Cidades

Crônica da Cidade

>> (cartas: SIG, Quadra 2, Lote 340 / CEP 70.610-901)

Correio Braziliense
postado em 30/04/2020 04:06

Dad Squarisi


As colunas que Dad Squarisi publica no Correio são minicursos inteligentes, ilustrados, bem-humorados e leves. Você se diverte e aprende. Não há método pedagógico mais eficiente. Ela contribuiu para alfabetizar, desasnar e lapidar várias gerações de brasilienses no trato com a língua portuguesa. Se tenho alguma dúvida insanável, ligo para a Dad e ela resolve sempre da maneira mais gentil. Dad é elegante no vestir, no escrever e no viver.

Sou um repórter distraído, preciso me concentrar para não cometer incorreções. Costumo editar as colunas da Dad e, confesso, sinto uma ponta de alegria quando encontro um erro, pois, na minha cabeça, ela nunca se engana. Mas Dad sorri e não tem nenhuma dificuldade em admitir que também comete deslizes e desatenções. O erro a humaniza.

Tenho uma teoria sobre a cabeleira desagulhada da Dad, uma de suas marcas registradas. Sempre imaginei que ela tinha os cabelos arrepiados de tanto se espantar com os solecismos, as incongruências, as declinações capengas, as vírgulas indevidas e outros equívocos crassos que lê ou ouve. A cada erro, o cabelo dela foi se espetando até forjar o estilo Dad de madeixas rebeldes, tão original e que lhe cai tão bem.

Dad é uma das poucas celebridades do jornalismo impresso. Certa vez, ela passou por uma blitz do Detran, um policial a identificou, entabulou uma consulta sobre dúvidas gramaticais pra lá de Marrakech que provocou um engarrafamento de trânsito. Em outra ocasião, uma excelência flagrada em deslize contra a norma culta ficou brava e chamou Dad de arrogante. Só faltou alegar ter foro privilegiado. A pendência gramatical quase foi parar no STF. Dad permaneceu inarredável no senso de humor.

Todavia, a gente só conhece mesmo uma pessoa de verdade em uma situação extrema, em uma situação-limite. Além dos ensinamentos sobre a língua portuguesa, a maior lição que Dad nos deu foi de vida. Em 2016, descobriu que estava com câncer na medula. Dad não se abalou, submeteu-se a uma cirurgia delicada para implantação de transplante e permaneceu internada durante oito meses no Hospital Albert Einstein, em São Paulo.

Enfrentou tudo com coragem, serenidade, humildade e dignidade comovedoras. Em vez de lamuriar-se, escreveu um livro sobre língua portuguesa, dois livros infantis e organizou outro sobre a história do Hospital Albert Einstein. A doença não a impediu de viver plenamente a vida e de exercer a vocação com prazer. A fé de Dad é capaz de mover montanhas.

Ela publicou uma mensagem nas redes sociais na qual compara o ofício do médico ao do professor. Ambos não desistem mesmo diante de uma sentença de morte decretada nos exames ou de fracasso inapelável no boletim das notas. Se os fatos desmentem a sua fé, pior para os fatos:“Os médicos e os professores têm dois denominadores comuns. O primeiro: eles salvam vidas; nós salvamos o futuro.O segundo: eles não desistem nem diante das evidências; nós também não desistimos nunca.  Graças ao nosso esforço, jovens ocuparão lugares de destaque, em vez de celas desumanas, superlotadas e sem saída”.

Dad venceu a fase mais dura da travessia e voltou a trabalhar, para a nossa alegria. Hoje, ela faz aniversário, e eu gostaria de brindar a sua presença delicada, firme, competente, elegante e terna.

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Tags