Cidades

Comissão da CLDF pede que Corregedoria da PM apure denúncia de agressão

Um educador social de 41 anos afirma ter sido espancado por uma equipe da PMDF no Centro de Ceilândia, durante abordagem. A corporação nega, afirmando que o homem resistiu

Correio Braziliense
postado em 15/06/2020 17:27
O educador relata ter sido agredido durante abordagemA Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CDH/CLDF) solicitou a apuração sobre uma suposta abordagem policial violenta, que ocorreu no centro de Ceilândia, em 31 de maio. A vítima, um educador social de 41 anos, afirma ter sido agredido por quatro militares e autuado indevidamente por desobediência, desacato e resistência. À época, o caso foi registrado na 15ª Delegacia de Polícia (Ceilândia Centro).

Na tarde da última quarta-feira (10/6), o deputado distrital Fábio Félix (PSol),  presidente da Comissão, enviou um ofício pedindo a apuração da conduta policial à Corregedoria da Polícia Militar e também ao Núcleo de Controle da Atividade Policial do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. A denúncia está sob sigilo. 

O Correio conversou com a vítima, que relatou os detalhes da abordagem de militares do 8º Batalhão de Ceilândia. “Era por volta das 16h e tinha pouca gente na rua. Eu estava em frente à farmácia São João, no centro, quando uma viatura da Polícia Militar parou na minha frente. Um dos policiais disse: 'Vaza daí, seu filho da p*.' Nessa hora, perguntei o porquê, e eles responderam que se eu não obedecesse, iria preso”, explica. 

“Afirmei que não poderiam fazer isso, pois não tenho nenhum mandado de prisão expedido pela Justiça para limitar o meu direito de ir e vir. Não tenho nenhum problema com a lei e não cometi nenhum crime. Logo em seguida, a equipe desceu da viatura, com armas em punho. Um dos militares colocou o artefato na minha cabeça, e me mandou ficar contra a parede, de costas”, relembra.

O educador social afirmou que obedeceu a ordem, se posicionando com o rosto virado para a parede e com as mãos na cabeça. “Eles continuaram me xingando, mesmo eu sendo um homem sozinho, com um celular e a carteira no bolso. Não reagi à abordagem. Mesmo assim, um dos militares falou no meu ouvido que iria me encher de porrada. Eu respondi, afirmando que, se isso ocorresse, iria processá-los. Foi quando começaram as agressões”, diz.
 
A abordagem ocorreu no centro de Ceilândia 

A vítima disse que o policial que realizava a abordagem deu dois golpes nas  costas. "Quando comecei a cair, me deram um mata-leão e me imobilizaram no chão. Além de chutes e pontapés, um dos policiais puxou meus dois braços para trás, enquanto mantinha o pé nas minhas costas. Eu pedi, pelo amor de Deus, que parassem, porque estavam quebrando meu braço.”
 
Ainda segundo o homem, as agressões continuaram. “Depois, me jogaram dentro da viatura. Eu mostrei o hematoma no meu braço, dizendo que tinham me machucado. Um deles disse: 'Eu quero que você se fod*.' Afirmei que iria processá-los, que já era estudante de direito e conhecia meus direitos. Na delegacia, eles pararam no estacionamento e abriram o cubículo da viatura. A equipe me mandou abrir meu celular e eu questionei o motivo. Ocorreu uma nova ameaça: 'Se você não liberar o acesso, vou quebrar todos os seus dentes'. Eu me neguei”, alega.

“Já dentro da delegacia, me deixaram no canto. Pedi a um agente que eu fosse levado ao hospital, porque estava com muita dor no braço. Um dos militares aproveitou dessa situação e passou a manipular o meu braço, me causando mais dor. Nesse momento, os policiais civis me colocaram numa cela com outro preso. Fiquei ali por cerca de três horas e então, recebi atendimento médico e fui encaminhado ao Instituto de Medicina Legal (IML) para fazer o exame de corpo de delito”, acrescenta o educador. 

Versões 

Após prestar depoimento e passar pelos procedimentos médicos, a vítima foi liberada. No dia posterior, 1º de junho, ele retornou à 15ª DP para pegar a cópia do boletim de ocorrência. Dois dos policiais militares esclareceram sobre os motivos da abordagem. A versão apresentada é que a equipe tinha sido informada que dois homens tinham resistido a fiscalização de comércio do dia (31/5), chegando a agredir os fiscais. Eles usavam camisas preta e rosa.

“Em patrulhamento, visualizamos um indivíduo com as mesmas informações passadas pelos populares e que decidimos realizar a abordagem. O indivíduo se recusou, afirmando ser estudante de direito. Afirmei que isso não daria imunidade e que era para obedecer a ordem. Assim, diante da segunda recusa, houve uso da força física, forçando-o a deixá-lo na posição de segurança para realizar a abordagem. Nesse momento, o homem xingou a equipe. Por isso, recebeu voz de prisão por desacato, resistência e desobediência. Como ele resistiu novamente, mais uma vez foi necessário o uso da força física para algemá-lo”, relatou um dos policiais em depoimento.

Em nota oficial a Polícia Militar do Distrito Federal confirmou a versão apresentada pela equipe e confirmou recebimento do ofício da Comissão de Direitos Humanos da CLDF. “Na data de 31/05/2020, por volta de 16h, após camelôs terem agredido alguns fiscais da DF Legal e também danificado duas viaturas, uma da Polícia Civil e outra da DF Legal, os policiais receberam a informação de populares de que os dois autores, correm em direção à Feira do Rolo, sendo que um estava de camisa rosa e o outro de camisa preta. O policiamento foi intensificado e um cidadão de camisa preta foi abordado na CNN 1”, informa.

“Foi solicitado que ele colocasse as mão sobre a cabeça e abrisse as pernas para ser abordado. Este de imediato disse que não iria obedecer. Foi explicado que era uma ordem legal e mais uma vez resistiu, tendo xingado a equipe. O abordado recebeu voz de prisão e, em seguida, o cidadão foi conduzido à 15ª DP e apresentado à autoridade de plantão, sendo autuado em Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) por desacato, desobediência e resistência, com compromisso de apresentar-se posteriormente à Justiça. Na delegacia, os policiais foram informados que o abordado tinha passagens pela polícia”, finaliza o texto. 

Em conversa com o Correio, o educador social negou que seja vendedor ambulante ou que tivesse qualquer envolvimento na confusão durante a fiscalização da DF Legal. Além disso, frisou que tem passagens por furtos, mas que os crimes foram cometidos em 1999 e que não responde por nenhum delito na Justiça. “Eles não podem embasar o meu espancamento por algo que fiz há mais de vinte anos. Eu não sou mais essa pessoa. Eu errei, paguei e não tenho nenhum envolvimento com o crime. Não devo nada à Justiça”, destaca. 

Para Michel Platini, presidente do Centro de Defesa dos Direitos Humanos (Centro/DH), a denúncia surge em um contexto importante. “O mundo questiona a atuação das polícias nesse exato momento. A luta dessa geração é por uma polícia isonômica e que reconheça a diversidade dessa sociedade. E, em alguns lugares, as normas sofrem mudanças importantes", afirma. "Em todas as situações exigem uma atuação mais humanizada e menos preconceituosa. Oferecer um tratamento desrespeitoso por conta de uma ficha policial mostra despreparo e que alguém deseja julgar e não cuidar da segurança da sociedade, que é o papel da polícia. Todas as pessoas  têm o direito de errar e esse erro não pode ser motivador de qualquer violação de direitos.”

A reportagem entrou em contato com o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). A pasta limitou-se a informar que o ofício enviado pelo deputado Fábio Félix foi recebido pelo Núcleo de Controle da Atividade Policial. Não houve confirmação se o caso é apurado e qual é o posicionamento do MP.

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