Correio Braziliense
postado em 28/05/2020 04:06
Os dois Brasis
Passei batido pelo Dia da Imprensa, mas como a crônica é uma pauta livre, volto ao assunto. Um dos efeitos da pandemia foi a revalorização do jornalismo. Ele tornou-se essencial tanto para a nossa saúde quanto para a saúde da democracia. Temos dois Brasis: o fake e o real.
Parece-me que os dois profetas do nosso tempo foram Joseph Goebbels, o ministro da propaganda do governo da Alemanha nazista, e o escritor e semiólogo italiano Umberto Eco. Goebbels formulou o célebre lema de que é preciso repetir uma mentira 1.000 vezes até que ela se transformasse em verdade. Com a internet e com o acionamento dos robôs, essa possibilidade multiplicou-se de maneira exponencial e se transformou em uma ameaça aos regimes democráticos de todo o planeta.
Já Umberto Eco deteve-se em um dos efeitos que a propagação da ignorância provocaria. Previu ou constatou que as mídias sociais inundariam o espaço social de idiotas: “As mídias sociais deram o direito à fala a legiões de imbecis que, anteriormente, falavam só no bar, depois de uma taça de vinho, sem causar dano à coletividade. Diziam imediatamente a eles para calar a boca, enquanto agora eles têm o mesmo direito à fala que um ganhador do Prêmio Nobel”.
É por isso que assistimos à ascensão de mediocridades espetaculares. O coronavírus é uma metáfora de um país infectado pela desinformação, a mentira e a fraude. E, neste contexto, a imprensa tem cumprido um papel de fundamental importância, principalmente em tempos de pandemia. Checa, filtra, analisa, discute informações e educa. Estabelece uma barreira para as fake news.
Claro que isso incomoda e irrita os que ascenderam e sobrevivem de mentiras. Eu também discordo de várias abordagens da mídia, do Congresso Nacional ou do STF. Mas, isso não é motivo para atacar a democracia.
Se não fosse a imprensa, acreditaríamos que a covid-19 seria uma “gripezinha”. Ou que o pico da crise sanitária se daria em meados de abril. Ou que é possível retomar o trabalho sem o declínio dos casos de coronavírus. Ou que a hidroxocloroquina é uma alternativa comprovada para a cura da covid-19.
As redes sociais são uma selva selvagem, terra de ninguém, sem lei. É preciso civilizar esse território com regras de conduta e de responsabilização. A internet é uma tecnologia fantástica, que tem nos ajudado a sobreviver durante a pandemia. Mas, ao mesmo tempo, não podemos subestimar o poder que ela tem de propagar mentiras.
Na célebre reunião ministerial de 22 de abril, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou que era preciso aproveitar o fato de que, neste momento, a imprensa está com as atenções concentradas no combate ao coronavírus, para passar reformas “infralegais” no sentido de flexibilizar o sistema de proteção ambiental. A culpa é da imprensa?
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