidade que está envelhecendo, é feita de concreto. O nosso governo fez manutenção de reforço de estruturas em vários viadutos, e esse, infelizmente, ainda não tinha recebido”, disse o chefe do Executivo local.

 

Vídeos mostram o desespero de quem passava pelo local na hora do acidente. Motoristas desviaram na contramão da via para fugirem do concreto que cedia. Quatro carros ficaram soterrados. Cães farejadores, dois guindastes e dezenas de homens da Defesa Civil e do Corpo de Bombeiros fizeram buscas. Uma multidão se aglomerou para acompanhar a ação próximo ao Banco Central.

 

Manutenção

O Departamento de Estradas de Rodagens (DER) será responsável por elaborar um laudo para apontar as causas do desabamento. “Nós vamos acompanhar a forma com que a estrutura vai se apresentar daqui para a frente. Sabemos que haverá a necessidade de escoramento com peças metálicas do restante do viaduto”, adiantou o subsecretário da Defesa Civil, coronel Sérgio Sampaio.

 

O diretor-geral do DER, Henrique Luduvice, não quis falar em prazos para início das obras. “A estrutura que ficou ainda corre risco de desabamento”, resumiu. Também queixou-se do orçamento para a manutenção das estruturas. “Os viadutos e as pontes necessitam permanentemente de manutenção. É necessário que os governos destinem mais recursos para isso”, destaca. Os repasses ao DER, previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2018, sofreram uma baixa de 27,96% em relação a 2017. O valor caiu de R$ 794,2 mil para R$ 572,1 mil.

 

O alerta da possibilidade de um desastre no viaduto foi dado em 2012 pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF). Uma auditoria do órgão de controle apontava que o local precisava de reparos urgentes. Além do viaduto sobre a Galeria dos Estados, outras seis construções públicas foram marcadas pela necessidade de manutenção e reparos emergenciais pela auditoria do TCDF. A maioria na zona central de Brasília. Ontem, o Executivo local anunciou a contratação de emergência de uma empresa para a obra de reparo do viaduto.

 

Para saber mais: sucesso nacional

 

Em 1986, a banda brasiliense Plebe Rude lançou um EP com sete músicas intitulado O concreto já rachou. Com letras de cunho político e social, o compacto fez sucesso instantâneo, vendendo mais de 200 mil cópias. A faixa Até quando esperar foi a música mais executada do disco e teve grande aceitação de público e crítica. A produção da obra é assinada pelo vocalista do Paralamas do Sucesso, Herbert Vianna.

 

Infográfico sobre a queda do viaduto da galeria dos estados em Brasília em 2018

Infográfico sobre a queda do viaduto da galeria dos estados em Brasília em 2018 

 

R$ 216 milhões em obras

Executivo local anuncia investimento milionário para reformas e recuperações de obras públicas, como viadutos, prédios e urbanização. Especialistas reforçam a necessidade de vistoria constante nas estruturas da capital federal

Quatro horas após o desabamento do viaduto no Eixão Sul, o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) anunciou o investimento de R$ 216 milhões em obras de reparo e manutenção de estruturas e prédios públicos. A medida veio em resposta ao acidente na Galeria dos Estados. Os recursos para a revitalização dessas áreas estavam previstos na Lei Orçamentária de 2018. Serão R$ 19 milhões para a conservação de estruturas físicas; R$ 18 milhões para a reforma de prédios e blocos públicos; R$ 1 milhão para obras em pontes e viadutos; R$ 32 milhões para a reforma da Rodoviária do Plano Piloto; e R$ 146 milhões para urbanização. O dinheiro para a reconstrução do viaduto no Eixão Sul virá desse montante.

 

Um plano de mobilidade emergencial deve ser criado nos próximos dias para diminuir os impactos no trânsito. “Essas são construções antigas. O nível de exigência daquela época era menor. Possivelmente, houve infiltrações, que podem ter corroído as ferragens ao longo do tempo”, disse o governador.

 

O governador Rodrigo Rollemberg visitou o local do acidente:  

 

O subsecretário de Defesa Civil, coronel Sérgio Sampaio, explicou que, nesse momento, é necessário o escoramento da estrutura para evitar o desabamento de outra parte do viaduto. “Será preciso fazer um escoramento para garantir que outras partes não caiam. É uma estrutura de metal na vertical, que vai dar apoio ao restante do viaduto”, detalhou. Segundo ele, o Departamento de Estradas de Rodagem no DF (DER) é o órgão responsável pela manutenção da ponte, e a Defesa Civil só analisa estruturas quando solicitado pela população ou pelos órgãos competentes. “Notificamos diversos órgãos do governo para garantir a segurança da população. O guindaste que chegou foi solicitado pelos bombeiros para garantir os trabalhos se houvesse necessidade de entrar nos escombros para retirar alguma vítima”, afirmou.

 

Agora, o DER será responsável por elaborar um laudo específico para apontar as causas do desabamento. “Vamos acompanhar a forma como a estrutura vai se comportar daqui para a frente. Somente o laudo de um engenheiro e um estudo de patologia definirão os motivos do desabamento”, ressaltou diretor-geral do DER, Henrique Luduvice.

 

Lei para vistorias

 

Há uma lei distrital, de autoria de Cristiano Araújo (PSD), que prevê vistorias anuais em pontes e viadutos do DF, com a emissão de laudos técnicos. O GDF, contudo, não colocou a proposta em prática. Diante disso, o parlamentar contatou o presidente da Novacap, Júlio Menegotto, para criar um programa de manutenção. À época, o representante da estatal afirmou que o cronograma seria formulado, mas ressaltou que não havia recursos. O governador vetou a proposta, mas a Câmara Legislativa derrubou o impedimento. “Vetamos por conta do vício de iniciativa. Temos o diagnóstico dos viadutos e estávamos trabalhando. Infelizmente, a condição financeira do GDF não permitiu reparos em todos”, disse Rollemberg.

 

Alerta para a manutenção

 

O desabamento de parte de um viaduto no Eixão Sul, ontem, e a queda de uma laje da garagem de uma quadra da Asa Norte, na madrugada de domingo, não são coincidências e descortinam o descaso com a manutenção predial no DF, avaliam especialistas em construção civil. Segundo engenheiros, arquitetos e professores, a falta de uma cultura preventiva faz com que os governos priorizem novas construções. A negligência é tanta que extrapola prédios públicos e obras de arte especiais (OAE), como viadutos e pontes, e chega aos edifícios residenciais. Além disso, a ausência de políticas e estratégias voltadas para a conservação coloca os cidadãos de Brasília em risco constante.

 

Para o presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil no DF (IAB-DF), Célio Melis Júnior, é sintomático ter ocorrido dois acidentes de mesma natureza em questão de dias. “Isso sinaliza que todo o corpo técnico capacitado tem de se preparar para que se abra uma frente de trabalho de vistoria e obras de manutenção”, alertou. “Brasília deveria ter passado por isso. As vistorias precisam ser periódicas, sistemáticas e não podem ser preteridas”, avaliou.

 

Tesourinhas

João Carlos Teatini, professor aposentado do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília (UnB), é autor de um parecer apresentado à Agência de Infraestrutura e Desenvolvimento Urbano do GDF em 2006, no qual fez um alerta sobre a necessidade de vistoria em 17 viadutos em volta do Conjunto Nacional e da Rodoviária do Plano Piloto. “Há 12 anos, classificamos quais mereciam intervenção imediata, porque estavam em estado crítico. O que rompeu hoje (ontem) era um deles, portanto, não era nenhuma novidade que merecia manutenção”, disse. Teatini estimou que a recuperação do viaduto da Galeria dos Estados deve levar um ano. “Vão ter de interditar tudo, escorar todo o viaduto. Não é obra rápida.”

 

O vice-presidente do IAB-DF, Frederico Barboza, explicou que, quando Brasília foi construída, surgiu uma nova tecnologia, chamada concreto protendido, utilizado no viaduto que ruiu. “É uma técnica de fazer o concreto armado com uma tensão prévia, o que aumentava a capacidade de vão, permitia que os pilares ficassem mais afastados uns dos outros e suportassem mais peso. Esse tipo de estrutura era uma coisa nova, mas, como todas as outras, depende de manutenção”, destacou. “Uma infiltração, o que não é incomum, pode comprometer a ferragem”, completou.

 

Várias tesourinhas de Brasília etambém stão com ferragens expostas, alertou Marcontoni Montezuma, engenheiro e diretor do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Distrito Federal (Sinduscon-DF). “E vários prédios residenciais também precisam fazer revisões”, disse. 

 

Risco de novos acidentes

Representantes do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea) afirmaram que relatórios feitos pela entidade desde 2009 mostravam o perigo a que estava exposto o viaduto no Eixão Sul. “Esse viaduto estava pontuado como um problema crítico que demandava certa urgência”, observou a presidente do órgão, Fátima Có. Segundo ela, documentos elaborados em 2009 e 2011 mostravam a situação da estrutura, que, pela falta de manutenção, apresentava “trincas e infiltrações. 

 

Segundo ela, os riscos no local continuam. “O viaduto tem seis vãos e caiu a metade de um. Se um cedeu, provavelmente, os outros estejam em risco, considerando que estão passando pelas mesmas condições e pela falta de manutenção”. A solução apontada por Fátima, com base em análise preliminar de engenheiros, é a realização de um estudo para definir o que fazer com o vão principal do viaduto. Segundo ela, é preciso realizar “a demolição total das estruturas comprometidas”.

 

Orçamento

De acordo com o presidente do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), Joel Kruger, é importante um planejamento orçamentário a longo prazo, pois há “falta de manutenção preventiva e corretiva”. O presidente da Sinduscon, João Bosco Ribeiro, pontuou a necessidade de olhar para estruturas do mesmo tipo no DF. “Em relatórios feitos durante a Copa do Mundo, destacávamos viadutos e a Ponte do Bragueto, no Lago Norte, sobre o perigo”, denunciou.

 

Relatório aponta o perigo

 

Estudo feito pelo TCDF, em 2011, apontava a necessidade de reparos urgente em cima da Galeria dos Estados e no viaduto do outro lado do local do acidente ocorrido ontem. Outras seis edificações estavam na mesma situação, segundo o tribunal

 

O desabamento do viaduto na DF-002 sobre a Galeria dos Estados era uma possibilidade conhecida pelo poder público. Em 2012, o Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) alertou sobre a necessidade urgente de reparos e manutenção. O documento orientou que a obra fosse feita não só em cima da Galeria dos Estados, como também no viaduto sobre a avenida S2, no outro lado do local do acidente ocorrido ontem. Seis anos depois, a situação apontada pelo relatório persistiu nas edificações do Distrito Federal e, na análise de especialistas, ficou mais grave por causa do aumento do uso das vias causado pelo crescimento do fluxo de pessoas e carros.

 

A auditoria do TCDF mostrou que as edificações públicas estavam em precário estado de conservação e que não era possível saber de fato quanto o governo gastou em manutenção. Além disso, denunciou a falta de cuidado estatal com as construções públicas. “A atividade de manutenção das edificações públicas do DF é realizada de maneira improvisada e casual e não garante a integridade das edificações públicas”, analisa o documento.

 

Seis anos depois da auditoria, os dois governos que comandaram o Distrito Federal nesse período — o de Rodrigo Rollemberg e Agnelo Queiroz — mantiveram a prática de não conservar os espaços públicos. Das 13 edificações apontadas pelo relatório como as mais críticas, em sete, os técnicos pediam reparos urgentes. Além do viaduto do acidente, estão na lista de urgência a Ponte do Bragueto, no Lago Norte; os viadutos do Eixo L entre as entrequadras 203/204 Sul e 215/216 Sul, o viaduto sobre a N2, ao lado do Conjunto Nacional e o estacionamento em frente ao mesmo shopping.

 

Pouco mudou

Na análise do especialista em infraestrutura e manutenção predial e professor da Universidade Católica de Brasília (UCB) Li Chong Lee Bacelar,  da lista das 13 edificações vistoriadas pelo TCDF, nenhuma passou por conservação adequada ou reforma substancial. A convite do Correio, o especialista percorreu as construções que aparecem no relatório. “Muita coisa não mudou desde a auditoria em termos de ação. Em contrapartida, o tráfego aumentou em volume, isso agrava a situação porque são carregamentos não supostos no cálculo original”, concluiu.

 

De acordo com Bacelar, todas as estruturas precisam de um plano de manutenção para a vida útil, que vai das vistorias às intervenções mecânicas mais complexas. Só com esse planejamento é possível se manter estrutura segura, utilizável e próxima ao que era originalmente. “Não ter recursos não justifica não ter sequer um plano de manutenção”, afirmou. Segundo ele, a prova de que as ações estatais não foram feitas é que, mesmo nas estruturas em que foi feito algum reparo, já são necessárias novas vistorias pois há problemas aparentes.

 

Procurado pelo Correio, o GDF não soube precisar quais manutenções foram feitas nos equipamentos públicos desde a publicação do relatório do TCDF. O governador Rodrigo Rollemberg comentou que sabia da situação do viaduto do acidente e de outros espalhados pela capital. Segundo ele, o GDF já havia feito reparos em oito estruturas da área central de Brasília, conforme o sugerido pelo TCDF. Ao todo, foram gastos R$ 67,7 milhões nessas obras. “Priorizamos os da Rodoviária (do Plano Piloto), em razão do enorme movimento”, destacou. “Sabíamos, pelo relatório do TCDF, que o viaduto precisava de reparos e manutenção, como os demais. As obras que recuperamos também eram urgentes”, acrescentou.

 

Radiografia

 

Confira como estão as outras 12 edificações apontadas como preocupantes pelo TCDF em relatório de 2011. O Correio foi a todas com o especialista  Li Chong Lee Bacelar.

 

Ponte Honestino Guimarães

» Li Chong Lee Bacelar aponta alguns problemas na estrutura. Destaca a deterioração e a falta de reparos. É preciso, segundo ele, fazer análise profunda e acompanhar mais frequentemente o local.

 

Viaduto do EIXO L (215/216)

» No viaduto das tesourinhas, alguns problemas graves foram detectados pelo especialista. O guarda-corpo tem a estrutura completamente comprometida e há risco de desabamento, segundo Bacelar.

 

Viaduto do Eixo W (115/116)

» Os problemas são semelhantes aos das quadras vizinhas (215 e 216). Diversas partes da estrutura metálica estão expostas. “Aqui também pode haver desabamento do guarda-corpo”, aponta Bacelar.

 

Passarela de pedestres (15 e 16 Norte)

» Permanece carente de reparos. O especialista destaca uma rachadura na altura do Eixão. Isso, segundo ele, é um indício de que a estrutura está prejudicada e pode causar desabamentos.

 

Viaduto DF 002 

(sobre a via S2)

» No Eixão, o viaduto que passa pela via S2 recebeu reparos 

nos últimos anos, mas a obra já mostra problemas, que indicam que o trabalho não 

foi feito como deveria.

 

Ponte do Bragueto

» Segundo o especialista Li Chong Lee Bacelar,  há diversos pontos problemáticos na estrutura. Os diversos remendos feitos na via, por exemplo, acrescentam riscos de algum acidente ocorrer.

 

Viaduto do Eixo L (215/216 Sul)

» Bacelar também identificou alguns danos na estrutura. “É como se houvesse uma ferida na ponte, é o que há aqui, com o tempo isso só vai crescer. Foi assim que começou na Galeria dos Estados.”

 

Viaduto sobre N2 

(ao lado do Conjunto Nacional)

» Ao lado do Conjunto Nacional, preocupam rachaduras expostas no próprio asfalto da via. Além disso, é possível ver danos provocados na parte externa da estrutura.

 

Estacionamento em frente ao Conjunto Nacional

» Um dos locais com menos problemas detectados pelo especialista, tem alguns buracos na via que passa ao lado (talvez por falta de qualidade no material) e não oferece maiores riscos.

 

Viaduto do Eixo L (203/204 Sul)

» Um dos que mais preocuparam o especialista. Boa parte da estrutura está corroída e, ao longo do tempo, a situação tende a piorar caso não sejam tomadas medidas rápidas para resolução.

 

Viaduto sobre o Buraco do Tatu sentido Norte/Sul

» O especialista detectou problemas causados por lodo, por exemplo, além de rachaduras e afloramentos. Há risco também de queda de placas mal fixadas no teto da estrutura.

 

Ponte das Garças

» Também há problemas nas estruturas, como algumas rachaduras. Elas são indício de que a estrutura está trabalhando mais do que deveria e, com o tempo, podem causar algum dano mais sério.

 

Galeria dos Estados vive decadência

Um dos mais tradicionais pontos comerciais de Brasília nos anos 1970 e 1980, espaço é o retrato do abandono da área central. Sem manutenção da estrutura e com fuga dos clientes, 19 das 80 lojas estão fechadas

“Gostaria que se ficasse no que foi concebido, quer dizer, dentro desses parâmetros, desses limites, e que fossem realizados todos aqueles complementos visando à humanização da cidade. Nesse sentido, há casos que têm de ser encarados de frente e de forma decisiva. Primeiro, o caminhamento de pedestres é uma necessidade. (...) Esse caminhamento de pedestres está desarticulado, segmentado. Que se procure a maneira mais racional, mais simples, sem grandes artifícios, de conectá-los, para que o pedestre possa percorrer, caminhar e circular de um setor da cidade para o outro, com a devida tranquilidade e segurança.”

 

Lucio Costa, no I Seminário de Estudos dos Problemas Urbanos de Brasília, Senado Federal, agosto de 1974

 

Comerciantes da Galeria dos Estados — espaço com 80 lojas subterrâneas que liga os setores Comercial Sul (SCS) e Bancário Sul (SBS) — estão apreensivos com o futuro do centro comercial após o desabamento de parte do viaduto no Eixão Sul. A parte da estrutura que caiu ontem ficava sobre a área externa da galeria, que, antes do acidente, já sofria com um histórico de degradação. Nem a instalação de uma estação do Metrô trouxe os clientes de volta ao local.

 

A iluminação precária, a sujeira e as pichações evidenciam o abandono da passagem que liga os setores Comercial Sul e Bancário Sul, sob o Eixão 

 

O abandono da Galeria dos Estados é evidenciado pelos pisos quebrados, pela iluminação precária e pela falta de segurança. Lojistas temem que, com a repercussão do desabamento e o fechamento parcial do Eixão e adjacências para obras, o movimento diminua ainda mais. Dezenove lojas estão fechadas. Ainda não se sabe se o restante será interditado temporariamente, em função da reforma. O isolamento da área pode significar um golpe letal no comércio inaugurado há 41 anos.

 

Dono de uma loja de sapatos que funciona há 18 anos no espaço, Luiz Gonzaga de Freitas, 67, acredita que a queda do viaduto é o ápice de anos de descaso. “É mais uma soma do desleixo total com a região. O que ocorreu poderia ser ainda mais grave se atingisse a área das lojas. Agora, vamos ficar com o prejuízo por conta da interdição de um trecho. Se o movimento já estava ruim, ficará pior”, reclama.

 

O comerciante Arthur Souza, 47 anos, teme o mesmo. “As pessoas vão ficar com medo de passar por aqui”, lamenta. A loja de Arthur chegou a ter seis funcionários. Hoje, ele e a mulher trabalham sozinhos. “Ali (sob o viaduto) se vê infiltrações. Era para ter sido tomada alguma providência antes. O que queremos agora é que o governo tenha mais zelo com a Galeria dos Estados”, cobra.

 

Desde o auge da galeria, no fim dos anos 1970 e na década de 1980, diversos governos prometeram revitalizações no local. Um dos últimos projetos destacava a reforma do espaço e a licitação das lojas. Não saiu do papel. A Administração Regional de Brasília, responsável pelo local,  admite que são necessárias reformas estruturais, mas aguarda a liberação orçamentária para as obras. Ou seja, não há dinheiro nem prazo.

 

Sem manutenção e segurança: fiação exposta, lâmpadas, piso, bancos e banheiros quebrados 

 

Só na lembrança

Ao longo dos 28 anos que como engraxate na Galeria dos Estados, Isac de Matos, 60 anos, viu a passagem subterrânea de todas as formas. O horário do almoço era o de maior movimento e formava-se até fila de espera para o atendimento. Antes, ele engraxava 35 pares de sapatos diariamente. Atualmente, a média é de 10 serviços.

 

“Aqui era o local oficial de passagem do brasiliense. Quando cheguei em Brasília vindo de Presidente Prudente (SP), o espaço ainda era bem cuidado, mas o movimento foi caindo com o tempo e com isso também se foi o cuidado que o governo tinha com local. Quando o Metrô chegou, pensamos que ia melhorar, mas não foi o que aconteceu”, comenta.

 

Hoje, entre as 50 lojas abertas na Galeria dos Estados, há salões de beleza, lojas de vestuário, papelarias, lanchonetes, lotérica, entre outras. O restaurante Floresta, único comércio atingido pela queda do viaduto, fica sob o Eixão,  bem no meio da galeria. O dono não sabe quando nem se terá condições de reabrir o negócio, pois depende das obras na estrutura que desabou.

 

Promessas

As lojas da Galeria dos Estados estão irregulares. Em 2012, a Administração de Brasília anunciou a pretensão de licitar os imóveis. O processo licitatório estaria sendo analisado por uma equipe técnica, que divulgaria o edital com as regras para participar da concorrência. Mas o processo parou, assim como tantas outras de revitalização do espaço.

 

No ano seguinte, por exemplo, a Administração de Brasília anunciou um projeto que incluía a licitação das lojas. As obras começariam pela recuperação do viaduto, responsabilidade do DER-DF e, em seguida, continuariam na parte onde está a Galeria dos Estados, inclusive com a construção de uma praça na área central e, se possível, com a colocação de um elevador, em uma parceria com o Banco do Brasil.

 

Nada foi feito. Inclusive a obra no viaduto, o mesmo que caiu ontem.

 

Planos de ocupação

 

Desde 2002, a Galeria dos Estados passou a ser palco de manifestações culturais. A Makossa, festa que reúne ritmos da cultura negra, enchia o local durante as noites, ao menos quatro vezes ao ano, período em que é realizada. “A ideia era que o baile trouxesse vida ao local”, ressalta Chicco Aquino, um dos produtores do projeto.

 

O presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (Fecomércio-DF), Adelmir Santanna, defende que o caminho é estimular negócios na galeria. “É necessário descobrir efetivamente qual a vocação do local e a tendência do que pode ser consumido ali”, explica.

 

“Abandono ilimitado”

Para o mestre em arquitetura e urbanismo Frederico Flósculo, da Universidade de Brasília (UnB), ainda inexistem estratégias para evitar que alguns espaços de Brasília se deteriorem com o tempo. “O abandono não está limitado à Galeria dos Estados. São dezenas de exemplos espalhados pelo DF, com praças, mobiliários e prédios que poderiam ser melhorados com apoio das autoridades, tendo a comunidade como um braço”, pondera.

 

O especialista acredita que uma solução viável para o espaço seria a criação de uma equipe de agentes públicos, incluindo arquitetos e urbanistas. “Existe a necessidade dessa estrutura para atuar em toda a cidade para identificar aqueles espaços que tem necessidade de intervenção, seguindo a pauta de comerciantes e moradores. A Galeria dos Estados poderia ser usada para esse projeto.”

Memória: Espaço tradicional

 

A passagem subterrânea entre o Setor Comercial e a parte alta do Setor Bancário Sul teve sua estrutura concluída com o Eixo Rodoviário (o Eixão), antes da inauguração da cidade. Mas, nos primeiros dez anos, permaneceu abandonada.

 

A Galeria dos Estados, só ficou pronta e foi aberta ao público na segunda metade dos anos 1970. Logo se tornou um ponto de encontro dos brasilienses, que enchiam o espaço inclusive à noite e nos fins de semana, quando os setores próximos ficavam desertos.

 

Na área aberta, à sombra do Eixão, chegaram a funcionar três restaurantes com relativo sucesso, além de 80 lojas. Inicialmente, havia uma para cada unidade da Federação expor artesanato e outros produtos regionais. Algumas embaixadas também ocupavam pontos comerciais com a mesma finalidade.

 

A galeria começou a entrar em decadência nos anos 1990, com a falta de manutenção do espaço, a crescente violência e a forte concorrência dos shoppings.

 

Motoristas vão ter rotina alterada

 

A capital federal viveu uma terça-feira de caos no trânsito. Os reflexos no tráfego da cidade começaram a aparecer logo após o desabamento de parte do viaduto no Eixão Sul. A avenida é fundamental para a mobilidade do Distrito Federal. Com o fechamento das seis pistas da via, quem passou pela área central de Brasília enfrentou longos congestionamentos e motoristas perdidos em busca de caminhos alternativos.

 

Engarrafamento no acesso ao Eixão: esse deve ser o cenário por meses 

 

Só na manhã de hoje o governo vai decidir o trecho do Eixão Sul que permanecerá interditado para limpeza da área e a realização das obras. A circulação de carros nos Eixinhos Leste e Oeste, perto da Galeria dos Estados, permanece proibida, sem previsão de retomar a normalidade, pois depende da conclusão do reparo da estrutura que caiu. Técnicos falam em até seis meses.

 

O Departamento de Estradas de Rodagem (DER-DF) informou que, a princípio, o Eixão ficará interditado no sentido norte-sul, da entrada do Buraco do Tatu até a altura do Hospital de Base. O departamento afirmou, em nota, que elabora um projeto de desvios que permita diminuir os impactos. Não será possível passar por baixo da Rodoviária do Plano Piloto. Os demais trajetos permanecerão liberados.

 

A volta para casa ontem ficou complicada e o congestionamento durou mais de três horas no Eixo Monumental — via que cruza o Eixão e se tornou a principal alternativa para deslocamento no centro do Plano Piloto. O Metrô-DF estendeu em uma hora o horário de pico. Até as 20h30, 23 trens circularam. Comumente, são 20. Apesar da proximidade com o acidente, a Estação Galeria permanece funcionando normalmente.

 

Prevenção

O taxista Evoney Barbosa da Silva, 66 anos, conta que vai precisar mudar a rotina de trabalho a partir de hoje. Ele chegava ao ponto de táxi por volta das 8h, mas, agora, chegará só às 10h. “Moro no Riacho Fundo e preciso pegar o Eixão para chegar ao trabalho. Tenho certeza de que todos os pontos de táxi da cidade vão estar congestionados, então será melhor me prevenir”, comentou.

 

O servidor José Carlos Menezes, 64 anos, enfrenta uma rotina extensa de trânsito diariamente. Ele mora no Guará e sai de casa todos os dias às 8h. Primeiro, deixa a mulher no Setor de Diversões Sul, para seguir ao trabalho, na Esplanada dos Ministérios. Ele passava sempre pelo viaduto da Galeria dos Estados. Agora, vai precisar sair mais cedo. “Vou mudar meu trajeto e tentar ir pela L2 Sul. Não sei como vou fazer na volta para casa. Acho que todas as opções de caminho vão estar congestionadas”, observou.

 

Eixo Capital: minutos que pouparam vidas e o governo Rollemberg

 

Foram 30 minutos que salvaram vidas. Esta é a avaliação de integrantes do governo Rollemberg (PSB) sobre o desabamento do viaduto em cima da Galeria dos Estados. O incidente ocorreu às 11h45, pouco antes do horário de rush, quando motoristas enfrentam o trânsito naquela região, tanto no Eixão quanto embaixo do empreendimento ou no restaurante na região. Fosse um pouco mais tarde, muitas vidas poderiam ter sido perdidas. Com responsabilidade ou não, Rollemberg teria encerrado ontem a sua chance de reeleição. Passaria os próximos meses tentando contornar uma crise. O desgaste foi grande pela omissão dos órgãos públicos em atender ao alerta do Tribunal de Contas do DF que apontou o risco de um desgaste na obra concluída há 58 anos.

 

Tensão e piada

Rodrigo Rollemberg estava abatido com o episódio. Reagiu rápido ao enfrentar o público e a imprensa, dirigindo-se imediatamente para a área atingida pelo desabamento. Mas as vaias e os questionamentos o constrangeram. Na coletiva, mais tarde, o governador demonstrou tensão. Enquanto isso, pipocaram memes nas redes sociais explorando o incidente.

 

 

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  • Foto: Breno Fortes/CB/D.A Press
  • Infográfico sobre a queda do viaduto da galeria dos estados em Brasília em 2018
    Infográfico sobre a queda do viaduto da galeria dos estados em Brasília em 2018 Foto: Editoria de Arte/CB/D.A Press
  • Infográfico sobre a queda do viaduto da galeria dos estados em Brasília em 2018
    Infográfico sobre a queda do viaduto da galeria dos estados em Brasília em 2018 Foto: Editoria de Arte/CB/D.A Press
  • Governador Rodrigo Rollemberg visita local da queda do viaduto sobre a Galeria dos Estados em 2018
    Governador Rodrigo Rollemberg visita local da queda do viaduto sobre a Galeria dos Estados em 2018 Foto: Minervino Junior/CB/D.A Press
  • Galeria dos Estados
    Galeria dos Estados Foto: Minervino Junior/CB/D.A Press
  • Fiação exposta na Galeria dos Estados
    Fiação exposta na Galeria dos Estados Foto: Minervino Junior/CB/D.A Press
  • Acesso ao Eixão Sul
    Acesso ao Eixão Sul Foto: Antonio Cunha/CB/D.A Press

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