Correio Braziliense
postado em 24/05/2020 04:14
Palpite infeliz
Parece que o ministro da educação Abraham Weintraub estava sob o efeito de uma overdose de cloroquina, na fatídica reunião ministerial do dia 22 de abril, divulgada na tarde de sexta-feira. Entre outras sandices, sua excelência afirmou que odiava Brasília e que a capital era um “cancro”, uma “porcaria” que precisava acabar.
Não é só Brasília que ele despreza. Weintraub odeia a educação, os professores, os cientistas, o STF, o estado de direito e a língua portuguesa. Claro que todos nós cometemos deslizes gramaticais. Mas o ministro insiste no erro e revela pouca familiaridade com o universo da cultura. Chamou o escritor Franz Kafka de “Cafta”; grafou “paralização”, “insitada” e “imprecionante”.
Mesmo com essas evidências de poucas luzes, o ministro é alçado por parte dos colegas da imprensa à condição de suposto polemista. Talvez o eminente ministro tenha confundido Brasília com a Esplanada dos Ministérios ou, quem sabe, com o governo do qual ele faz parte.
Os forasteiros conhecem a cidade pelo que ela tem de pior: a classe política (salvo honrosas exceções). A primeira providência para quem deseja perceber Brasília para além dos estereótipos é não confundir a cidade com o que se passa na Praça dos Três Poderes.
O que transcorre por lá não é responsabilidade exclusiva dos brasilienses. A maioria das excelências que ocupam aquele espaço foi eleita pelos estados da Federação. Dos 513 deputados federais, somente oito são de Brasília; e dos 81 senadores, apenas três representam Brasília. Em política, a capital acompanha o país, para o bem e, infelizmente, para o mal.
Brasília é, profundamente, Brasil, com as suas grandezas e misérias. É a terceira metrópole do país, com 31 regiões administrativas e 3 milhões de pessoas, ultrapassou Salvador e só fica atrás de São Paulo e Rio de Janeiro.
É a cidade que mobilizou a mais alta inteligência brasileira. Brasília é a genialidade de Oscar Niemeyer, de Lucio Costa, de Burle Marx e de Athos Bulcão. E é também a cidade reinventada por Renato Russo, Hugo Rodas, Vladimir Carvalho, Claudio Santoro, Nicolas Behr, Francisco Alvim e Cássia Eller. É o Clube do Choro, o calendário floral, a proximidade com o céu, o passeio no parque da cidade, a ocupação cultural e as vias que estacionam nas nuvens.
Infelizmente, Brasília, em alguns momentos, é ocupada por representantes que não estão à altura da sua grandeza, por pessoas que encarnam a vanguarda do atraso. De qual Brasília Weintraub está falando? A do seu governo? Ao pretender atacar Brasília, ele revelou apenas a própria ignorância sobre a história do Brasil.
Brasília é uma cidade criada para que o país se livrasse de uma vez por todas do complexo de vira-lata. Quem odeia Brasília, odeia o Brasil, porque ela é a maior realização dos brasileiros. Como dizia Lucio Costa, nos momentos de desinteligência do país: o Brasil não tem vocação para a mediocridade. Nem Brasília.
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