Correio Braziliense
postado em 06/04/2020 04:35
Os efeitos severos das ações de contingência contra a disseminação do coronavírus na economia do Distrito Federal preocupam o setor produtivo e o Executivo local. A estimativa é de que a crise causada pela doença provoque quedas expressivas na arrecadação tributária e no faturamento de empresas, com impactos diretos em toda a cadeia da capital federal. Economistas ouvidos pelo Correio destacam a necessidade de ações fortes por parte do Estado em busca de soluções para mitigar os danos e criar um ambiente que propicie a retomada depois do período de isolamento imposto pelos riscos de contágio. De acordo com empresários, rever processos e buscar adequações, como também ressaltam os especialistas, são fundamentais para sobreviver em meio à situação adversa.
Estudo feito pela Secretaria de Economia estimou o impacto da crise do coronavírus na arrecadação do DF. A expectativa é de que a perda na receita anual vinda do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) seja cerca de R$ 1 bilhão. Além disso, a redução dos valores provenientes do Imposto Sobre Serviços (ISS) deve ser de R$ 183 milhões.
A análise do cenário fez com que o governador Ibaneis Rocha (MDB) decretasse, com o aval da Câmara Legislativa, estado de calamidade pública no DF. Com isso, o Executivo não precisa seguir à risca as metas fiscais e o empenho previstos no Orçamento e na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Assim, é possível fazer ajustes e garantir que medidas urgentes sejam tomadas de forma mais rápida.
Segundo Ibaneis, o governo prepara, com cuidado, um projeto, desenvolvido com apoio do setor produtivo, para auxiliar a economia local. “Estamos fazendo um estudo muito bem feito, criando um fundo garantidor, porque nós queremos socorrer as empresas para evitar demissão em massa e quebra dos negócios. Essa crise vai passar e as empresas precisam estar vivas para voltarem a crescer. Estamos ajudando todos os setores e vamos ajudar cada vez mais”, declarou em entrevista ao programa CB Poder, parceria do Correio com a TV Brasília.
O secretário de Economia, André Clemente, adiantou que o GDF encaminhará, em breve, à Câmara Legislativa, um projeto de lei para suspender inscrições de empresas na dívida ativa durante a calamidade.
Ele reconhece que, diante da situação, será necessário rever prioridades do governo. Clemente assegura, também, que a equipe econômica está em constante diálogo com as entidades representativas do setor produtivo para fornecer orientações e encontrar as melhores ações (veja Medidas) em busca de soluções.
No sábado, o governo publicou, em edição extra do Diário Oficial do DF, a prorrogação do pagamento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e do Imposto sobre Serviços (ISS) para contribuintes de empresas que se enquadram no Simples Nacional. Esse tipo de regime tributário é específico para os pequenos negócios, e boa parte dos negócios da capital federal se vale dele.
Para socorrer os empresários, uma das primeiras medidas anunciadas pelo governo foi a abertura de linhas de crédito, com taxas menores e carência, para o setor produtivo no Banco de Brasília (BRB). A intenção é de que os valores oferecidos, de mais de R$ 1 bilhão, possam auxiliar empreendedores a manter os negócios vivos durante o período da pandemia.
O economista José Luiz Pagnussat, mestre pela Universidade de Brasília (UnB), afirma que a oferta de créditos com juros baixos e carência serão fundamentais para auxiliar a economia neste momento. “Tem sido uma preocupação que a taxa de juros nos grandes bancos tenha aumentado no Brasil. O DF tem o suporte do BRB, que pode ser uma ferramenta para promover essas medidas”, esclarece.
O especialista destaca, no entanto, que as linhas de créditos com essas condições terão de ser mantidas mesmo depois do período de isolamento, momento em que empresários precisarão de capital para estimular os negócios. “O depois vai ser muito importante para financiar a retomada. Será necessário crédito de custeio para comprar o que for preciso e viabilizar o retorno. Todo mundo estará com a corda no pescoço.”
O papel do governo, aponta Pagnussat, é também contribuir para que informações e orientações econômicas cheguem para empresários e para a própria população. “O Estado precisa mostrar para as pessoas como elas podem contribuir, oferecer opções, porque a saúde financeira dos negócios e da economia interessa a todos”, conclui.
César Bergo, presidente do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF), avalia que a primeira prioridade do governo deve ser o cuidado com a saúde, o que possibilitará outras ações de apoio. “À medida que se consiga um cenário menos crítico na saúde, o Executivo pode oferecer medidas para reduzir os problemas nos setores mais prejudicados, como oferecer prazo maior para pagamentos e pacotes de auxílios para as áreas mais dramáticas.”
Ele pondera, porém, que as ações em todas as áreas têm de ser rápidas. “O Distrito Federal está à frente de outros estados em muitos indicadores. É preciso estar sempre um passo adiante. As medidas proativas ajudam muito”, recomenda. Planejamento, acrescenta, também é fundamental. “A crise não vai durar para sempre. Empresas e governo devem calcular perdas e estabelecer o que pode ser feito. Muita coisa vai mudar. Eu acredito que pode haver um caminho depois da pandemia e que este é um momento para rever processos e se reestruturar para voltar em condições de crescimento depois.”
Preocupação
O presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Distrito Federal (Fecomércio-DF), Francisco Maia, reconhece que o governo tem ouvido os representantes dos segmentos. “De fato, o diálogo está aberto. O governo foi muito sensível em relação às atividades que poderiam voltar a funcionar por ter menos pessoas e contato. Com isso, conseguimos a reabertura de feiras e de lojas de conveniência”, frisa.
Porém, a grande preocupação, salienta Maia, são com os ramos em que não há expectativa de retorno, para os quais o impacto do isolamento deve ser maior. “Estamos fazendo pesquisas diárias para mapear quais segmentos estão com problemas mais graves para que possamos ajudá-los e facilitar este momento”, afirma. “Com a ajuda do governo, temos de encontrar novos modelos para sustentar esses negócios.” A flexibilização para o pagamento de impostos é um dos pontos levantados por ele. “É uma situação muito difícil. Temos uma pesquisa que indica que 67% dos empresários não vão conseguir pagar os tributos neste mês de abril.”
Segundo o estudo feito pela Secretaria de Economia, o ramo mais afetado pela crise, em números absolutos, crise será o de bares e restaurantes, impedidos de abrir para o público por causa dos riscos de transmissão do coronavírus. No pior cenário, as perdas anuais podem chegar a quase R$ 2 bilhões.
Jael Silva, presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Brasília (Sindhobar), acredita que as perdas podem ser até mais drásticas. “Houve a prorrogação do decreto de isolamento e isso vai ter mais impacto. Devemos conseguir manter só cerca de 15% do faturamento, e isso por causa de empresários resilientes, que estão se reinventando e buscando formas de funcionar por delivery, por exemplo”, avalia.
Preocupado com a sobrevivência das empresas do ramo, ele pede mais apoio do governo para que bares e restaurantes consigam ter força para suportar a pandemia. “Temos de estudar uma possibilidade de rever essa situação. É preciso uma subvenção do Estado para socorrer essas empresas, que, se ficarem 45 dias fechadas, não resistem”, argumenta.
R$ 1 bilhão
Perda prevista na arrecadação com Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)
R$ 183,7 milhões
Queda estimada da receita com o Imposto Sobre Serviços (ISS)
R$ 2 bilhões
Estimativa de perda anual do setor de bares e comércios no pior cenário, segundo avaliação do GDF
Medidas
Confira ações tomadas pelo GDF para amenizar o impacto da crise na economia local
Linhas de crédito
» O Banco de Brasília (BRB) lançou opções de financiamento e investimentos com condições especiais para ajudar empresários do DF a lidar com as dificuldades durante a pandemia.
Novas condições
» O Executivo propôs facilitação para o programa de microcrédito para empreendedores Prospera. O governo suspendeu o pagamento das parcelas durante a vigência das medidas de isolamentos e por mais dois meses após o fim do processo. Além disso, a taxa de juros foi reduzida.
Estado de calamidade
» Com aprovação da Câmara Legislativa, o GDF decretou estado de calamidade na capital federal. Com isso, o Executivo fica desobrigado a cumprir alguns limites da Lei de Responsabilidade Fiscal e tem mais agilidade para alterar o orçamento e bancar medidas.
Dívida ativa
» O governo vai encaminhar à Câmara Legislativa projeto de lei para suspender a inscrição de empresas na dívida ativa enquanto durar o estado de calamidade.
Sem cortes
» Por decisão do governo, a Companhia Energética de Brasília (CEB) suspendeu cortes por inadimplência e a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) adiou reajuste de tarifas.
Benefícios
» O GDF criou o Bolsa Alimentação, benefício financeiro provisório válido durante o período de suspensão das aulas, para bancar refeições de alunos carentes. Segundo Ibaneis, o Executivo também fará programa semelhante ao do governo federal para auxiliar trabalhadores, com valor de R$ 600.
Prorrogação
» Atendendo a pedido do setor produtivo, o governo prorrogou o pagamento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e do Imposto sobre Serviços (ISS) para contribuintes de empresas que se enquadram no Simples Nacional
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