Correio Braziliense
postado em 12/07/2020 04:15
O silêncio do ambiente interrompido pelo som de aparelhos, algumas conversas e passos no corredor. O cenário se une à complexidade do trabalho diário nas unidades de terapia intensiva (UTIs). “Geralmente, o que vem na nossa cabeça é que a pessoa na UTI está muito mal, que ela vai morrer. É uma concepção errada. Ali, não é o lugar onde a pessoa deveria passar seus últimos momentos. É um lugar, sim, para o paciente crítico, grave, mas recuperável e onde há uma assistência mais intensa tanto na quantidade maior de equipamentos voltados para esse paciente quanto com uma equipe especializada, com profissionais diferenciados, para um atendimento mais próximo, que traga segurança à pessoa internada”, detalha o presidente do Conselho Regional de Enfermagem (Coren-DF), Marcos Wesley Feitosa.
Em meio à pandemia do novo coronavírus, os olhares voltaram-se para as unidades de terapia intensiva (UTIs). As medidas de distanciamento e isolamento social, tomadas por governadores e recomendadas por autoridades de saúde, tinham, como um dos principais objetivos, o ganho de tempo para preparar leitos de UTI suficientes para atender aos pacientes graves acometidos da doença. Com o avanço da disseminação e do contágio do novo vírus, as estatísticas de ocupação dos leitos passaram a ser monitoradas diariamente, bem como a cobrança e o anúncio da aquisição de ventiladores e respiradores.
Isso porque, entre os sintomas mais comuns da covid-19, está justamente a dificuldade respiratória. Além disso, de acordo com o médico intensivista e presidente da Associação de Medicina Intensiva Brasileira regional DF (Amib/DF), Rodrigo Biondi, apesar de 85% das pessoas desenvolverem uma forma mais leve da covid-19, 5% ficam graves. “E, desses 5%, a mortalidade é relativamente alta”, detalha.
De acordo com dados da sala de situação da Secretaria de Saúde, o DF tem, no total, 627 leitos para pacientes com covid-19 com suporte de ventilação mecânica. Destes, 160 estão vagos, ou seja, 26% do total. Segundo a infectologista Valéria Paes Lima, o mais importante em uma UTI é garantir atendimento imediato ao paciente. “Se ele tiver qualquer piora clínica, isso é percebido rapidamente. Em caso de alguma intercorrência, é possível realizar, em um curto espaço de tempo, o tratamento adequado”, explica. Para isso, são utilizados diversos equipamentos e materiais, que permitem tanto a monitorização contínua do estado de saúde do acamado quanto o uso deles para estabilização do quadro clínico.
Conforme a Resolução nº 7, de 24 de fevereiro de 2010, publicada pelo Ministério da Saúde e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), UTI é uma área crítica, destinada à internação de pacientes graves, que requerem atenção profissional especializada de forma contínua, materiais específicos e tecnologias necessárias ao diagnóstico, monitorização e terapia. Os leitos são a ponta do iceberg, como descreve Farid Buitrago, presidente do Conselho Regional de Medicina (CRM/DF). “Por trás, tem uma série de suportes para implementar todas as medidas necessárias para a recuperação da saúde do paciente, pessoal qualificado e monitoramento constante para dar suporte de vida à pessoa que está passando por uma situação difícil”, ressalta.
O responsável técnico de uma UTI deve ser especialista em medicina intensiva, como regulamentado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) em abril. “Diferentemente de outras especialidades, que a gente se dedica a um órgão ou sistema do corpo, estudamos todos os sistemas no paciente grave ou com risco de ficar grave. Nas outras formações, os profissionais cuidam de pessoas não graves, mas também são atentos às situações de prevenção e manutenção da saúde. Enquanto isso, o intensivista foca na fase mais aguda”, revela Biondi. No entanto, o médico intensivista na UTI é como se fosse um maestro dentro de uma equipe multidisciplinar.
Sobrecarga
Enfermeiros preocupados com o melhor cuidado; fisioterapeutas atentos aos parâmetros do respirador e ansiosos para tirar o paciente do leito; farmacêuticos atentos às possíveis interações medicamentosas; nutricionistas empenhados em atingir as metas calóricas do paciente; psicólogos analisando o cenário familiar; fonoaudiólogos analisando os riscos da alimentação; e técnicos em enfermagem com olhar atento à organização do leito. “Turno 24 horas, equipe multidisciplinar com, no mínimo, enfermeiro, fisioterapeuta, técnico de enfermagem, farmacêutico, psicólogo e odontólogo e monitorização são as características mais fortes na medicina intensiva”, conta o médico Rodrigo Biondi.
Para atuar em uma unidade de terapia intensiva, é necessário preparo. “Para ser esse maestro, você precisa de um treinamento muito intenso”, comenta Biondi. Além de todos os cuidados com a saúde, o dia a dia envolve decisões críticas. “O ideal é que esses ambientes sejam ocupados por profissionais que estudaram um pouco a mais de forma específica. Mas, na realidade, o que a gente vê não é isso. São profissionais generalistas que vão aprendendo no dia a dia. Não é que seja errado, mas o ideal é que esse serviço fosse ocupado por profissionais especialistas. Esse aprendizado também sobrecarrega quem já atua na área”, complementa o presidente do Coren-DF.
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