Cidades

Crônica da Cidade

A vida debaixo dos ipês

Correio Braziliense
postado em 20/06/2020 04:15
Quanto mais penso sobre Brasília, mais me admira o quanto essa cidade parece ter sido planejada em detalhes. É o caso dos milhares de ipês que, chegada a seca, começam a colorir nossa paisagem monumental. Essas árvores que nos presenteiam com flores, primeiro roxas e depois amarelas, rosas e brancas, são perfeitas para desviar nossos olhares da grama, que, nas semanas anteriores, foi se desbotando.

Meu mês preferido em Brasília é maio. Nesse mês, geralmente, o gramado entre os eixos e nos parques ainda está verde, verde, e o céu fica de um azul deslumbrante, quase sem nuvens. Sair de casa em um dia ensolarado desses, mesmo que seja rapidinho ou dentro do carro, já me enche de alegria. E é também a época em que o pôr-do-sol começa a ficar deslumbrante, a ponto de a gente dizer sem medo que se trata do mais bonito do mundo — há quem conteste, mas brasiliense que é brasiliense nem dá ouvidos.

As semanas de seca, porém, fazem o verde do chão virar algo entre o marrom e o cinza. E a beleza trazida por maio se torna ameaçada. Mas, aí, o que Brasília faz? Nos dá os ipês floridos, para que nem lembremos da existência do gramado. Vai chegando junho e a gente se depara com essas árvores. E o mais estranho é que as primeiras visões sempre me surpreendem, ano após ano, e não resisto a comentar, caso esteja alguém do meu lado. “Olha, um ipê-roxo!”, digo, como se fosse a coisa mais rara do mundo.

Os ipês ainda me trazem a lembrança de uma professora muito carinhosa que tive na segunda série, a tia Bernadete. Gostava tanto dessa professora que um dia menti para minha mãe que era aniversário dela, só para eu poder levar um presente. Um dia, na aula de educação artística, ela nos ensinou a desenhar uma árvore do cerrado e a colar pedacinhos de papel crepom enrolados na copa, para representar as flores.

Anos depois, maiorzinho, vi um ipê-branco no meio de Eixão, e comentei com minha mãe: “Essa árvore parece aquelas que, quando eu era pequeno (já me achava grande com 11 anos), fazia com pedacinhos de papel”. Minha mãe então me apresentou formalmente essa belezura brasiliense. “Aquilo é um ipê”, disse, acrescentando à lição a informação de que há ipês de várias cores.

Desde então, os ipês não saíram mais do meu radar e, como todo bom brasiliense, os adoro. A ponto de concordar com quem disse, certa vez, que Brasília tem cinco estações do ano: chuva, ipê-roxo, ipê-amarelo, ipê-rosa e ipê-branco. Nós candangos somos privilegiados por, como diz minha querida amiga e escritora Marina Oliveira, viver “debaixo dos ipês”. Hoje, estamos na estação roxa, repararam? Sinal de que, daqui a pouco, estaremos na minha preferida: a amarela. E o seu, cara leitora, caro leitor? Qual seu ipê preferido?

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Tags