Cidades

Crônica da Cidade

Sessão sem tarja

Correio Braziliense
postado em 04/06/2020 04:06
O STF tem sido alvo de ataques como se ele fosse culpado pela insciência e pela incapacidade do presidente para governar. Mas, se compararmos as reuniões do governo e do STF, veremos claramente a diferença. Nos encontros dos meritíssimos não existe a necessidade de usar nenhuma tarja preta para esconder ideias, palavras, expressões ou argumentos.

As sessões são transmitidas ao vivo para o país, com toda a transparência. Nenhum ministro nunca pediu para que trechos do que falou fossem interditados. Todos assumem a responsabilidade pelo que dizem.

Já na memorável reunião ministerial de 22 de abril, seria necessário usar a tarja preta não apenas para os palavrões, mas também para as propostas de destruição do meio ambiente, a ausência de preocupação com a tragédia sanitária e mesmo para os silêncios ensurdecedores das omissões em face de coisas estapafúrdias.

Durante o julgamento Mensalão, os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Levandowski travaram batalhas verbais acirradas, que fizeram tremer o chão do tribunal. O mesmo é possível dizer de Luiz Roberto Barroso e Gilmar Mendes, que se digladiaram em várias sessões. Mas o que estavam em jogo eram ideias.

É possível fazer muitas críticas ao colegiado daquela casa. No entanto, ninguém pode negar que a maioria dos ministros é terrivelmente constitucionalista. Briga por interpretações da Carta Magna. Eu também já fiquei muito irritado com decisões do tribunal.

Mas jamais sairia em passeata, durante uma pandemia, para pedir o fechamento do STF. Porque, além do risco de contaminar mais pessoas com o coronavírus, isso significa o fechamento da democracia e dos direitos do cidadão. É dupla insanidade.

O STF teve uma atuação impecavelmente firme em defesa à liberdade de expressão na ofensiva desfechada por algumas celebridades para proibir biografias não autorizadas. A liberdade de expressão saiu vitoriosa, mas ela não pode ser confundida com fake news. Fake news é crime, fraude, delito, mentira.

Parece que alguns governantes querem adotar a linguagem invertida da ficção distópica 1984, de George Orwell, e colocar de cabeça para baixo todos os valores republicanos: guerra é paz, liberdade é escravidão, ignorância é força e fake news é liberdade de expressão.

As redes sociais são uma selva selvagem, uma terra sem lei, dominada pelas fake news e pela ação de robôs. É imperioso civilizar esse território. Em uma democracia existem limites a serem respeitados. Pesquisa do Ibope revela que 90% da população aprova a regulamentação das redes sociais para combater as fake news.

A crítica pertinente ao STF é a da demora e leniência em aplicar o que reza a Constituição a atos antidemocráticos, que nos levaram a essa crise política. De omissão em omissão, os inimigos da democracia avançaram e ocuparam o território. Mas, ainda há tempo, as instituições têm de funcionar. O STF precisa ser aplaudido, e não difamado, quando defende a Constituição, sem usurpar nenhum outro Poder.

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Tags