Correio Braziliense
postado em 03/05/2020 04:15
Mesmo com a reabertura de parte do comércio adiada em uma semana, a decisão ainda gera incertezas. Ao mesmo tempo em que empresários sofrem prejuízos financeiros, projeções mostram que a curva de infecções e de mortes pela Covid-19 no DF ainda é ascendente. Enquanto entidades do setor e o Governo do Distrito Federal (GDF) estudam planos para uma retomada gradual e cercada de condições indispensáveis, trabalhadores do ramo e pesquisadores temem as consequências da medida.
Joselândia Nunes, 49 anos, gerencia uma rede de cosméticos no Sudoeste. A loja foi fechada em 6 de abril, mas retornou no dia seguinte, em horário reduzido. Apesar da queda nos lucros durante a pandemia, o estabelecimento aderiu ao serviço de entrega. “Espero que o comércio possa reabrir, claro que tomando os devidos cuidados. Aqui na loja não dispensamos o uso do álcool em gel nem das máscaras. Sabemos quanto são importantes. A esperança é de que tudo volte ao normal”, disse.
Mesmo com a pressão de alguns setores para a retomada, o movimento não deve ser o mesmo. O índice que calcula a Intenção de Consumo das Famílias (ICF) atingiu o segundo menor nível da série histórica do DF — que começou em janeiro de 2010: 86,4 pontos. A taxa só foi menor em julho de 2016, quando o indicador ficou em 84,2. Feito pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Distrito Federal (Fecomércio/DF), o levantamento saiu na semana passada e contou com a participação de cerca de 600 famílias, entrevistadas nos últimos 10 dias de março.
O ICF varia de zero a 200, conforme a percepção de insatisfação (zero a 100 pontos) ou de satisfação (100 a 200) dos entrevistados. Os temas das perguntas envolvem emprego, renda e capacidade de consumo. O presidente da Fecomércio/DF, Francisco Maia, avalia que, diante do cenário socioeconômico atual, o mais indicado é que a abertura seja gradativa. “Todo mundo está com medo de sair de casa, e mais gente está deixando de comprar. Os empresários sabem disso. Reabrir o comércio não significa que teremos mais vendas. Mas, aos poucos, elas vão crescendo”, acredita.
Para o professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB) Carlos Alberto Ramos, a situação de outros países deve servir como exemplo. Ele lembrou que, em vários deles, as quarentenas foram rígidas e só flexibilizadas após a queda no número de infecções. “Se esse processo se sair mal (no DF), podemos ter o que vimos na Itália, Espanha, Inglaterra. O risco é ter de voltar atrás, porque houve descontrole (da situação)”, comenta. “A reabertura pode ser um tiro no pé? Sim, pois muitas pessoas estão com medo de sair e podem se sentir inseguras no sentido de não planejar a longo prazo. Mas, se der certo, ela pode gerar um círculo virtuoso. Não há uma receita, mas é preciso estar seguro (da decisão), pois a vida das pessoas está em jogo”, completa Carlos Alberto.
Reunião
Vendedora de uma loja de alimentos orgânicos, Poliana de Oliveira, 18, é favorável à reabertura gradual do comércio. “Para mim, bares, restaurantes e academias têm maior risco de contaminação. Eles deveriam voltar às atividades só mais para a frente”, defende. Com a possibilidade de os estabelecimentos reabrirem em 11 de maio, Poliana se diz esperançosa, mas admite sentir medo. “A minha expectativa é de que possamos alcançar a meta das vendas. Queremos algo que não piore a economia, mas também devemos nos atentar à saúde. Muitos falam que não houve pico da pandemia, mas acho que o número de pessoas infectadas deve crescer”, relata.
A situação de bares e restaurantes é polêmica. Face às demissões e à diminuição dos lucros, representantes do setor tentam negociar com o governo local, mas não há previsão de que esses estabelecimentos entrem no grupo de serviços liberados. O presidente do Sindicato Patronal de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Brasília (Sindhobar), Jael Silva, está preocupado com a falta de respostas do governo quanto à reabertura dos estabelecimentos. “Estávamos criando expectativa. Muitos empresários readaptaram os ambientes para receber os clientes, com precaução. O que queremos, enquanto sindicato, é ter um diálogo mais próximo com as autoridades, no sentido de termos uma data concreta e algo planejado. Não dá para ficar apenas prorrogando”, reclama.
Segundo ele, 317 empresas do ramo fecharam as portas e mais de 6 mil pessoas foram demitidas. “Precisa-se criar um auxílio para empregador e funcionário, assim como criaram aos desempregados e autônomos. Eles não têm ajuda e como se sobrevive sem receita? Não tem como”, diz.
Decreto
O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), adiou oficialmente a retomada da atividade comercial. Fechados desde 19 de março devido ao novo coronavírus, alguns setores de comércio e serviços abririam hoje. Entretanto, o chefe do Executivo decidiu adiar o prazo para 11 de maio, por meio de decreto publicado em edição extra do Diário Oficial do DF (DODF) de ontem. Um dos motivos que levou o emedebista a mudar a data foi porque 1 milhão de máscaras, que serão doadas para a população, não estavam prontas.
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