Cidades

Ceilândia sofre com a covid-19 e lidera ranking de casos e mortes no DF

Com 423 mil moradores, a região administrativa mais populosa do Distrito Federal tem 3.624 infectados e 81 mortos. Além da densidade populacional, fatores econômicos e dificuldade em seguir as regras sanitárias impactam o aumento diário de casos na cidade

Correio Braziliense
postado em 19/06/2020 06:00
um transito na ruaA região administrativa mais populosa do Distrito Federal sofre os impactos da disseminação do novo coronavírus. Com 423 mil moradores, Ceilândia lidera o ranking das cidades com maior incidência da doença: são 3.624 infectados e 81 mortos. Além da grande população, outros fatores influenciam o crescimento acelerado da enfermidade no lugar. Especialistas alertam que a vulnerabilidade social, a baixa renda per capita e o desemprego são alguns dos fatores que resultaram na disseminação da covid-19 na cidade. Hoje, o DF chegou a 28.521 casos e 344 óbitos.

Monitoramento do Governo do Distrito Federal (GDF) mostra que Ceilândia tem uma das menores taxas de isolamento social das regiões administrativas. Levantamento divulgado ontem revela que apenas 33% dos moradores da cidade respeitam as medidas de restrição. A localidade fica atrás do Pôr do Sol (31%) e da Estrutural (26%). O Lago Norte (59%) e o Lago Sul (53%) são os que mais cumprem a orientação de permanecer em casa.

ilustração de dados

Tendo em vista o aumento de casos em Ceilândia, a Secretaria de Saúde decidiu, na semana passada, interromper a atividade comercial por três dias na cidade. Além disso, outras ações foram tomadas para combater o novo coronavírus (veja Vulnerável). Porém, após o fim da suspensão, a região registrou mais de mil casos. Em 11 de junho, quando os estabelecimentos foram reabertos, havia 2.610 infectados.

Outro fator que influencia o aumento de casos em Ceilândia é a formação de aglomerações. Trabalho da Casa Civil flagrou, em uma semana, 79 situações em que havia mais de 100 pessoas reunidas. A fiscalização ocorre diariamente. “A ideia é de, a partir da próxima semana, gerar uma listagem desses pontos de aglomeração em todo o DF para fazer uma fiscalização mais efetiva”, comentou. “O descumprimento está crescendo também no Sol Nascente. Isso é refletido no aumento de casos. Se continuar assim, a tendência é crescer”, alertou o subsecretário de Inovação da Casa Civil, Paulo Medeiros.

A Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (Pdad) da Companhia de Planejamento (Codeplan) mais recente, divulgada em 2018, mostra que Ceilândia tem a 10ª renda per capita mais baixa do DF: R$ 1.125,06. No Lago Sul, com a média de remuneração mais alta, o valor é de R$ 8.322,81. No total, são 432.927 moradores na cidade. Segundo o estudo, 40,4% da população não tinham emprego com carteira assinada.

A infectologista do Hospital Regional da Asa Norte (Hran) Ana Helena Germoglio explica que são vários fatores que podem apontar o crescimento de casos em uma região. De acordo com a médica, além da densidade populacional, existe o aglomerado familiar nas áreas de baixa renda. “É mais gente morando junto e com dificuldade de segregação. Se um da casa fica doente, é difícil que outro não adoeça”, comentou.

Outra característica que implica aumento de casos em Ceilândia, segundo a infectologista, é a necessidade do salário. “Muitas pessoas dessas cidades (de menor renda) trabalham no comércio. Elas dependem desse trabalho para a subsistência”, frisou.
 
Sobre o isolamento social em determinadas regiões administrativas, como aconteceu em Ceilândia e na Estrutural, o epidemiologista da Universidade de Brasília (UnB) Jonas Brant considera a medida ineficaz. “As pessoas têm relações em outras cidades. Por exemplo, quem mora em Ceilândia e trabalha no Plano Piloto. Como esse trabalhador vai dizer para o empregador que não vai trabalhar porque a região onde ele mora está isolada?”, questionou. O epidemiologista ainda frisou que o isolamento se torna difícil nas regiões mais vulneráveis. De acordo com dele, o ideal seria que essas pessoas recebessem amparo social e econômico, para que pudessem ficar em casa e reduzir o contato social. 
 
Jonas defende que, hoje, o que se tem para combater o coronavírus são as medidas que a ciência traz, como o isolamento social, os diagnósticos e a busca e o isolamento de pessoas que tiveram contato com infectados, quesito que o Distrito Federal demonstra fragilidade, segundo o especialista. “Além disso, é necessário medidas de amparo econômico para que o distanciamento social ocorra de maneira efetiva”, reforçou. 
 
Em relação às atividades de parques, o estudioso considera que lazer e práticas físicas são importantes nesses momentos, porém, a entrada nesses espaços deve ser controlada, para que não ocorra maior disseminação da doença. Sobre a abertura de locais fechados, como museus, o epidemiologista alerta que é um risco, porque podem ser lugares com má ventilação e com possibilidade de contato com superfícies. É difícil estar tentando trazer que a ciência tem de evidência para o controle do vírus e não perceber que a gestão não consegue incorporar essas medidas para fazer o real enfrentamento da epidemia, controlar ela e sim poder abrir com tranquilidade todas atividades econômicas”, comentou. 
 
Nas ruas de Ceilândia, o descumprimento das medidas sanitárias é frequente. Ontem, o Correio flagrou aglomerações, além da falta e do uso incorreto de máscaras na cidade. A apresentadora Elicouto Pereira, 45 anos, reconhece que muitos não seguem as restrições. “Ceilândia tem muito trabalhador, pessoas com baixa renda, que não podem ficar trancadas em casa. Como isso não acontece, o governo tem de intensificar as campanhas de conscientização”, ressaltou.

Para a atendente Kátia Emília Vieira dos Santos, 35, o aumento de casos em Ceilândia deve-se, também, à falta de cuidados. “No meu trabalho, temos placas informando que só atendemos a pessoas com máscara, porém, muitos não usam”, criticou. “Acham que tudo voltou ao normal, mas não é assim”, afirmou.
Ações do GDF em Ceilândia

» Reorganização de fluxo de atendimento de pacientes no Hospital Regional de Ceilândia (HRC), habilitando-o para atendimento de pacientes com a covid-19, incluindo 30 leitos de unidade de terapia intensiva (UTI)

» Fortalecimento da atenção primária da saúde, com ampliação de equipes de saúde da família e implementação de testes diagnósticos nas 18 Unidades Básicas de Saúde (UBS) da cidade

» Prioridade na realização de exames para pacientes da região no Laboratório Central (Lacen), possibilitando manejo mais adequado e rápido dos diagnosticados da cidade

» Utilização do aplicativo “DF contra Covid”, que permite a identificação de novos casos e acompanhamento por 14 dias por meio de aplicativo de celular para pacientes de Ceilândia e contatos próximos

» Ampliação de carga horária para 136 servidores lotados nos hospitais regionais de Ceilândia e de Brazlândia. 
Antes, os profissionais trabalhavam 20 horas semanais, mas, agora, tiveram a carga horária aumentada para 40 horas. A medida contemplou 83 servidores do HRC e 53 do Hospital Regional de Brazlândia

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